AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS - CASA DE SAÚDE E MATERN NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS - ADOÇÃO “À BRASILEIRA”...

AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS - CASA DE SAÚDE E MATERNIDADE NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS - ADOÇÃO “À BRASILEIRA” - INVESTIGAÇÃO BIOLÓGICA - PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA - NÃO CONFIGURAÇÃO - RESOLUÇÃO DO CFM 1.331/89 - PRONTUÁRIO MÉDICO - DOCUMENTO DE CARÁTER PERMANENTE

- A prescrição, na espécie, é de vinte anos, prevista no art. 177 CC de 1976, visto se tratar de direito pessoal. Não obstante, o termo inicial para contagem do prazo prescricional é a data na qual a autora adquiriu a capacidade civil relativa, ou seja, o dia em que completou 16 (dezesseis) anos, na forma do inciso I do art. 198 do Código Civil, razão pela qual não há falar em prescrição. Segundo a Resolução do Conselho Federal de Medicina n° 1.331/89, vigente à época dos fatos, o prontuário médico é documento de manutenção permanente pelos estabelecimentos de saúde.

Apelação Cível nº 1.0105.15.028415-3/001 - Comarca de Governador Valadares - Apelante: C.C.S. - Apelada: Casa de Saúde e Maternidade Nossa Senhora das Graças Ltda. - Relator: Des. Alberto Henrique

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em, à unanimidade, dar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 10 de novembro de 2016. - Alberto Henrique - Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. ALBERTO HENRIQUE - Trata-se de recurso de apelação interposto por C.C.S., contra a r. sentença de f. 25/26, proferida nos autos da ação de exibição de documentos em face de Casa de Saúde e Maternidade Nossa Senhora das Graças Ltda., por meio da qual o MM. Juízo de primeiro grau suscitou a prejudicial de prescrição e julgou extinto o processo, nos termos do art. 269, IV, do CPC/73. Condenou a requerente ao pagamento das custas processuais, ficando suspensa a exigibilidade nos termos do art. 12 da Lei 1.060/50. Deixou de condenar a autora ao pagamento de honorários advocatícios, visto que a ré não constituiu procurador nos autos.

Irresignada, a apelante pugna pela reforma da sentença, sustentando que a guarda do prontuário médico, ainda que configurada a prescrição vintenária, deve ser por prazo indeterminado, conforme a Resolução nº 1.638 do CFM. Aduz que as informações constantes no prontuário são do paciente, e que a guarda é obrigação da instituição de saúde, devendo ser assegurado ao paciente acesso a elas a todo o tempo.

Ausência de preparo, visto que litiga sob os auspícios da assistência judiciária gratuita.

Ausentes as contrarrazões.

É o relatório.

Trata-se de ação de exibição de documentos, por meio da qual a autora pretende obter informações acerca de seu nascimento. Sustenta que foi registrada e criada por pais adotivos, por meio da “adoção à brasileira”, não tendo conhecimento sobre sua origem biológica.

Ainda, aduz que, ao solicitar referidas informações diretamente à instituição de saúde, houve a negativa, sob o argumento de que os documentos só poderiam ser apresentados mediante autorização judicial.

Sobreveio decisão que instalou, de ofício, a prejudicial de prescrição e julgou extinto o processo nos termos do art. 269, IV, do CPC/73.

A meu ver, a sentença merece reparos. Na espécie, o prazo a ser aplicado é o de vinte anos, previsto no art. 177 do CC/1916, como constou da sentença.

Isso porque a autora pretende obter informações de caráter pessoal, relacionadas ao seu nascimento.

A presente ação foi proposta já sob a vigência do Código Civil de 2002, ou seja, em 22.07.2015 (contra-capa), fazendo-se mister a observância da regra de transição prevista no art. 2.028 do NCC, para o fim de se aferir qual o prazo prescricional a ser considerado:

"Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada".

O Código Civil de 2002 entrou em vigor em 11.01.2003. Nessa data, já havia transcorrido 16 anos do nascimento da autora. Portanto, transcorridos mais da metade do prazo prescricional máximo previsto no Código Civil/1916, que era de vinte anos (art. 177 do CC/1916). Logo, o prazo prescricional a ser adotado no caso é o da lei velha, e não o do NCC.

Não obstante, o termo inicial para contagem do prazo prescricional é a data na qual a autora adquiriu a capacidade civil relativa, ou seja, o dia em que completou 16 (dezesseis) anos, na forma do inciso I do art. 198 do Código Civil. Assim, durante esse lapso temporal, não se operou a prescrição, pois estava suspensa, por ser a menor absolutamente incapaz.

In casu, a autora nasceu em 07.06.1986 (f. 12), completando 16 (dezesseis) anos de idade em 07.06.2002, data a partir da qual passou a ser contado o prazo prescricional de 20 anos, conforme o art. 177 do CC de 1916.

Ao tempo do ajuizamento da ação (22.07.2015), não havia transcorrido o prazo vintenário fixado em lei, razão pela qual o presente recurso merece ser conhecido e provido.

Quanto à necessidade de guarda permanente dos documentos, assiste razão à apelante.

Segundo a Resolução do Conselho Federal de Medicina n° 1.331/89, vigente à época dos fatos, “Art. 1º - O prontuário médico é documento de manutenção permanente pelos estabelecimentos de saúde. Art. 2º - Após decorrido prazo não inferior a 10 (dez) anos, a fluir da data do último registro de atendimento do paciente, o prontuário pode ser substituído por métodos de registro, capazes de assegurar a restauração plena das informações nele contidas.” Depreende-se, pois, que o prontuário médico, nos termos da Resolução do Conselho Federal de Medicina n° 1.331/89 é permanente, não se limitando, a sua guarda, ao prazo de dez anos. Nesse sentido:

“Ação exibitória de documentos. Procedência do pedido. Apelo. Inépcia da inicial afastada. Desnecessidade de indicação da ação que se pretende ajuizar a partir dos documentos objeto da ação exibitória. Possibilidade de caráter satisfativo da ação exibitória. Prontuários médicos. Dever de guarda. Documentos de manutenção permanente. Dever de exibir. Sentença confirmada - Não há que se falar em inépcia da inicial por ausência de indicação dos motivos que justificam a propositura da ação exibitória frente à possibilidade do caráter satisfativo da ação exibitória. - Nos termos da Resolução do Conselho Federal de Medicina vigente à época dos fatos, o prontuário médico é documento de manutenção permanente e, após o prazo mínimo de 10 (dez) anos, pode ser substituído por métodos de registro, capazes de assegurar a restauração plena das informações nele contidas. - Impõe-se a confirmação da sentença que impõe à entidade hospitalar que atendeu a filha da autora que veio a falecer após acidente automobilístico o dever de exibir cópia dos prontuários médicos de atendimento dela" (Apelação Cível 1.0525.11.010200-7/002, Relator: Des. Wanderley Paiva, 11ª Câmara Cível, j. em 16.10.2013, p. em 21.10.2013).

“Apelação cível. Direito processual civil. Medida cautelar de exibição de documento. Inépcia da petição inicial. Natureza satisfativa. Prontuários médicos. Dever de guarda. Documentos de manutenção permanente. Dever de exibir. Preliminar rejeitada. Recurso não provido. - A medida cautelar de exibição de documentos é de natureza satisfativa e não exige o ajuizamento de ação principal. - "Nos termos da Resolução do Conselho Federal de Medicina vigente à época dos fatos, o prontuário medico é documento de manutenção permanente e, após o prazo mínimo de 10 (dez) anos, pode ser substituído por métodos de registro, capazes de assegurar a restauração plena das informações nele contidas." - Pela regra de transição prevista no Código Civil de 2002, considera-se o prazo de prescrição estipulado neste Diploma Legal quando transcorrido menos da metade do prazo prescricional previsto no Código Civil de 1916, no momento da entrada em vigor do novo Código Civil” (TJMG - Apelação Cível nº 1.0693.11.003662-3/001, Rel. Des. José Flávio de Almeida, 12ª Câmara Cível, j. em 17.09.2014, p. em 23.09.2014).

Com tais considerações, dou provimento ao recurso, para cassar a sentença e determinar o retorno dos autos à Comarca de origem para regular processamento.

Custas, ex vi legis. DES. ROGÉRIO MEDEIROS - De acordo com o Relator.

DES. LUIZ CARLOS GOMES DA MATA - Acompanho o resultado do julgamento encontrado pelo eminente Relator, ressaltando que, no meu modesto sentir, a pretensão da apelante é imprescritível.

Denota-se dos autos que a apelante, C.C.S., busca com o ajuizamento desta ação a apresentação de documentos que permitam que ela investigue a sua origem biológica.

O art. 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê o direito do adotado de conhecer sua origem genética, vejamos:

“Art. 48. O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos” (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009).

O direito à identidade genética está fundado no direito da personalidade do indivíduo e amparado pelo princípio da dignidade da pessoa humana, cabendo ser protegido e respeitado. Nesse sentido, não se pode impedir a filha de buscar notícias sobre a mulher que lhe trouxe ao mundo, pela simples alegação de que o prazo para tanto se expirou. A pretensão dela está, segundo os preceitos legais, amparada pela imprescritibilidade.

Cito a lição deixada pelo ilustre Ministro João Otávio de Noronha, ao participar do julgamento do Resp nº 807.849 - RJ:

“O homem não aparece. O homem nasce, o homem tem que ter origem. Não posso conceber que alguém possa ser qualificado como um ente desprovido de origem. Conhecer a sua origem, como bem colocado pela Sra. Ministra Nancy Andrighi, encontrase plasmado pelo Estado como um direito fundamental. Aliás, o Estado democrático, o Brasil como uma República, como Estado democrático de direito, tem como fundamento a dignidade da pessoa humana. Não se pode ver, não se pode ter como digna aquela pessoa que nem sequer sabe a sua origem”.

Nesse contexto, entendo que não se aplica ao presente caso a hipótese de prescrição, porquanto o direito perquirido, no meu modesto sentir, é imprescritível.

Ressalto que o mérito da pretensão não nos preocupa neste momento. Se a apelada tem ou não o dever de exibir os documentos caberá a análise em uma segunda ocasião, ficando o julgamento restrito à análise da questão prescricional.

Com essas considerações, também dou provimento à apelação.

Súmula - DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico
Extraído de Recivil

 

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