Clipping – O Popular – Cartório de Araucária (PR) guarda registros da escravidão
"Chama a atenção também a negociação de um escravo, cuja função declarada na escritura era a de “reprodutor”
Clipping – O Popular – Cartório de Araucária (PR) guarda registros da escravidão
O livro de folhas amareladas, visivelmente desgastado pelo tempo, registra a negociação formalizada pelo senhor João de Oliveira Santos, na data de 20 de março de 1873: a venda do escravo João, um jovem de apenas 11 anos, pelo preço de um conto e duzentos mil réis, para o senhor Raphael de Oliveira Mello.
A lavratura ocorreu 15 anos antes da abolição da escravatura, prevista na Lei Áurea de 13 de maio de 1888. A documentação sobre a escravidão em Araucária, que na época era conhecida como Freguesia do Iguassú (distrito de São José dos Pinhais até 1888, quando passou a ser administrado por Curitiba, e em 1890 virou município) faz parte dos arquivos do 1º Tabelionato de Notas de Araucária, o antigo Cartório Pimpão.
Folhear estes livros é como fazer uma verdadeira viagem pelo tempo, que nos permite conhecer uma parte não tão bonita da história da cidade, quando negros eram comprados e vendidos como “propriedades”.
Entre as várias histórias que compõem esta documentação estão Cartas de Alforria, uma delas do ano de 1875, relatando a concessão da Liberdade a uma família de negros, o pai, a mãe e dois filhos menores, que trabalhavam como escravos na propriedade pertencente a um casal. O fato curioso é que eles só conseguiram a liberdade, sob a condição de permanecerem na propriedade, servindo a este mesmo casal.
Em outra escritura conta o caso de um escravo que conseguiu comprar a sua própria liberdade. Chama a atenção também a negociação de um escravo, cuja função declarada na escritura era a de “reprodutor”. Isso mesmo! O escravo foi comprado com a função de gerar filhos, para ampliar a mão de obra.
Naquela época, o trabalho escravo se concentrava no plantio e colheita do café, que predominavam nas lavouras na região do Paraná. Os escravos, por serem considerados uma valiosa propriedade privada, precisavam ser registrados em escrituras em nome de seus “donos”. Fato interessante é que essas negociações eram tributadas, a Sisa era um imposto calculado especificamente para a compra de mão de obra humana.
“O escravo era tratado como um imóvel, tanto que na descrição de suas características na escritura, o que interessava apenas era seu primeiro nome, a cor, idade e função. São muitos fatos curiosos que só mesmo ao folhear os livros, acreditamos serem reais. Aqui temos registros de compra e venda de escravos desde o ano de 1865 até 1888, quando sancionada a Lei Áurea, aliás, muitos desconhecem, mas esta Lei foi criada com prazo de validade de 100 anos, mas na prática ela ainda está valendo”, explicou o auxiliar de cartório Luiz Antônio.
Há 37 anos na profissão, ele é capaz de decifrar os textos arcaicos das escrituras, que apesar das letras bem desenhadas, são de difícil compreensão.
Fonte: O Popular
Extraído de Anoreg/BR