Fatos supervenientes impedem Terceira Turma de declarar liquidez de execução interposta 28 anos após a sentença
Fatos supervenientes impedem Terceira Turma de declarar liquidez de execução interposta 28 anos após a sentença
Em virtude de uma série de fatos supervenientes ocorridos no intervalo de 28 anos entre a sentença e o pedido de cumprimento do comando judicial, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou inviável a execução, em 2011, de título originado de acórdão de 1983 que declarou o direito de propriedade rural ao autor da ação, ajuizada em 1975.
Para o colegiado, com as alterações profundas do cenário fático durante as últimas três décadas – como a modificação da área do imóvel e o posterior levantamento de questões sobre a validade dos registros cartorários à época do início da ação – o título judicial deixou de ter obrigação certa, líquida e exigível, pressupostos fundamentais para que o título seja executado.
No caso que deu origem ao recurso especial, o autor ajuizou contra os réus ação de rescisão e restituição de comodato, relativo a imóvel rural localizado em Petrolina (PE).
Em 1981, o juiz de primeiro grau julgou procedente o pedido, com sentença mantida em segundo grau pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE). O processo transitou em julgado em 1983 e, no mesmo ano, o autor requereu a execução da sentença, buscando a efetiva entrega da propriedade rural.
A ação de execução permaneceu sem qualquer movimentação durante décadas, até que, no ano de 2011, o juiz determinou a intimação do autor para que promovesse o andamento do processo. Em resposta, os herdeiros do autor da ação requereram o cumprimento de sentença e formularam pedido de expedição de mandado de imissão de posse.
Áreas alienadas
Após intimação realizada pelo magistrado, os herdeiros dos réus informaram que não poderiam cumprir a determinação judicial porque a área objeto dos autos não correspondia mais à propriedade discutida nos autos. Segundo eles, algumas áreas que pertenciam à propriedade rural foram alienadas e disponibilizadas à população por meio do programa Minha Casa, Minha Vida.
Além disso, duas empresas ingressaram no processo como assistentes sob o argumento de que adquiriram legitimamente parte do terreno que integra a área pleiteada pelos herdeiros do autor. Na sequência, uma das partes assistentes requereu a extinção do processo em razão de prescrição intercorrente, argumento acolhido pelo magistrado.
Em segunda instância, o TJPE declarou a nulidade do processo de cumprimento de sentença em virtude do não cumprimento do requisito de exigibilidade do título executivo judicial. No acórdão, o tribunal oportunizou às partes o direito à regularização do título executivo, e aos terceiros adquirentes de lotes do imóvel a defesa dos seus direitos.
Condições essenciais
No recurso especial, os herdeiros alegaram, entre outros pontos, que, como previsto no artigo 475-N do Código de Processo Civil de 1973, nas ações de entregar coisa certa, a execução se dá nos próprios autos, sem submeter as partes a um novo processo. Além disso, os recorrentes afirmaram que o acórdão priorizou o suposto direito de terceiros em detrimento do direito de propriedade reconhecido há mais de 30 anos, mediante sentença transitada em julgado.
O relator do recurso especial, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, lembrou que, para se propor a execução, é preciso que haja um título executivo, judicial ou extrajudicial, contendo uma obrigação certa, líquida e exigível, nos termos do artigo 580 do CPC/1973.
Todavia, no caso dos autos, o ministro apontou que não haveria como ser efetivada a tutela jurisdicional executiva, tendo em vista que fatos supervenientes tornaram a obrigação inexequível.
Entre esses fatos, destacou o ministro, estão as alegações de modificação da área delimitada na ação original e a existência de documentos, apresentados pelas empresas assistentes, que apontam a existência de uma cadeia sucessória de propriedade diferente daquela declarada anteriormente no processo.
Além disso, Paulo de Tarso Sanseverino ressaltou que, conforme concluiu o TJPE, "as questões levantadas pelos próprios recorrentes (alienações fraudulentas, fraude em registro cartorário, grilagem etc.), além de manifestamente prejudiciais ao cumprimento da obrigação, não comportam análise exauriente em sede de cumprimento de sentença".
Consequentemente, ao manter o acórdão do tribunal pernambucano, o ministro Sanseverino concluiu que seria imprescindível examinar, de forma prévia, a verdadeira cadeia dominial do imóvel, a fim de que seja possível investigar eventual culpa dos antigos comodatários, bem como para preservar eventual posse de terceiros.
Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1835286
Superior Tribunal de Justiça (STJ)