Quinta Turma estabelece critérios para validade de citação por aplicativo em ações penais
Quinta Turma estabelece critérios para validade de citação por aplicativo em ações penais
Como ocorre no processo civil, é possível admitir, na esfera penal, a utilização de aplicativo de mensagens – como o WhatsApp – para o ato de citação, desde que sejam adotados todos os cuidados para comprovar a identidade do destinatário. Essa autenticação deve ocorrer por três meios principais: o número do telefone, a confirmação escrita e a foto do citando.
O entendimento foi fixado pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que, embora reconhecendo a possibilidade de comunicação judicial via WhatsApp, anulou uma citação realizada por meio do aplicativo sem nenhum comprovante de autenticidade da identidade da parte. A decisão foi unânime.
Segundo o relator do habeas corpus, ministro Ribeiro Dantas, a citação do acusado é um dos atos mais importantes do processo, pois é por meio dele que a pessoa toma conhecimento das imputações que o Estado lhe direciona e, assim, passa a poder apresentar seus argumentos contra a versão da acusação. Esse momento, destacou, aperfeiçoa a relação jurídico-processual penal que garante o contraditório e a ampla defesa, por meio do devido processo legal.
"Não se pode prescindir, de maneira alguma, da autêntica, regular e comprovada citação do acusado, sob pena de se infringir a regra mais básica do processo penal, qual seja a da observância ao princípio do contraditório", disse o ministro.
Sem fechar os olhos
Ribeiro Dantas ressaltou que vários obstáculos poderiam ser alegados contra a citação via WhatsApp – por exemplo, a falta de previsão legal, a possível violação de princípios que norteiam o processo penal e até mesmo o fato de que só a União tem competência para legislar sobre matéria processual.
Entretanto, o relator declarou que não é possível "fechar os olhos para a realidade", excluindo, de forma peremptória, a possibilidade de utilização do aplicativo para a prática de comunicação processual penal. O ministro enfatizou que não se trata de permitir que os tribunais criem normas processuais, mas de reconhecer que, em tese, a adoção de certos cuidados pode afastar prejuízos e nulidades nas ações penais.
"A tecnologia em questão permite a troca de arquivos de texto e de imagens, o que possibilita ao oficial de Justiça, com quase igual precisão da verificação pessoal, aferir a autenticidade da identidade do destinatário", afirmou.
Situações possíveis
Para exemplificar, Ribeiro Dantas disse que seria possível validar uma situação na qual o oficial de Justiça, após se identificar pelo WhatsApp, pedisse ao acusado o envio da foto de seu documento e de um termo de ciência da citação, assinado de próprio punho – quando o agente público possuísse meios de comparar a assinatura, ou outra forma de se assegurar sobre a identidade do interlocutor.
O ministro ponderou, todavia, que a mera confirmação escrita da identidade pelo usuário do WhatsApp não é suficiente para se considerar o acusado ciente da imputação penal, especialmente quando não houver foto individual no aplicativo.
Além disso, mesmo nos casos em que os riscos forem mitigados pela verificação daqueles três elementos – número do telefone, confirmação escrita e foto –, o relator ressalvou o direito da parte de comprovar eventual nulidade, relacionada, por exemplo, a furto ou roubo do celular.
Sem foto
No caso analisado pelo colegiado, o ministro apontou que há nos autos certidão de citação via WhatsApp, bem como imagem da conversa entre o oficial de Justiça e o acusado. Contudo, o relator enfatizou que o citando não possui foto, que diminuiria os riscos de uma citação inválida, nem há outra prova incontestável de sua identidade.
"Diante da ausência de dado concreto que autorize deduzir tratar-se efetivamente do citando, não se pode aferir com certeza que o indivíduo com quem se travou o diálogo via WhatsApp era o acusado. Destaque-se que a presunção de fé pública não se revela suficiente para o ato", concluiu o ministro, considerando "imperiosa" a decretação de nulidade da citação.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):HC 641877
Superior Tribunal de Justiça (STJ)