Possibilidade de extinção de usufruto vitalício: STJ decide que a falta de uso ou fruição do bem pode causar a perda do direito

Possibilidade de extinção de usufruto vitalício: STJ decide que a falta de uso ou fruição do bem pode causar a perda do direito

Marcela de Freitas Santos

Usufruto vitalício exige uso contínuo. STJ reforça extinção por abandono, valorizando a função social da propriedade conforme o Código Civil.

quinta-feira, 28 de novembro de 2024
Atualizado em 27 de novembro de 2024 13:45

O usufruto, direito real que confere a alguém o uso e gozo de um bem sem a sua propriedade, possui uma importante função na preservação e utilização econômica e social dos bens, especialmente imóveis. Esse instituto jurídico é regulado pelo Código Civil, especificamente entre os artigos 1.390 e 1.411, de forma que pode ser concedido por um período determinado ou ser vitalício, mas é extinto automaticamente com a morte do usufrutuário ou quando ocorre alguma condição legal, como o não uso do bem por um longo tempo.

Isso porque, embora o usufruto possa ser instituído com caráter vitalício, o STJ tem entendido que a falta prolongada de uso ou fruição do bem pode resultar na extinção desse direito, mesmo que tenha sido previsto como vitalício, atentando-se exatamente às hipóteses de extinção do usufruto, previstas no artigo 1.410, especificamente no inciso VIII, do Código Civil.1

Hodiernamente, alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça consagram sobre essa possibilidade de extinção do usufruto vitalício, como no caso do REsp 1651270 SP 2017/0020627-7, julgado pelo Relator Ministro da Terceira Turma do STJ, Ricardo Villas Bôas Cueva, que entendeu que a vitaliciedade não significa que o usufruto seja eternizado, pois, consoante o artigo 1.410, inciso VIII do Código Civil, o não uso ou fruição do bem é causa de sua extinção.

Nesse caso específico, o ex-marido reivindicou o direito de partilhar o usufruto do imóvel para obter renda de aluguel, porém, ele havia deixado de exercer o direito por mais de uma década, sem contribuir para impostos e despesas de conservação do imóvel, o que caracterizou o abandono, um dos fundamentos para a extinção do usufruto conforme o artigo 1.410, inciso VIII, do Código Civil.

Ainda, o STJ afastou a necessidade de uma sobrepartilha do imóvel, pois este já havia sido doado aos filhos do casal com a reserva de usufruto. Nesse contexto, o Tribunal reforçou que a sobrepartilha é necessária apenas em casos onde há desconhecimento ou omissão de bens na divisão original, o que não ocorreu nesse caso?. Já quanto ao prazo decadencial para reivindicar o usufruto, este também é limitado em 10 (dez) anos, o que é previsto pelo artigo 205 do Código Civil2.

Diante do exposto, significa dizer que mesmo que a modalidade de usufruto seja a vitalícia, ela poderá não ser considerada como eterna, caso o usufrutuário não use o bem, de modo que o direito pode ser extinto.

Esse entendimento da corte reflete o princípio da função social da propriedade, baseando-se na interpretação do Código Civil e reforçando a necessidade de efetivo exercício do direito de usufruto. Assim, a jurisprudência firmada pelo STJ traz importantes impactos práticos, especialmente para casos em que o usufruto de um imóvel é deixado ocioso, seja por decisão do usufrutuário ou por impossibilidade de uso.

A prolação de decisões como esta proferida no REsp 1651270 SP 2017/0020627-7, citada acima, no sentido de que a vitaliciedade não necessariamente impõe que o usufruto seja eternizado, com fulcro no artigo 1.410, inciso VIII do Código Civil, consagra um marco para evitar futuras disputas judiciais em que há contratos para regularização de imóveis, com cláusulas de usufruto, garantindo que o direito ao instituto não seja perpetuado indefinidamente sem que haja o uso do bem.

Logo, nota-se a importância do uso efetivo do usufruto para evitar a perda do direito e sobre o papel dos Tribunais em assegurar a função social da propriedade, sendo este entendimento um movimento de interpretação dos direitos reais.

Marcela de Freitas Santos
Advogada no escritório CM Advogados - OAB/SP 483.045 Graduada em Direito pela Universidade de Ribeirão Preto - UNAERP Pós Graduada em Lei Geral de Proteção de Dados - Legale Curso de Extensão em Direito Contratual - FGV Curso de Extensão em Direito Digital - USP

Fonte: Migalhas

                                                                                                                            

Notícias

Defesa global do vulnerável: a dicotomia notarial entre civil law e common law

Opinião Defesa global do vulnerável: a dicotomia notarial entre civil law e common law Ubiratan Guimarães 26 de dezembro de 2024, 11h12 A atuação notarial é, então, fundamental para garantir o cumprimento desses princípios e a formalidade da escritura pública é crucial para assegurar que as partes...

União estável pós-morte deve ser julgada no último domicílio do casal

Direitos sucessórios União estável pós-morte deve ser julgada no último domicílio do casal 19 de dezembro de 2024, 12h31 No recurso especial, a mulher alegou que a competência seria do juízo do domicílio do réu apenas se nenhuma das partes morasse no lugar do último domicílio do suposto...

Reforma do Código Civil, regime de bens dos cônjuges e sociedades empresárias

Opinião Reforma do Código Civil, regime de bens dos cônjuges e sociedades empresárias Maria Carolina Stefano Pedro Gabriel Romanini Turra 13 de dezembro de 2024, 6h31 O Código Civil Brasileiro, em seu artigo 977, estabelece que “faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com...