Acórdão do TJTO determina que período de união estável foi, na verdade, namoro qualificado

Acórdão do TJTO determina que período de união estável foi, na verdade, namoro qualificado

08/04/2021
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM

A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins - TJTO reconheceu que o período de união estável concedido em juízo de primeiro grau, correspondera, na verdade, a um namoro. Decisão confirmou a tese do recorrente: a existência de namoro qualificado.

O Tribunal reformou a sentença para adequar a partilha de bens quanto ao período de duração da união estável, que teria se estendido de janeiro de 2014 a novembro de 2015. No período compreendido entre 2008 e 2013, a relação entre as partes seria apenas de um namoro.

Em análise dos autos, o relator determinou que a prova produzida é incapaz de comprovar  o marco inicial da união estável como em 2008. “A documentação juntada ao feito, analisada em cotejo com a prova oral produzida, não se revela coesa e segura a comprovar que o relacionamento amoroso, com contornos típicos da união estável, tenha se iniciado no ano do nascimento da filha menor do ex- casal.”

Conforme o voto do magistrado, para fins de comprovação de união estável deve ser observada a efetiva definição do casal pela comunhão de vida como se casados fossem.  Sendo assim “o fato de o réu, sobretudo após o encerramento da obra na cidade, voltar à localidade, seja com o intuito de se encontrar amorosamente com a primeira apelante, seja para visitar a filha, não indica contornos de continuidade, duração e reconhecimento público de constituição de família (artigo 1.723, Código Civil de 2002).”

“É indispensável ressaltar, inclusive, que a própria autora, em audiência de Instrução e Julgamento, afirma, de forma clara, que o namoro teria iniciado em maio de 2007. Registro, ademais, que a magistrada chega a frisar a expressão ‘a namorar’, como se extrai do áudio juntado ao feito de origem”, pontuou.

O relator concluiu que a decisão de formação de família somente se deu em meados de fevereiro de 2013, quando, em comunhão de vontades, as partes optaram por coabitar, a fim de criarem juntos a filha em outro país. Deste modo, votou por conhecer e dar parcial provimento ao apelo, para estabelecer o período da união estável havida entre as partes e determinar a partilha dos bens e dívidas amealhadas neste lapso.

Progressismo

Para a advogada Alessandra Muniz, presidente do IBDFAM-TO, a decisão progressista coloca o Tribunal no patamar de um início de decisões “que não pregam somente o direito positivado, mas também a evolução da sociedade que não consegue acompanhar as leis, tendo os magistrados que se debruçarem em seus votos com um olhar mais acurado e humanista.”

“A união estável e seus requisitos estão positivados no artigo 1.723 do Código Civil de 2002. Ter uma convivência pública, contínua e duradoura, com o ânimo de constituir família é união estável. O namoro qualificado não está contemplado em lei, porém, jurisprudencialmente, vem tendo seu reconhecimento”, explica a especialista.

Segundo ela, é muito “sui generis” a diferença entre ambos: “o namoro, atualmente, contempla os mesmos requisitos do artigo citado, e a diferenciação se dá no animus de constituição familiar. Enquanto na união estável esse ânimo é imediato, no namoro qualificado é mediato. Mas vejamos que é muito sutil e subjetivo o ânimo de constituir uma família. Daí, um olhar mais acurado dos magistrados para decretarem um ou outro, analisando sempre cada caso concreto.”

A advogada frisa que, sendo namoro, não há que se falar em partilha de bens, pois não gera efeitos patrimoniais. Ao contrário da união estável, modalidade na qual, quando não estabelecido o regime de bens, vigora o da comunhão parcial, estabelecendo, portanto, efeitos para partilha no percentual de 50% para cada ex-convivente.

Contrato de namoro

A presidente do IBDFAM-TO destaca que, com a pandemia, muitos casais de namorados resolveram morar na mesma casa e partilharem despesas. Neste cenário, ela adverte: “caso não queira o casal constituir família imediatamente e que essa união não gere efeitos patrimoniais, o mais correto seria procurar um advogado e terem um contrato de namoro assinado. Mas, cuidado! Ter contrato de namoro que não se renova, pode sim virar união estável.”

De acordo com ela, o animus de constituir família é uma linha tênue. Deste modo, é preciso analisar cada caso concreto e as provas inseridas nos autos para chegar a um denominador comum.

Alessandra finaliza com uma homenagem ao jurista Zeno Veloso, diretor nacional e cofundador do IBDFAM, que morreu em 18 de março, vítima da Covid-19:

"E por último, e mais importante, a voz do Mestre Zeno Veloso ressoa nos vários tribunais do Brasil. É com ele que termino essa breve explanação sobre namoro qualificado. Ao Mestre com carinho:

Nem sempre é fácil distinguir essa situação – a união estável – de outra, o namoro, que também se apresenta informalmente no meio social. Numa feição moderna, aberta, liberal, especialmente se entre pessoas adultas, maduras, que já vêm de relacionamentos anteriores (alguns bem-sucedidos, outros nem tanto), eventualmente com filhos dessas uniões pretéritas, o namoro implica, igualmente, convivência íntima – inclusive, sexual –, os namorados coabitam, frequentam as respectivas casas, comparecem a eventos sociais, viajam juntos, demonstram para os de seu meio social ou profissional que entre os dois há uma afetividade, um relacionamento amoroso. E quanto a esses aspectos, ou elementos externos, objetivos, a situação pode se assemelhar – e muito – a uma união estável. Parece, mas não é! Pois falta um elemento imprescindível da entidade familiar, o elemento interior, anímico, subjetivo: ainda que o relacionamento seja prolongado, consolidado, e por isso tem sido chamado de ‘namoro qualificado’, os namorados, por mais profundo que seja o envolvimento deles, não desejam e não querem – ou ainda não querem – constituir uma família, estabelecer uma entidade familiar, conviver numa comunhão de vida, no nível do que os antigos chamavam de “affectio maritalis”. Ao contrário da união estável, tratando-se de namoro – mesmo do tal namoro qualificado –, não há direitos e deveres jurídicos, mormente de ordem patrimonial entre os namorados. Não há, então, que falar-se de regime de bens, alimentos, pensão, partilhas, direitos sucessórios, por exemplo (VELOSO, Zeno. Direito Civil: temas. Belém: ANOREGPA, 2018. p. 313)"

Fonte/Extraído de IBDFAM

Notícias

Extrajudicialização dá cara nova aos cartórios e reduz carga do Judiciário

quarta-feira, 11 de setembro de 2024 Extrajudicialização dá cara nova aos cartórios e reduz carga do Judiciário A velha previsão do fim dos cartórios no Brasil, amparada pelo apelo à desburocratização, tem dado lugar a uma tendência no sentido oposto, impulsionada pela necessidade de reduzir o...

STJ vai estabelecer formalidades necessárias para leilão extrajudicial

STJ vai estabelecer formalidades necessárias para leilão extrajudicial É possível anular um leilão extrajudicial e desfazer o negócio entre arrematante e instituição financeira pelo fato de o edital desrespeitar os requisitos exigidos para o leilão judicial? A questão está nas mãos da 3ª Turma do...

Observância da cláusula de indenização por infidelidade no pacto antenupcial

Opinião Observância da cláusula de indenização por infidelidade no pacto antenupcial Fabrício Franklin 8 de setembro de 2024, 6h33 Nessa linha de raciocínio, no ano de 2018, o plenário do CNJ decidiu que os cartórios extrajudiciais estariam proibidos de realizar a celebração de pacto de...