Reexame necessário - Mandado de segurança - Desapropriação - ITBI - Não incidência - Sentença confirmada
Reexame necessário - Mandado de segurança - Desapropriação - ITBI - Não incidência - Sentença confirmada
REEXAME NECESSÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA - DESAPROPRIAÇÃO - ITBI - NÃO INCIDÊNCIA - SENTENÇA CONFIRMADA
- Por constituir a desapropriação forma de aquisição originária da propriedade, inexistindo o caráter de onerosidade, não encerra o ato hipótese de incidência do ITBI.
Reexame Necessário Cível nº 1.0035.14.003515-1/001 - Comarca de Araguari - Remetente: Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Araguari - Autor: Consórcio Capim Branco Energia - CCBE - Réu: Município de Araguari - Autoridade coatora: Secretário Municipal de Fazenda do Município de Araguari - Relator: Des. Belizário de Lacerda
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em confirmar a sentença no reexame necessário.
Belo Horizonte, 26 de abril de 2016. - Belizário de Lacerda - Relator.
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
DES. BELIZÁRIO DE LACERDA - Consoante se extrai dos autos, Consórcio Capim Branco Energia - CCBE impetrou Mandado de Segurança contra ato do Secretário Municipal de Fazenda do Município de Araguari/MG, visando obter, inclusive em sede de liminar, o registro da carta de sentença decorrente do processo de desapropriação nº 0035.06.075034-2 referente à matrícula nº14.360, sem a exigência do ITBI.
Afirmou que adquiriu a propriedade do imóvel objeto da matrícula acima referida em sede de processo de desapropriação, a qual é forma de aquisição originária da propriedade.
Asseverou, todavia, que, para registro da carta de sentença, estaria a Municipalidade exigindo o recolhimento do ITBI, não obstante entenda o impetrante que tal tributo não incida, na hipótese, por não se tratar de ato de transmissão inter vivos de propriedade.
Informou, ainda, que necessitou ajuizar outros dois Mandados de Segurança contra a Municipalidade (009924-5/11 e 006485-6/13), e, não obstante já tenha sido reconhecida a não incidência do ITBI, este continua a ser exigido pelo impetrado.
Instruiu a inicial com procuração e documentos de f. 13/50.
A liminar foi deferida pela decisão de f. 56/58.
O Município de Araguari se manifestou às f. 65/67, e a autoridade coatora prestou as informações de f. 68/69, nas quais defendem a incidência do tributo, já que o imóvel, ainda que adquirido por meio de desapropriação, não passou a deter natureza jurídica de bem público de uso especial, mas manteve o status de bem privado, visto que destinado à exploração de atividade econômica particular.
Manifestação do impetrante às f. 72/76.
Pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Araguari foi proferida a r. sentença de f. 79/81, por meio da qual concedeu a segurança pleiteada, confirmando integralmente a liminar concedida initio litis.
Conheço da remessa oficial, visto que cabível na espécie.
No caso dos autos, a impetrante obteve concessão de uso de bem público, para exploração do potencial hidrelétrico do Rio Araguari e, para viabilizar essa exploração, a área destinada à implantação das obras foi declarada de utilidade pública para fins de desapropriação. A impetrante propôs ação de desapropriação, em razão da declaração de utilidade pública da área de propriedade de Alda de Oliveira Gomes, sendo, ao final, expedida carta de sentença para fins de registro da área desapropriada em nome dos expropriantes. Sem embargo, o Município estaria exigindo recolhimento de ITBI.
A impetrante aduz que, em se tratando de aquisição originária de propriedade, não se justificaria a cobrança da exação.
Posto isto, tem-se que a Constituição da República de 1988 dispõe sobre o fato gerador do ITBI, em seu art. 156, inciso II, e § 2º, inciso I. In verbis:
``Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
[...]
II - transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
[...]
§ 2º O imposto previsto no inciso II:
I - não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;
II - compete ao Município da situação do bem.
[...].
O CTN, por sua vez, dispunha sobre o fato gerador do ITBI em seu art. 35, então de competência dos Estados e do Distrito Federal (e também incidente sobre a transmissão causa mortis, dada a redação do art. 24, inciso I, da Constituição da República de 1967), e em seus arts. 36 e 37 (recepcionados pela Constituição de 1988), há previsão das hipóteses de não incidência. Confira-se:
``Art. 36. Ressalvado o disposto no artigo seguinte, o imposto não incide sobre a transmissão dos bens ou direitos referidos no artigo anterior:
I - quando efetuado para sua incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em pagamento de capital nela subscrito;
II - quando decorrente da incorporação ou da fusão de uma pessoa jurídica por outra com outra.
Parágrafo único. O imposto não incide sobre a transmissão aos mesmos alienantes, dos bens e direitos adquiridos na forma do inciso I deste artigo, em decorrência da sua desincorporação do patrimônio da pessoa jurídica a que foram conferidos.
Art. 37. O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos a sua aquisição.
§ 1º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo quando mais de 50% (cinquenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subsequentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas neste artigo.
§ 2º Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição.
§ 3º Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar-se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa data.
§ 4º O disposto neste artigo não se aplica à transmissão de bens ou direitos, quando realizada em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante.
Dessa forma, tem-se que o ITBI, imposto de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem por fato gerador a transmissão, inter vivos, por ato oneroso de bens imóveis por natureza ou acessão física e de direito reais sobre bens imóveis, exceto os de garantia e as servidões, e a cessão por ato oneroso de direitos relativos à aquisição de bens imóveis.
Aires F. Barreto discorre sobre o aspecto material da hipótese de incidência do ITBI:
"Relativamente à hipótese de incidência do chamado imposto de transmissão de imóveis, a primeira consideração necessária consiste em enfatizar que esta, por força de seu protótipo constitucional, deverá conceituar realidade integrada por elementos vários, que não se constituirá somente no ato de transmitir, nem no de a transmissão ser inter vivos, nem apenas na natureza desse ato (oneroso), nem só no imóvel, mas na conjugação de todos esses termos, que, conceitualmente, reporta-se ao ato de transmissão inter vivos, por ato oneroso, que tem por objeto um imóvel por natureza ou acessão física. Essa, em síntese, deverá ser a consistência material da hipótese de incidência desse imposto, em face do que estatui a norma constitucional, que o prefigurou de modo preciso" (Curso de direito tributário municipal. São Paulo: Saraiva. 2009, p. 284).
Dessa forma, importa perquirir se, no caso de desapropriação, como a que é tratada no caso, ocorre a hipótese de incidência do ITBI.
José Eduardo Soares de Melo entende não incidir o imposto nessas operações. Em suas palavras:
``O imposto não incide em usucapião, desapropriação, servidões, bens de mão-morta, mandato em causa própria ou com poderes equivalentes e seu substabelecimento, quando outorgado para o mandatário receber a escritura definitiva do imóvel, quando este voltar ao domínio do antigo proprietário por força de retrovenda, de retrocessão ou pacto de melhor comprador; transmissão de ações de sociedade, usufruto, locação e comodato. (Impostos federais, estaduais e municipais. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, p. 276.)
Corroborando tal entendimento, entendo não incidir ITBI nas desapropriações, na medida em que a aquisição da propriedade é originária, não havendo onerosidade para embasar a incidência da exação.
Com efeito, a desapropriação é compulsória, e não voluntária, sendo um procedimento por meio do qual o Poder Público despoja alguém da propriedade mediante justa indenização. Nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho:
``Desapropriação é o procedimento de direito público pelo qual o Poder Público transfere para si a propriedade de terceiro, por razões de utilidade pública ou de interesse social, normalmente mediante o pagamento de indenização (Manual de direito administrativo. 24. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011).
Dessa forma, o valor pago ao antigo proprietário do imóvel desapropriado caracteriza-se como indenização, que constitui uma forma de reparo de uma perda. Por consequência, isso descaracteriza a onerosidade do negócio, pois não há autonomia da vontade do proprietário, ou transmissão voluntária do bem imóvel, não se podendo caracterizar a operação como onerosa para fins de incidência do ITBI. De mais a mais, não há propriamente uma transmissão do imóvel do terceiro para o expropriante, mas a aquisição direta da propriedade, por meio do instituto da desapropriação, não havendo subsunção à hipótese de incidência do ITBI.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes deste eg. Tribunal de Justiça:
``Ementa: Apelação Cível. Procedimento administrativo. Dúvida suscitada por oficial de cartório. Exigências. ITBI. ITR. CCIR. Certidão negativa de ônus. Título oriundo de desapropriação amigável. Ausência de aquisição originária da propriedade. Exigências legítimas. Recurso não provido. - Uma vez sendo considerada a desapropriação como forma originária de aquisição da propriedade, não se justifica a apresentação de óbices de cunho resgistrário; no entanto, o mesmo não se aplica à desapropriação amigável que decorre da convergência de vontade das partes, e não do ato de império estatal (Apelação Cível 1.0334.11.000729-4/001, 3ª Câmara Cível, Rel. Des. Dídimo Inocêncio de Paula, in DJ de 17.02.2012).
``Ementa: Apelação Cível. Ação anulatória de débito fiscal. ITBI. Registro de imóvel decorrente de desapropriação. Forma de aquisição originária da propriedade. Inocorrência do fato gerador do ITBI. Não incidência. Procedência do pedido inicial. Recurso a que se nega provimento (Apelação Cível 1.0382.10.001168-5/001, 2ª Câmara Cível, Rel. Des. Roney Oliveira, in DJ de 22.03.2011).
Mediante tais fundamentos é que monocraticamente, em reexame necessário, confirmo a sentença concessiva da segurança.
Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Peixoto Henriques e Wilson Benevides.
Súmula - CONFIRMARAM A SENTENÇA NO REEXAME NECESSÁRIO.
Data: 09/06/2016 - 09:51:59 Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico
Extraído de Sinoreg/MG