Agravo de Instrumento - Execução fiscal - Penhora de bem imóvel gravado com direito real de usufruto vitalício

Agravo de Instrumento - Execução fiscal - Penhora de bem imóvel gravado com direito real de usufruto vitalício

AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO FISCAL - PENHORA DE BEM IMÓVEL GRAVADO COM DIREITO REAL DE USUFRUTO VITALÍCIO - POSSIBILIDADE DE PENHORA QUANTO À NUA PROPRIEDADE - PRESERVAÇÃO DOS DIREITOS DO USUFRUTUÁRIO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO

- O usufruto é um direito real de gozo ou desfruto de coisa alheia, que se destaca da propriedade, ou seja, o usufrutuário possui a coisa, mas essa coisa não é dele, podendo, portanto, utilizar-se e desfrutar dela, obter os seus frutos, tanto monetários como em espécie, mas não pode dispor dela.

- Trata-se de um direito real personalíssimo, inalienável, impenhorável e temporário.

- Ressalte-se que o usufruto é impenhorável, logo é possível que a nua propriedade do imóvel gravado com ônus de usufruto seja penhorado, desde que o direito do usufrutuário permaneça inalterado, o que torna, no caso em apreço, possível a constrição vindicada.

Recurso provido em parte.

Agravo de Instrumento Cível nº 1.0079.97.008702-3/001 - Comarca de Contagem - Agravante: Estado de Minas Gerais - Agravados: Tbol Componentes Automotivos Ltda., Márcio Miguel de Freitas, Rodrigo Miguel de Freitas - Interessados: Carlos Antônio da Rocha, Alex Fábio de Souza Pereira, Renê Rodrigues Valadares, Simone Cardoso Araújo - Relatora: Des.ª Ângela de Lourdes Rodrigues

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar parcial provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 24 de fevereiro de 2015. - Ângela de Lourdes Rodrigues - Relatora.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES.ª ÂNGELA DE LOURDES RODRIGUES - Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Estado de Minas Gerais contra a decisão de f. 30-TJ, proferida pela MM. Juíza de Direito da 1ª Vara Empresarial, da Fazenda Pública e de Registros Públicos da Comarca de Contagem, nos autos da execução fiscal ajuizada em desfavor Tbol Componentes Automotivos Ltda. e outros, que indeferiu o pedido de penhora das cotas-partes do imóvel inscrito sob a matrícula nº 25541, pertencentes aos executados Márcio Miguel de Freitas e Rodrigo Miguel de Freitas, pelo fato de o referido imóvel estar gravado com usufruto.

Em suas razões de inconformismo, o agravante alega, em suma, que: nos termos dos arts. 615, II, e 619, ambos do CPC, a penhora de imóvel gravado com usufruto é perfeitamente possível, com a condição de que seja respeitado o direito do usufrutuário; o usufruto não torna impenhorável a nua propriedade, mas a constrição judicial deve recair apenas sobre a nua propriedade, preservando-se, assim, o direito do usufrutuário.

Por meio da decisão de f. 46/47-TJ, o presente recurso foi devidamente recebido e processado, no juízo de admissibilidade.

Contrarrazões apresentadas às f. 50/54-TJ.

É o sucinto relatório.

Conheço do recurso, porquanto presentes seus pressupostos de admissibilidade.

Inicialmente, de se notar que, por meio das contrarrazões apresentadas às f. 50/54-TJ, os agravados informaram a exclusão do agravado, Sr. Rodrigo Miguel de Freitas, do polo passivo da lide, em virtude do acolhimento da exceção de pré-executividade por ele apresentada, por meio da qual restou reconhecida, pela eminente Magistrada primeva, a sua ilegitimidade passiva ``ad causam para participar da lide (cópia da decisão - f. 58/61-TJ).

Portanto, tendo em vista a exclusão, na instância de origem, do agravado Rodrigo Miguel de Freitas, do polo passivo da ação executiva em comento, determino, por corolário lógico, a sua exclusão do polo passivo do recurso em apreço.

Passo, pois, à apreciação do mérito do presente agravo.

Verifica-se que o Estado de Minas Gerais ajuizou em desfavor da empresa Tbol Componentes Automotivos Ltda., sucessora da empresa Bolt Peças Automotivas Ltda., a presente execução fiscal objetivando a cobrança de crédito remanescente de parcelamento referente ao não recolhimento de ICMS relativo aos anos de 1991, 1995 e 1996, no valor de R$193.725,07 (cento e noventa e três mil setecentos e vinte e cinco reais e sete centavos).

Citada a empresa executada, ao diligenciar no sentido de penhorar bens, certificou o senhor oficial de justiça que ela se encontrava fechada, o que levou o Estado de Minas Gerais a requerer a citação dos sócios codevedores, cujos nomes constavam das CDAs que lustram o feito (f. 16/17-TJ).

Devidamente citados os devedores coobrigados, requereu o exequente, ora agravante, a penhora de bem imóvel pertencente aos agravados, nos seguintes termos:

``1) Cotas-parte do imóvel inscrito sob a matrícula nº 25541, pertencentes aos executados Márcio Miguel de Freitas e Rodrigo Miguel de Freitas, registrado no 3º Cartório de Registro de Imóveis da cidade de Belo Horizonte, mediante lavratura, no bojo destes autos, do termo de penhora, intimando-se, em seguida, os executados.

Logo em seguida, sobreveio a decisão ora fustigada, por meio da qual a douta Juíza da causa indeferiu o pedido de penhora das cotas-partes do imóvel inscrito sob a matrícula nº 25541, porque o referido imóvel se encontra gravado com direito real de usufruto vitalício da Sr.ª Dilma Miguel da Silva (f. 27-TJ), o que ensejou a interposição do presente recurso.

Conforme se verifica, cinge-se o cerne da questão submetida a esta instância revisora a se aferir a possibilidade de se penhorar imóvel pertencente a executado, que já esteja gravado em sua matrícula com direito real de usufruto vitalício a terceira pessoa.

Ora, como cediço, o usufruto é um direito real de gozo ou desfruto de coisa alheia, destacando-se da propriedade. Em outras palavras, o usufrutuário possui a coisa, mas essa coisa não é dele, isto é, tem a sua posse, mas não a sua propriedade. Portanto, pode utilizar-se e desfrutar da coisa, obter os seus frutos, tanto monetários como em espécie, mas não é o dono da coisa, portanto, não pode dispor dela.

O usufruto é um direito personalíssimo, inalienável, impenhorável e temporário.

Contudo, conforme se verifica, na espécie, o pedido de penhora realizado pelo Estado recai sobre a nua propriedade do imóvel, e não sobre o usufruto, pelo que o direito do usufrutuário permanece inalterado, tornando possível a constrição vindicada.

Este col. Tribunal de Justiça, por vezes, já decidiu pela possibilidade da penhora de imóvel gravado com usufruto, desde que observado o direito do usufrutuário, in verbis:

``Embargos de terceiro. Execução fiscal. Penhora. Imóvel gravado com usufruto. Dívida do nu proprietário. Possibilidade de penhora, resguardado o direito do usufrutuário. Honorários advocatícios. Sucumbência recíproca. Segundo recurso parcialmente provido. Prejudicado o primeiro recurso. - A penhora de imóvel gravado com usufruto afigura-se plenamente possível, desde que seja observado o direito do usufrutuário. Assim, a constrição deve recair somente sobre a fração da nua propriedade, subsistindo integralmente o usufruto, que deve ser respeitado. Diante da procedência parcial dos pedidos da embargante, revelando existir vencedor e vencido ao mesmo tempo, os honorários devem ser recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados, na medida da derrota de cada parte, conforme dispõe o caput do art. 21 do CPC e o entendimento consolidado na Súmula nº 306 do colendo Superior Tribunal de Justiça (TJMG - Apelação Cível 1.0525.10.003966-4/002, Relator: Des. Edilson Fernandes, 6ª Câmara Cível, j. em 06.11.2012, p. em 19.11.2012).

``Processo civil. Embargos de terceiro. Usufruto. Penhora sobre a nua propriedade. Improcedência do pedido de desconstituição da penhora. Ausência de turbação ou esbulho à posse do usufrutuário. Litigância de má-fé não configurada. 1. Os embargos de terceiro se prestam a resguardar os direitos de proprietário ou possuidor que injustamente se veja na iminência de ser despojado de seus bens em virtude de ordem judicial emanada em processo no qual não tenha sido parte. 2. O usufruto é direito real sobre coisa alheia, logo, havendo penhora sobre bem gravado com o ônus do usufruto, o usufrutuário continuará, a despeito do ato de constrição judicial, a fruir as utilidades e frutos da coisa, enquanto separado da propriedade. 3. Como no caso dos autos, se a penhora recair apenas sobre a nua propriedade, restando incólume o direito de usufruto da embargante, impõe-se a improcedência do pedido inicial formulado em sede de embargos de terceiro para que a constrição judicial seja desconstituída, pois não há turbação e nem esbulho na posse do usufrutuário, sendo que eventual adquirente da nua propriedade penhorada deverá respeitar o ônus real que recai sobre o imóvel. 4. A litigância de má-fé exige prova inequívoca de seu elemento subjetivo, sob pena de se configurar em óbice indireto ao acesso ao Judiciário e afronta ao art. 5º, XXXV, da CF/88 (TJMG - Apelação Cível 1.0521.12.019148-6/001, Relator: Des. Otávio Portes, 16ª Câmara Cível, j. em 21.08.2014, p. em 1º.09.2014).

``Apelação cível. Embargos de terceiros. Penhora sobre fração ideal da nua propriedade. Possibilidade. Turbação ou esbulho não caracterizado. Bem de família. Status não atingido pela constrição ou hasta pública. Prevalência do direito real. Recurso improvido. A constrição judicial sobre fração ideal da nua propriedade de imóvel gravado por usufruto vitalício não caracteriza esbulho ou turbação da posse dos usufrutuários, porquanto preservado o direito real ainda que o bem seja arrematado em hasta pública. A constrição, ademais, não atinge a situação fático-jurídica que a proteção da Lei nº 8.009/90 busca alcançar, restando o status de bem de família preservado (TJMG - Apelação Cível 1.0428.05.001205-6/001, Relator: Des. Estevão Lucchesi, 14ª Câmara Cível, j. em 10.11.2011, p. em 29.11.2011).

Por conseguinte, restando garantido à usufrutuária o direito de exercer o usufruto do imóvel em questão, de modo vitalício, é possível a realização da constrição judicial apenas no tocante à nua propriedade referente à cota-parte do agravado Márcio Miguel de Freitas.

Conclusão.

Assim, diante do exposto, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva do agravado Rodrigo Miguel de Freitas e determino a sua exclusão do recurso em questão, e dou parcial provimento ao recurso para, reformando a decisão recorrida, determinar a constrição judicial sobre as cotas-parte da nua propriedade do imóvel inscrito sob a matrícula nº 25541, pertencentes ao executado Márcio Miguel de Freitas, preservado o direito de usufruto vitalício da Sr.ª Dilma Miguel da Silva, o que deve constar do termo.

Custas recursais, à razão de cinquenta por cento para cada uma das partes, observada a isenção legal do Estado.

É como voto.

Votaram de acordo com a Relatora os Desembargadores Audebert Delage e Edilson Fernandes.

Súmula - RECURSO PROVIDO EM PARTE.

Data: 14/04/2015 - 10:03:11   Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico
Extraído de Sinoreg/MG

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