A 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo negou o pedido de um casal de idosos para formalizar sua união por meio da validação da certidão de casamento, que descobriram ser falsa após 49 anos. Para o colegiado, sem os requisitos previstos na lei não é possível aprovar um ato inexistente e ilegal.
Em 2015, a esposa precisou da certidão de casamento para poder renovar sua carteira de identidade. Ela então descobriu que o casamento não existia no registro civil competente, apesar de ter sido emitida e entregue ao casal em 1971. Eles acionaram a Justiça para corrigir alguns dados e assim validar a certidão falsa. Após passar pela 1ª Vara Cível da Comarca de Campinas, o caso chegou ao TJ-SP.
A relatora do caso, desembargadora Marcia Dalla Déa Barone, ressaltou que não se tratava apenas de retificar um casamento civil, já que ele oficialmente nunca existiu. Sem as exigências da lei para validar o casamento a partir do documento falso, a solução seria “adotar as medidas legais impostas para a conversão da união estável em que se encontram em casamento civil, diretamente perante o registro civil do seu domicílio”, o que exigiria o ajuizamento de nova ação.
Apesar de o voto da relatora ter ganhado adesão da maioria dos magistrados, o desembargador Ênio Santarelli Zuliani divergiu dessa visão. Para ele, seria possível reconhecer a união como casamento putativo (“imaginário”, mas de boa-fé), e assim registrá-la devidamente.
Pesaram na opinião do desembargador o fato de o casal estar próximo de completar bodas de ouro; a assinatura da esposa, que usa seu nome de “casada”; e o “entendimento de que os dois recorrentes foram vítimas de espertos despachantes que, aproveitando da baixa instrução e da pouca capacidade de discernimento jurídico dos interessados, apresentaram uma certidão de casamento despida de autenticidade”.
O Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) repercutiu o caso em seu site. Um de seus membros, o advogado Euclides de Oliveira, critica a análise fria do colegiado e elogiou o voto divergente. Para ele, na época da emissão documento falso, sequer existia casamento no plano jurídico: “Naquele tempo se falava em concubinato, entendido como fora da lei. Como explicar isso ao idoso casal que somente queria o reconhecimento social de sua longa e frutuosa vida de casados?”.
O advogado José Roberto Moreira Filho, presidente da seção Minas Gerais do IBDFAM, diz que a decisão foi equivocada por privilegiar a formalidade do registro em detrimento da essência da união entre as partes. Para ele, seria possível invocar o princípio da posse de estado de casados: “A própria lei determina que, na dúvida entre as provas favoráveis e contrárias, prevalecerá o casamento”.
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1041799-91.2019.8.26.0114
Fonte: Conjur
Extraído de Anoreg/BR