Ordem cronológica para adoção não é absoluta

06/12/2012  |  domtotal.com

Fila para adoção pode ser flexibilizada em prol do melhor interesse da criança

Só a inobservância da ordem estabelecida no cadastro não constitui obstáculo para a adoção.

Por Daniela Galvão
Repórter Dom Total

A ordem cronológica do cadastro único para adoção no Brasil não é absoluta. Afinal, ela pode deixar de ser observada diante do melhor interesse da criança. Essa foi a decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar um processo de adoção por um casal que ficou com a criança desde o nascimento até seus dois anos e cinco meses. Segundo o relator, ministro Sidnei Beneti, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê expressamente que essa ordem poderá deixar de ser observada pelo juiz quando comprovado que essa é a melhor solução diante do interesse da criança.

Dez dias após o parto, marido e mulher fizeram o pedido de adoção e já estavam inscritos no cadastro único. Porém, um ano depois, em apelação, foi confirmada a sentença que determinou a retirada da criança dos adotantes e sua internação em abrigo. Após quatro meses internada, a criança foi inserida em outra família, com a qual ficou por menos de dois meses, até retornar à família inicial. O ministro afirma que a busca e apreensão da menor foi para que, retirada da companhia dos ora recorrentes, fosse colocada em regime de internação, até que recolocada em outra família. “O que evidencia interregno absolutamente nocivo de vida em estabelecimento de internação, que deve a todo custo ser evitado”.

Sidnei Beneti rssalta que só a inobservância da ordem estabelecida no cadastro de adoção competente não constitui obstáculo ao deferimento da adoção quando isso refletir o melhor interesse da criança. Ele destaca que tanto para ele quanto para a jurisprudência do STJ, “deve-se evitar ao máximo o surgimento de situações agudas de padecimento, como as transferências para internamentos, ainda que transitórios, gerando cenas de extrema angústia e desespero, nocivos à criança e a todos”.

Adoção à brasileira

Conforme o desembargador da 13ª Câmara do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), pró-reitor de Pesquisa e professor da Escola Superior Dom Helder Câmara, Newton Teixeira Carvalho, a lista de espera dificulta a adoção. “A partir do momento em que a lei faz certas exigências, o casal acaba optando pela adoção à brasileira. Esta é uma adoção desburocratizada, na qual o casal adota filho de outro como se fosse dele. É até crime, mas, se for em benefício da criança, isso tem sido tolerado no Brasil. Se ficarmos inflexíveis, muitos casais vão deixar de requerer ao Judiciário a adoção”.

Ele ressalta que, antes mesmo dessa decisão do STJ, o TJMG já entendia que a lista para adoção não é rígida, porque prevalece sempre o melhor interesse da criança. Na opinião dele, a família que estava com a criança tem vantagem no processo de adoção, porque já houve a fase de adaptação. “O advogado previdente tem que aconselhar o cliente a, primeiro, pedir a guarda da criança. Sabemos que a adoção é irreversível. Então, se há adoção de imediato de uma criança e, depois, percebe-se que ela não se adaptou ao novo lar, não é possível devolvê-la. Já a guarda é um estágio de convivência, no qual todas as dúvidas que poderiam existir são superadas. Assim, se houver uma boa adaptação, pede-se a adoção. E, se não der certo, a criança pode ser devolvida ao abrigo ou aos pais”.

Além disso, a principal diferença entre guarda e adoção é em relação ao poder familiar. Nesta última os pais perdem, automaticamente, o poder familiar, que é transferido para os pais adotantes ou já adotivos. De acordo com Newton Carvalho, na prática é como se não houvesse mais a família biológica. “Ele passa a ser de outra família, como se tivesse nascido lá. Portanto, o poder familiar que era da família originária passou para a outra família”.

Em contrapartida, quando uma criança está sob guarda, o pai e a mãe continuam com o poder familiar. Isso significa que, mesmo que o filho esteja com outra pessoa, os pais ainda têm suas responsabilidades.

Requisitos

Além de querer efetivamente adotar a criança e da fase de adaptação com os possíveis pais, esse procedimento exige outros requisitos legais. Entre eles está uma diferença de idade entre o adotando e o adotado, que deve ser de 16 anos. Uma pessoa maior de idade, ou seja, que tenha capacidade civil e tenha essa diferença estabelecida em lei, pode adotar. Deve haver ainda consentimento dos pais para a adoção, se a criança estiver registrada.

Newton Carvalho esclarece que, se os pais não consentirem, necessariamente haverá ação de destituição do poder familiar, cumulada com adoção. “A criança é adotada na Vara da Infância e da Juventude. Por sua vez, o requerimento para adoção de quem é maior de idade – que depende dele e do casal que vai adotar – será feito na Vara de Família”, completa.

Como na adoção se perde o vínculo com a família biológica, é permitido ao casal adotante sugerir um novo nome à criança ou somente adotar o sobrenome da família. O desembargador e professor da Dom Helder frisa que, dependendo da idade do adotado, os casais preferem manter o nome e mudar apenas o sobrenome. No entanto, se a criança for muito nova, há quem prefira uma mudança total para quebrar de vez o vínculo com a família originária.

Ele lembra que não há diferença entre um filho natural e um adotado. “Hoje eles são iguais. Não pode haver nenhuma distinção”.

Análise

As filas para adoção no país são grandes tanto para quem quer adotar, quanto para quem aguarda uma nova família. Ao ser questionado sobre isso, Newton Carvalho explica que isso ocorre, antes de tudo, por uma questão cultural. “O casal não quer adotar qualquer criança, mas aquela que se pareça com ele, para que a sociedade não questione a diferença entre eles ou faça distinção em razão da cor. Isso tem que ser ultrapassado”, enfatiza.

Passada essa fase, outro problema é a burocracia. Para ele, alguns têm resistência a ela porque, ao requerer a adoção, a pessoa abre a porta de sua casa para que o Estado entre com assistente social e, às vezes, até com psicólogo. Esses profissionais analisarão o cotidiano de quem pretende adotar. “E depois ainda tem uma audiência com o juiz. É bem burocrático o processo”, finaliza.

 

Redação Dom Total

Extraído de Dom Total

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