Montadora é responsabilizada por carro que concessionária vendeu e não entregou

25/10/2013 - 07h46 DECISÃO

Montadora é responsabilizada por carro que concessionária vendeu e não entregou

A montadora pode responder solidariamente pela inadimplência da concessionária que deixa de entregar veículo vendido ao consumidor, decidiu a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso em que a Fiat tentava reverter sua condenação pela Justiça paulista.

O caso envolve o consórcio Top Fiat, administrado pela concessionária Mirafiori, alvo de ação civil pública que tramita na 40ª Vara Civil de São Paulo. Segundo o Ministério Público, 3.800 consumidores chegaram a aderir ao plano da concessionária, cujos primeiros carros foram entregues em 1997. Com a insolvência da empresa, muitos compradores ficaram sem ver o veículo pelo qual pagaram.

Uma consumidora ajuizou ação de rescisão contratual cumulada com indenização por danos morais e materiais contra Mirafiori S/A – Distribuidora de Veículos e Fiat Automóveis S/A. No processo – independente da ação civil pública –, a mulher alega ter firmado contrato de compra e venda para entrega futura de um Palio 1.0, com valor, à época, de R$ 13.360, em 36 parcelas. Mesmo depois de pagar integralmente o valor, o carro não foi entregue.

O juízo de primeiro grau extinguiu o processo em relação à Fiat, por ilegitimidade passiva, e julgou parcialmente procedente o pedido, para condenar a concessionária a devolver os valores pagos e indenizar a consumidora. Em grau de apelação, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) reconheceu a responsabilidade solidária entre concessionária e montadora.

Recurso da Fiat

A Fiat ingressou com recurso no STJ, alegando não ser cabível a responsabilidade solidária, uma vez que a Lei 6.729/79 (que regula a relação entre concedente e concessionária no mercado de veículos) impede a montadora de interferir nos negócios do revendedor.

Sustentou ainda que a criação do consórcio Top Fiat, no âmbito do qual foi assinado o contrato de compra e venda, é de total responsabilidade da concessionária, por isso a montadora não poderia ser condenada em ação de indenização.

De acordo com o relator no STJ, ministro Luis Felipe Salomão, a jurisprudência, dependendo das circunstâncias do caso, tem admitido a responsabilização da montadora. Ao analisar o processo, ele verificou que o TJSP concluiu que o uso do nome Fiat no consórcio foi admitido pela fabricante.

Responsabilidade objetiva

Segundo o ministro, a responsabilidade atribuída à montadora é objetiva, amparada fundamentalmente no Código de Defesa do Consumidor (CDC), daí o cabimento de sua condenação.

Na responsabilidade objetiva, tem-se uma imputação legal do dever de indenizar, independentemente da conduta do responsável e de seu agir culposo. O relator entendeu que o caso se enquadra no artigo 34 do CDC, que dispõe: “O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos.”

A norma estabelece que a responsabilidade pelo descumprimento dos deveres de boa-fé, transparência, informação e confiança recai sobre qualquer dos integrantes da cadeia de fornecimento que dela se beneficiou.

Bônus e ônus

Segundo o ministro, a utilização da marca pela concessionária é inerente ao próprio contrato de concessão. “Com a assinatura do contrato de concessão, a fabricante assume o bônus e o ônus da utilização de sua marca, e é exatamente por esta que o consumidor sente-se atraído, sendo desimportante, na generalidade das vezes, dirigir-se a esta ou àquela concessionária”, afirmou Salomão.

O ministro destacou que, ao comprar o veículo, o consumidor crê que faz negócio com a montadora, e apenas de forma intermediária com a concessionária.

Como as instâncias ordinárias reconheceram que o consórcio Top Fiat foi objeto de ampla publicidade à época e que a Fiat teve conhecimento dele, não é possível admitir – segundo o relator – que “a concedente silencie quando as práticas comerciais da concessionária sejam-lhe economicamente proveitosas e, futuramente, insurja-se contra estas mesmas práticas, quando interpelada a ressarcir danos causados a terceiros”.

Fiscalização

Sobre a alegação da montadora de que a Lei 6.729 não permite ingerência nos negócios da concessionária, Salomão disse que nada impede que a concedente fiscalize o cumprimento do contrato de concessão. Isso ocorre, por exemplo, no que se refere às vendas exclusivas da marca.

Se houvesse práticas comerciais não admitidas, caberia à montadora rescindir o contrato, se quisesse. O que é vedado pela lei é a ingerência administrativa, econômica ou jurídica nos negócios celebrados pela concessionária, acrescentou o relator.

Ele rebateu ainda a ideia de que o caso devesse ser resolvido exclusivamente com base na Lei 6.729, como pretendia a Fiat, pois esta lei não aborda os direitos do consumidor, mas trata apenas da relação entre as empresas envolvidas na concessão. O uso exclusivo da Lei 6.729 só é possível, disse Salomão, quando a ação é ajuizada por uma das partes do contrato de concessão contra a outra.

 

Superior Tribunal de Justiça (STJ)
 

Notícias

STJ admite penhora de direito aquisitivo de imóvel do Minha Casa, Minha Vida

DEVE, TEM QUE PAGAR STJ admite penhora de direito aquisitivo de imóvel do Minha Casa, Minha Vida Tiago Angelo 12 de janeiro de 2025, 9h45 “Nesse contexto, como ainda não se adquiriu a propriedade plena do imóvel, eventual penhora não poderá recair sobre o direito de propriedade – que pertence ao...

Artigo 5º - Contratos de namoro: precaução ou burocracia?

Artigo 5º - Contratos de namoro: precaução ou burocracia? O Artigo 5º aborda o crescimento do uso dos contratos de namoro no Brasil, que registrou um aumento significativo em 2023. O programa traz a advogada Marcela Furst e a psicóloga Andrea Chaves para discutir os motivos que levam os casais a...

Imóvel como garantia: O que muda com a nova regulamentação do CMN?

Imóvel como garantia: O que muda com a nova regulamentação do CMN? Werner Damásio Agora é possível usar o mesmo imóvel como garantia em várias operações de crédito. A resolução CMN 5.197/24 amplia o acesso ao crédito imobiliário para pessoas físicas e jurídicas. domingo, 5 de janeiro de...

Câmara aprova marco legal das garantias de empréstimos

Projeto de lei Câmara aprova marco legal das garantias de empréstimos Projeto autoriza empresas a intermediar oferta de garantias entre cliente e instituições financeiras. Texto segue para o Senado. Da Redação quinta-feira, 2 de junho de 2022 Atualizado às 08:17 A Câmara dos Deputados aprovou nesta...

Defesa global do vulnerável: a dicotomia notarial entre civil law e common law

Opinião Defesa global do vulnerável: a dicotomia notarial entre civil law e common law Ubiratan Guimarães 26 de dezembro de 2024, 11h12 A atuação notarial é, então, fundamental para garantir o cumprimento desses princípios e a formalidade da escritura pública é crucial para assegurar que as partes...