Apelação Cível - Usucapião Extraordinária - Imóvel sem matrícula ou registro imobiliário - Certidão negativa

Apelação Cível - Usucapião Extraordinária - Imóvel sem matrícula ou registro imobiliário - Certidão negativa

APELAÇÃO CÍVEL - USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA - IMÓVEL SEM MATRÍCULA OU REGISTRO IMOBILIÁRIO - CERTIDÃO NEGATIVA - INCLUSÃO NO POLO PASSIVO DO PROPRIETÁRIO CONSTANTE DO REGISTRO - IMPOSSIBILIDADE - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO - NÃO CABIMENTO

- Em ação de usucapião extraordinária, não há como exigir da parte autora a indicação e, por conseguinte, a inclusão no polo passivo da ação dos proprietários do imóvel usucapiendo, assim indicados no respectivo registro imobiliário, quando é claramente informado na inicial que o referido bem não possui dito registro, nem sequer matrícula, e quando o feito é instruído com a competente certidão negativa expedida por cartório competente. Em tal situação, descabida a extinção do processo sem resolução de mérito, por suposta ausência dos pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo.

Apelação Cível nº 1.0352.12.001244-3/001 - Comarca de Januária - Apelante: Espólio de Regina Alves Costa, representado pela inventariante Lenita Alves da Silva - Relator: Des. Arnaldo Maciel

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 29 de junho de 2016. - Arnaldo Maciel - Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. ARNALDO MACIEL - Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença de f. 39/43, proferida pelo MM. Juiz Marco Antonio de O. Roberto, que extinguiu, sem resolução de mérito e com fulcro no art. 267, IV, do CPC/1973, a ação de usucapião extraordinária ajuizada pelo Espólio de Regina Alves Costa, representado pela sua inventariante, com fundamento na ausência dos pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, por não ter o apelante formado a relação processual, com a inclusão no polo passivo da lide dos proprietários do imóvel usucapiendo indicados no respectivo registro imobiliário, condenando-o no pagamento das custas processuais, mas suspendendo a exigibilidade com base no art. 12 da Lei 1.060/50.

Nas razões recursais de f. 45/48, sustenta o apelante que teria informado que o imóvel usucapiendo não possuía registro imobiliário nem mesmo matrícula, o que teria comprovado por meio da competente certidão negativa juntada com a inicial e situação que tornaria impossível a indicação precisa dos possíveis titulares do domínio do bem, afirmando ainda que teria atendido a todos os requisitos exigidos para a propositura da presente ação.

Preparo comprovado à f. 49.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à sua análise.

Inicialmente, faço consignar que, a despeito da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil de 2015, tenho que o julgamento do presente processo deverá submeter-se às normas da lei revogada, qual seja o Código de Processo Civil de 1973, considerando a data da publicação da decisão que motivou a interposição do recurso ora analisado, em observância ao Enunciado 54 deste egrégio Tribunal de Justiça e à regra insculpida no art. 14 da nova lei, que dispõe sobre o direito intertemporal, cuja transcrição segue abaixo:

“Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada”.

Depreende-se dos autos que o Magistrado de 1º grau entendeu por bem extinguir a presente ação de usucapião extraordinária, sem resolução de mérito e com base em suposta ausência dos pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, ao fundamento de não ter o autor/apelante providenciado a correta formação da relação processual, através da indicação e da inclusão no polo passivo da ação, com posterior citação, daquelas pessoas em cujos nomes se encontra registrado o imóvel usucapiendo, ou, melhor dizendo, dos possíveis proprietários do referido bem, assim indicados no respectivo registro imobiliário.

Pedindo desde já vênia ao Julgador sentenciante, não vejo, em absoluto, como prevalecer a decisão por ele proferida.

Isso porque, ao ajuizar a presente ação, o espólio requerente deu cumprimento a todos os requisitos exigidos para os feitos desta natureza, indicando, qualificando e requerendo a citação por edital dos réus incertos e desconhecidos, a citação pessoal dos confrontantes do imóvel usucapiendo e a intimação da União, do Estado de Minas Gerais e do Município de Bonito de Minas/MG, acostando ainda à peça de ingresso o memorial descritivo do bem.

Quanto aos eventuais proprietários do imóvel, cuidou o apelante de informar, clara e expressamente, acerca da impossibilidade de indicá-los para compor o polo passivo, pelo fato de não possuir o bem matrícula ou registro imobiliário, situação que restou plenamente comprovada por meio da certidão negativa de f. 06, emitida por cartório competente.

Ora, se o imóvel usucapiendo não possui averbação, matrícula ou registro em cartório competente, tal como atestado pela certidão de f. 06, não há, por razões óbvias, como exigir do autor/apelante a inclusão no polo passivo da lide, com posterior citação, das supostas pessoas em cujos nomes o bem esteja hipoteticamente registrado.

A respeito, outro não é o entendimento deste egrégio TJMG:

“Ação de usucapião. Certidão negativa expedida pelo cartório competente. Ausência de registro imobiliário de origem. Extinção do processo por carência de ação. Impossibilidade. - A certidão negativa expedida por cartório competente, em que se atesta a ausência de proprietário do imóvel objeto da ação de usucapião, não impede o prosseguimento da ação, porque o referido documento tem a função de instruir o processo, a fim de se averiguar a presença dos requisitos necessários à configuração de usucapião. Não há como se exigir que a parte autora proceda à indicação precisa do propenso proprietário do imóvel objeto da ação de usucapião para formar a relação processual, sendo impossível citar pessoalmente o eventual proprietário, visto que incerto em face de ausência de registro imobiliário de origem” (TJMG - Apelação Cível 1.0024.07.493508-1/001 - Relator: Des. José Affonso da Costa Côrtes - 15ª Câmara Cível - j. em 23.09.2010 - p. em 14.10.2010).

Em que pese meu profundo respeito, a atenta leitura da sentença objurgada acaba levando a crer que o douto Magistrado a quo se sentiu pressionado pelo CNJ e pela CGJ/MG a dar uma rápida solução ao feito, mas solução esta que, renovada a vênia, não pode prevalecer.

Ainda que sejam notórias as dificuldades estruturais e funcionais existentes na 1ª instância, que, inclusive, são perfeita e profundamente conhecidas por este Relator, que perante ela atuou por mais de duas décadas, sempre enfrentando e buscando solucionar, de forma real e com efetividade, os litígios que lhe eram apresentados, e por mais que seja compreensível o desconforto do respeitável Juiz primevo em relação ao excesso de ações que assoberba cada vez mais a máquina judiciária, o Magistrado não pode furtar-se à prestação jurisdicional cujo munus lhe foi confiado, ceifando o direito daquele que busca no Judiciário a solução de um litígio, muito menos sem que lhe seja dada a oportunidade de comprovar se possui ou não o direito pretendido, como ocorreu visivelmente na situação dos autos.

De tal sorte, não possuindo o bem usucapiendo registro imobiliário, matrícula ou averbação em cartório competente, não há como exigir do autor/apelante a inclusão no polo passivo da lide e a citação dos supostos proprietários do imóvel, que nesta qualidade estejam indicados em seu respectivo registro, situação que revela o desacerto da sentença atacada e a necessidade de ser ela cassada, para que o feito tenha o seu regular prosseguimento, com a devida instrução, por meio da oitiva das testemunhas, inclusive já arroladas pelo requerente.

Ante todo o exposto, dou provimento ao recurso, para cassar a sentença de 1º grau e determinar que o feito tenha o seu regular prosseguimento, com a reabertura da fase instrutória e possível designação de audiência para a oitiva das testemunhas já arroladas pelo apelante.

Custas, ao final.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores João Cancio e Sérgio André da Fonseca Xavier.

Súmula - DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Data: 28/07/2016 - 10:51:50   Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico
Extraído de Sinoreg/MG

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