Quando o cidadão juiz se transforma em sofrido consumidor lesado pela Net
01/03/2011 12:36
João Ricardo contratou com a Net Sul Comunicações Ltda. os serviços de Internet banda larga (“Vírtua 2 megas”) e de telefonia fixa, no plano “Net Fone Promo 180”, disponibilizados, a partir de 19 de abril de 2006.
"O autor perdeu horas em telefonemas com a ré e cada vez que obtinha evasivas e respostas ´padrão´ sem o mínimo de seriedade, sentia-se como o ´legítimo idiota´, na reiterada e sempre vã tentativa de que alguém levasse seu pedido a sério.
Quando o cidadão juiz se transforma em sofrido consumidor lesado pela Net
(25.02.11)
Charge de Gerson Kauer
Conhecedor do direito, reconhecido defensor dos menos favorecidos, juiz que sentenciou muitas ações coletivas em defesa dos consumidores e atual presidente da Ajuris, nem mesmo assim o magistrado gaúcho João Ricardo dos Santos Costa escapou, como homem do povo, do descaso que empresas poderosas - como a Net - impõem aos cidadãos. Textualmente, em petição, ele admite ter se sentido como "um legítimo idiota".
João Ricardo contratou com a Net Sul Comunicações Ltda. os serviços de Internet banda larga (“Vírtua 2 megas”) e de telefonia fixa, no plano “Net Fone Promo 180”, disponibilizados, a partir de 19 de abril de 2006.
Dois anos e cinco dias depois, o cliente solicitou à Net a reinstalação dos serviços em sua nova residência, localizada no mesmo prédio, um andar abaixo, para onde se mudara. Penou no "call center", mandou e-mails e faxes, ficou sem os serviços, foi cobrado abusivamente e só então foi informado de que deveria assinar outro contrato, porém mais oneroso.
Só em 2 de junho, acatando uma ordem judicial, a Net restaurou os serviços.
A juiza Rosaura Marques Borba, da 4ª Vara Cível de Porto Alegre, condenou a Net a devolver em dobro o valor cobrado durante o período em que o consumidor ficou sem os serviços. Fixou multa diária de R$ 500,00 para cada um dos cinco dias em que a empresa demorou para cumprir a ordem judicial de reinstalação dos serviços. E deferiu reparação moral de R$ 8 mil.
Apelou a Net, obtendo sucesso parcial, na 10ª Câmara Cível do TJRS. Mantidos os demais comandos da sentença, a reparação moral foi reduzida para R$ 4 mil.
O relator Paulo Roberto Lessa Franz explicou a redução numa longa frase. "Demonstrada a abusividade do ato praticado pela ré, e levando em conta as condições econômicas e sociais do ofendido, qualificado na exordial como ´magistrado com assento na 16ª Vara Cível do Foro Central´, e da ré, reconhecida empresa de grande porte; considerando principalmente, a reprovabilidade da conduta desta; o caráter coercitivo e pedagógico da indenização; os princípios da proporcionalidade e razoabilidade; tratando-se de dano moral puro; e que a reparação não pode servir de causa a enriquecimento injustificado, considerando ainda não ter sido o autor inscrito nos órgãos restritivos de crédito; é de ser reduzido o montante indenizatório fixado na sentença para R$ 4.000,00 que se revela suficiente e condizente com as peculiaridades do caso e aos parâmetros adotados por este órgão fracionário em situações análogas".
Com o trânsito em julgado, a Net - ante o deferimento de penhora on line em suas contas bancárias, fez na semana passada o depósito da condenação. Incluindo a honorária e as custas, a cifra chegou a R$ 10.420,51. Saiu barato para a empresa.
As advogadas Ana Paula Dalbosco e Renata Pozzi Kretzmann atuaram em nome do magistrado-consumidor. (Proc. nº 70033008681).
O desabafo em Juízo
Um trecho da petição inicial da ação do juiz João Ricardo contra a Net contem candentes desabafos reveladores de como sofre o consumidor comum:
"O autor perdeu horas em telefonemas com a ré e cada vez que obtinha evasivas e respostas ´padrão´ sem o mínimo de seriedade, sentia-se como o ´legítimo idiota´, na reiterada e sempre vã tentativa de que alguém levasse seu pedido a sério.
Nesse quadro onde pontificavam a arrogância, a insensível burocracia, a ameaça e o abuso, a resultante não poderia ser outra que não os sentimentos de impotência, de desânimo, de medo e de ira, que atuam deleteriamente sobre o psique e a saúde física do autor.
Este se vê forçado a recorrer ao Poder Judiciário como última chance de restabelecimento das obrigações contratuais descumpridas, já estressado psicologicamente, com as sequelas psicossomáticas daí derivadas".
Fonte: www.espacovital.com.br