Artigo - Não se pode admitir execução fiscal contra cônjuge a qualquer custo - Por Artur Ricardo Ratc

Artigo - Não se pode admitir execução fiscal contra cônjuge a qualquer custo - Por Artur Ricardo Ratc

Publicado em 13/07/2017

As execuções fiscais e decisões recentes do Poder Judiciário tem espantado os contribuintes devedores de tributos que supostamente vivem em um Estado Democrático de Direito (oposto ao autoritarismo), em que os indivíduos possuem (ou deveriam possuir) o direito fundamental do devido processo legal.

Uma recente decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região expõe o “caos” jurídico que vivenciamos ao decretar a possibilidade de penhora na conta do cônjuge que é casado em regime de comunhão parcial de bens do executado.

Não bastasse o caos financeiro, alguns juízes e tribunais entendem que o cônjuge pode sofrer constrição via Bacen-Jud, eis que metade do valor encontrado em sua conta eventualmente pertence ao devedor — executado em processo judicial.

O absurdo parte da premissa de primeiro penhorar bens do cônjuge para depois analisar se os mesmos são frutos de ato ilícito ou não. Aliás sobre o tema o STJ confeccionou a seguinte Súmula 251 que prevê: “A meação só responde pelo ato ilícito quando o credor, na execução fiscal, provar que o enriquecimento dele resultante aproveitou ao casal.”

Qual seria a lógica interpretativa do ordenamento de acordo com a referida súmula? A máxima é que cabe ao credor primeiramente comprovar a ilicitude dos bens do cônjuge e não o contrário, é dizer, ter primeiro seus bens penhorados por ser casado no regime de comunhão parcial com o executado e depois de penhorados os bens, o cônjuge, ter que comprovar algo que sequer foi comprovado anteriormente pelo credor.

Por suposto, que inicialmente, a empresa quando executada, deve responder por suas obrigações e posteriormente após a comprovação de algum ato contrário ao contrato social, má-fé ou fraude, através de um incidente de desconsideração de personalidade jurídica o sócio deveria ser responsabilizado. Só após esse trâmite e comprovado que o cônjuge se beneficiou indevidamente, caberia à Fazenda Pública requerer a aplicação da Súmula 251 do STJ e não a penhora direta para depois o próprio cônjuge que sofreu o ônus comprovar que seus bens são lícitos.

Reiteramos, vivemos em um Estado que vige o devido processo legal onde a parte deve ter à disposição todos os instrumentos oferecidos no ordenamento jurídico para se defender, pois o contrário disso, seria vivenciar um Estado Democrático de Direito apenas “no papel”, conforme lições de Ferdinand Lassale. E aí? Como deveria ser?

A lógica, assim, seria respeitar a Constituição e o devido processo legal com a comprovação do credor que os bens do cônjuge são ilícitos! E mais! Nada disso deveria ocorrer na ótica contemporânea, sem que antes haja o incidente de desconsideração de personalidade jurídica previsto no art. 133 do Código de Processo Civil, quando o devedor for pessoa jurídica, eis que patrimônio desta com a pessoa física não se comunicam.

Não se pode partir da premissa que tudo é errado e fraudulento e todos devedores devem sofrer as mesmas consequências em nome da “prevalência da execução do credor e submissão do devedor”. Tal premissa não se adequa ao Estado de Direito que oferece meios de comprovação de irregularidades e instrumentos confiáveis.

Aliás, havia uma discussão que era objeto de recurso repetitivo no STJ, acerca da necessidade de citação válida antes da determinação da penhora on-line (REsp 1.357.362/SP; Tema 691). No entanto, esse tema foi cancelado com o pretexto de “não ter sido caracterizada multiplicidade recursal”. Não obstante, tal tema deveria permanecer na sistemática repetitiva, eis que é impossível imaginar um ato processual sem que antes o processo esteja “perfeito”, é dizer, com a citação válida das partes. Aplica-se, essa sistemática inclusive ao cônjuge que é pego de “supetão” em execução fiscal. Aliás, aprendemos na academia que não existe processo sem a devida citação.

O autoritarismo tributário está aí, leis e súmulas são interpretadas de forma equivocada ao ponto de partimos da simples comunhão parcial de bens para a autorização de penhora de bens do cônjuge. Acredite se quiser, mas o sistema está todo invertido e como dizia o professor Márcio Cammarosano “estamos vivendo em tempos que existe a necessidade de se dizer o óbvio”.

Por fim, o óbvio é que o devido processo legal foi suprimido em nome do Fisco receber seus créditos a qualquer custo, inclusive penhorando contas de cônjuge que possuem seu patrimônio sem qualquer mácula. Você é casado em regime de comunhão parcial de bens? Cuidado!

Fonte: Conjur
Extraído de Colégio Notarial do Brasil

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