Quebra de confiança autoriza rescisão antecipada de comodato centenário

DECISÃO  07/11/2016 08:02

Quebra de confiança autoriza rescisão antecipada de comodato centenário

O comprometimento da confiança entre as partes que assinam contrato de comodato – empréstimo gratuito no qual o comodante cede, temporariamente, ao comodatário um bem infungível – permite a rescisão unilateral do pacto, ainda que não haja prova de urgência para devolução do bem.

Com base nesse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão de segunda instância que considerou rescindido contrato de comodato de imóvel cedido a pastor que, logo após a assinatura do termo, trocou de instituição religiosa. A cessão do imóvel havia sido feita pelo prazo de cem anos.

Em ação de reintegração de posse, os autores afirmaram que o imóvel, localizado em Carazinho (RS), foi cedido em comodato ao pastor para que ali fossem instalados serviços de assistência da Igreja do Evangelho Quadrangular.

Prazo absurdo

O pedido foi julgado procedente em primeira instância. O magistrado entendeu que o arrependimento do comodato ocorreu após o pastor ingressar em outra instituição religiosa, a Igreja Internacional da Fé, e a realizar cultos da nova igreja no local, situação não prevista à época do contrato. Assim, apesar de não haver prova sobre urgência na retomada do bem, o juiz considerou que o comodante foi induzido a erro quando realizou o ajuste.

A sentença foi confirmada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Para os desembargadores gaúchos, os autores assinaram contrato por motivações religiosas, cedendo o imóvel em comodato pelo prazo “absurdo” de cem anos, que, caso fosse mantido, atingiria a própria natureza do comodato e inviabilizaria a retomada do bem.

O pastor recorreu ao STJ sob o argumento de que o contrato com período determinado estabelecido entre as partes só poderia ser rescindido antes do prazo no caso de comprovada necessidade imprevista e urgente do comodante, o que não ficou comprovado nos autos.

Limitação temporal

O relator do recurso especial na Quarta Turma, ministro Luis Felipe Salomão, esclareceu que o regime de comodato pode ser contratado para vigorar por prazo determinado ou indeterminado (por exemplo, vinculado à realização de um trabalho). Todavia, em qualquer dos casos, o elemento de temporariedade é característico dessa modalidade de empréstimo, cujo regime não pode ser vitalício ou perpétuo.

“Desse modo, a fixação de lapso centenário, que supera a expectativa média de vida do ser humano, vai de encontro a tal característica do comodato, não podendo subsistir a cláusula contratual que possui o condão de transmudar a declaração de vontade do comodante em doação destinada à pessoa que nem sequer mantém vínculo com a instituição religiosa que se pretendia beneficiar”, sublinhou o ministro ao afastar a validade da cláusula temporal centenária.

Confiança

Além disso, o ministro lembrou que os comodatos são baseados na relação de confiança entre as partes. No caso analisado, Salomão considerou que a mudança de igreja instalada no imóvel, sem o consentimento do comodante, atingiu a boa-fé do negócio jurídico, constituindo motivo válido para a rescisão contratual.

“Nesse contexto, infere-se a regularidade da resilição unilateral do comodato operada mediante denúncia notificada extrajudicialmente ao comodatário (artigo 473 do Código Civil), pois o ‘desvio’ da finalidade encartada no ato de liberalidade constitui motivo suficiente para deflagrar seu vencimento antecipado e autorizar a incidência da norma disposta na primeira parte do artigo 581 do retrocitado codex, sobressaindo, assim, a configuração do esbulho em razão da recusa na restituição da posse do bem, a ensejar a procedência da ação de reintegração”, concluiu.

Leia o voto do relator.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1327627
 
Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Notícias

Descoberta de traição após núpcias não enseja anulação do casamento

Extraído de Arpen SP TJ-SC - Descoberta de traição após núpcias não enseja anulação do casamento A 3ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça manteve sentença da comarca de Itajaí, que julgou improcedente o pedido de anulação de casamento ajuizado por uma mulher que descobriu ter sido traída...

Repercussão geral

  STF julgará indulto e suspensão de direitos políticos Os ministros do Supremo Tribunal Federal entenderam que existe repercussão geral na discussão sobre a constitucionalidade ou não da extensão do indulto a medida de segurança decretada em relação a acusado considerado perigoso e submetido...

Distribuidora não pode vender a posto de concorrente

Extraído de domtotal 10/03/2011 | domtotal.com Distribuidora não pode vender a posto de concorrente Postos que firmam contrato de exclusividade com uma distribuidora de combustíveis estão obrigados a adquirir e revender os produtos apenas da empresa contratante. A decisão é da 15º Vara Federal do...

Lei mineira que impede desconto em folha inferior a 10 reais é contestada no STF

Quinta-feira, 10 de março de 2011 Lei mineira que impede desconto em folha inferior a 10 reais é contestada no STF A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4571) com pedido de liminar, no Supremo Tribunal Federal (STF), na qual contesta...

STJ garante à companheira partilha dos bens adquiridos durante união de 18 anos

09/03/2011 - 16h06 DECISÃO STJ garante à companheira partilha dos bens adquiridos durante união de 18 anos A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão que reconheceu a união estável, pelo período de 18 anos, de um casal cujo homem faleceu, bem como a partilha dos bens...