STJ: Recurso especial. Direito das sucessões. Inventário. – Omissão do acórdão recorrido. Inexistência
STJ: Recurso especial. Direito das sucessões. Inventário. – Omissão do acórdão recorrido. Inexistência
Publicado em: 21/09/2015
Recurso Especial. Direito das Sucessões. Inventário. – Omissão do acórdão recorrido. Inexistência. – Doação em vida de todos os bens imóveis aos filhos e cônjuges feita pelo autor da herança e sua esposa. Herdeiro necessário que nasceu posteriormente ao ato de liberalidade. Direito à colação. – Percentual dos bens que deve ser trazido à conferência. – Recurso parcialmente provido.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.298.864 – SP (2011/0291796-0)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECORRENTE : ZORAIDE APARECIDA PISSINATTI DA SILVA E OUTROS ADVOGADOS : LUIZ ANTÔNIO SOARES HENTZ E OUTRO(S)
ANDRÉ SOARES HENTZ E OUTRO(S) RECORRIDO : G J DE M P (MENOR)
REPR. POR : R A DE M
ADVOGADO : VIVIANE BARUSSI CANTERO E OUTRO(S) INTERES. : JOSÉ PISSINATTI – ESPÓLIO
REPR. POR : CECÍLIA MARIA POLETTINI PISSINATTI – INVENTARIANTE
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DAS SUCESSÕES. INVENTÁRIO. 1. OMISSÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INEXISTÊNCIA.2. DOAÇÃO EM VIDA DE TODOS OS BENS IMÓVEIS AOS FILHOS E CÔNJUGES FEITA PELO AUTOR DA HERANÇA E SUA ESPOSA. HERDEIRO NECESSÁRIO QUE NASCEU POSTERIORMENTE AO ATO DE LIBERALIDADE. DIREITO À COLAÇÃO. 3.PERCENTUAL DOS BENS QUE DEVE SER TRAZIDO À CONFERÊNCIA. 4. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Embora rejeitados os embargos de declaração, tem-se que a matéria controvertida foi devidamente enfrentada pelo Colegiado de origem, que sobre ela emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que sucinta, com enfoque suficiente a autorizar o conhecimento do recurso especial, não havendo que se falar, portanto, em ofensa ao art. 535, II, do CPC.
2. Para efeito de cumprimento do dever de colação, é irrelevante o fato de o herdeiro ter nascido antes ou após a doação, de todos os bens imóveis, feita pelo autor da herança e sua esposa aos filhos e respectivos cônjuges. O que deve prevalecer é a ideia de que a doação feita de ascendente para descendente, por si só, não é considerada inválida ou ineficaz pelo ordenamento jurídico, mas impõe ao donatário obrigação protraída no tempo de, à época do óbito do doador, trazer o patrimônio recebido à colação, a fim de igualar as legítimas, caso não seja aquele o único herdeiro necessário (arts. 2.002, parágrafo único, e 2.003 do CC/2002).
3. No caso, todavia, a colação deve ser admitida apenas sobre 25% dos referidos bens, por ter sido esse o percentual doado aos herdeiros necessários, já que a outra metade foi destinada, expressamente, aos seus respectivos cônjuges. Tampouco, há de se cogitar da possível existência de fraude, uma vez que na data da celebração do contrato de doação, o herdeiro preterido, ora recorrido, nem sequer havia sido concebido.
4. Recurso especial parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha. Brasília (DF), 19 de maio de 2015 (data do julgamento).
MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator
RECURSO ESPECIAL Nº 1.298.864 – SP (2011/0291796-0) RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:
Trata-se de recurso especial interposto por Zoraide Aparecida Pissinatti da Silva e outros, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, assim ementado (e-STJ, fl. 416):
AGRAVO DE INSTRUMENTO – INVENTÁRIO – Insurgimento dos filhos donatários contra o pedido de colação de bens do filho nascido após a doação. Descabimento porque necessário igualar as legítimas e a doação se fez com essa finalidade, pouco importando o fato do posterior nascimento. NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO.
No caso em exame, os ora recorrentes, na condição de donatários, interpuseram agravo de instrumento contra a decisão do Juízo da 1ª Vara da Comarca de Porto Ferreira – SP que, nos autos do incidente de colação distribuído por dependência ao inventário de José Pissinatti – cuja abertura foi requerida por G J DE M P (MENOR) -, julgou improcedente a oposição por eles oferecida ao pedido de colação de bens.
O recurso foi improvido pelo Tribunal estadual, ao argumento de que o filho concebido posteriormente à doação tem legitimidade para requerer a colação dos bens anteriormente doados aos filhos havidos no casamento, a fim de igualar as legítimas, bem como de que o incidente de colação deveria recair sobre 50% dos imóveis, porque doados pelo autor da herança e pela mãe dos agravantes.
Houve a oposição de embargos de declaração (e-STJ, fls. 421-423), que foram rejeitados (e-STJ, fls. 425-428).
Nas razões do apelo excepcional, os donatários, ora recorrentes, alegaram violação dos arts. 535, II, do CPC; 112, 2.002 e 2.018 do CC de 2002, correspondentes aos arts. 85, 1.176, 1.776, 1.785 e 1.786 do CC de 1916, além de dissídio jurisprudencial, sustentando, em síntese: a) omissão do acórdão recorrido, no que se refere à porcentagem dos bens doados a ser colacionada; e b) ao tempo das doações que contemplaram todos os herdeiros necessários e seus cônjuges, o recorrido ainda não havia nascido e sequer tinha sido concebido, não havendo que se falar, portanto, em direito à colação; e c) considerando que o autor da herança contemplou com a doação também os cônjuges dos herdeiros necessários, estes só têm a obrigação de colacionar a parte que efetivamente receberam do pai, equivalente a 25% dos bens.
Contra-arrazoado (e-STJ fls. 466/474), o recurso foi admitido (e-STJ, fls. 476/477), vindo os autos a este Tribunal.
Instado, o Ministério Público Federal opinou pelo improvimento do recurso. (e-STJ, fls. 488-497)
O recurso foi distribuído, originariamente, ao Ministro Sidnei Beneti, que proferiu decisão (e-STJ, fls. 499-503), negando seguimento ao recurso especial. Todavia, em juízo de reconsideração, acolheu os embargos de declaração opostos pelos recorrentes, declarou nula a decisão embargada, com a determinação de inclusão do feito em pauta para julgamento colegiado (e-STJ, 526-527).
É o relatório.
Infere-se dos autos que, em 22/12/1987, José Pissinatti doou, juntamente com sua esposa, Cecília Maria Polettini Pissinatti, todos os bens imóveis de que dispunham para seus três filhos e respectivos cônjuges, ora recorrentes, em proporções iguais aos seis donatários, conforme escritura anexada às fls. 46-54 (e-STJ).
Ocorre que, em 22/11/1988 – exatos 11 (onze) meses após a doação – nasceu o ora recorrido, G J DE MP (MENOR), fruto de um relacionamento extraconjugal. José Pissinatti faleceu em 10/8/2003 e, de acordo com seu atestado de óbito, não deixou bens a inventariar (e-STJ, fl. 30).
Passados quase dois anos, no dia 26/4/2005, o ora recorrido requereu a abertura do inventário de seu pai (e-STJ, fls. 24-25) e, no dia 23/5/2005, ingressou com incidente de colação, distribuído por dependência nos autos do inventário, requerendo que todos os bens recebidos em doação pelos ora recorrentes fossem conferidos nos autos.
Após o oferecimento de resposta, a Juíza da 1ª Vara da Comarca de Porto Ferreira – SP julgou improcedente a oposição à colação, o que ensejou a interposição de agravo de instrumento (e-STJ, fls. 2-16), o qual foi improvido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, aos seguintes fundamentos: i) o fato de o agravado ter sido concebido após a doação em vida de todos os bens pelo falecido pai não lhe retira o interesse de agir, nos termos do que dispõe art. 2.002 do CC de 2002 (arts. 1.785 e 1.786 do CC de 1916); e ii) a dispensa da colação apenas se verificaria se expressamente manifestada a intenção do doador na escritura, o que não ocorreu, razão pela qual deve ser colacionada toda a parte doada, isto é, 50% dos bens imóveis, já que a outra metade foi doada pela, respectivamente, mãe e sogra dos recorrentes.
Contra essa decisão colegiada, os agravantes interpuseram recurso especial, com fundamento em ambas as alíneas do permissivo constitucional, alegando violação dos arts. 535, II, do CPC; 112, 2.002 e 2.018 do CC de 2002, correspondentes aos arts. 85, 1.176, 1.776, 1.785 e 1.786 do CC de 1916, além de dissídio jurisprudencial, sustentando, em síntese: a) omissão do acórdão recorrido, no que se refere à porcentagem dos bens doados a ser colacionada; e b) ao tempo das doações que contemplaram todos os herdeiros necessários e seus cônjuges, o recorrido não havia nascido e sequer tinha sido concebido, não havendo que se falar, portanto, em direito à colação; e c) considerando que o autor da herança contemplou com a doação também os cônjuges dos herdeiros necessários, estes só têm a obrigação de colacionar a parte que efetivamente receberam do pai, equivalente a 25% dos bens.
De início, embora rejeitados os embargos de declaração, tem-se que a matéria controvertida atinente ao percentual dos bens que deveria ser trazido à colação foi devidamente enfrentada pelo Colegiado de origem, que sobre ela emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que sucinta, com enfoque suficiente a autorizar o conhecimento do recurso especial, não havendo que se falar, portanto, em ofensa ao art. 535, II, do CPC.
Quanto ao tema de fundo, alegam os donatários que o ora recorrido ainda não havia nascido e sequer tinha sido concebido ao tempo das doações, o que afastaria o seu interesse em formular pedido de colação. Todavia, o argumento foi rechaçado pelo Colegiado estadual, aos seguintes fundamentos (e-STJ, fls. 417-418):
(…).
Retrata o instrumento que o autor da herança e a cônjuge supérstite doaram bens aos filhos, conforme escritura de doação lavrada em 22 de dezembro de 1987 (fls. 41/46). Após o falecimento do doador em agosto de 2003, o agravante pediu a abertura do inventário do pai porque nascido em 22 de novembro de 1988, fruto de relacionamento extraconjugal (fls. 26). Em vista disso, pediu a colação dos bens anteriormente doados, do que discordaram os agravantes.
Neste passo, observa-se que o agravado tem interesse de agir no pedido de colação dos bens anteriormente doados aos filhos havidos no casamento. Isto porque o falecimento do pai ocorreu na vigência do atual Código Civil, que dispõe no artigo 2.002, a exemplo do Código Civil de 1916, artigos 1.785 e 1.786, que a colação tem por objetivo igualar as legítimas dos herdeiros. Neste raciocínio, obrigam-se os descendentes que disputarem a sucessão do ascendente comum de “conferir o valor das doações que dele em vida receberam, sob pena de sonegação.” Em vista disso, importa saber a situação à época do falecimento do “de cujus” e não aquela caracterizada no momento da doação, pois a doação revelou indelével intenção de adiantamento de legítima, cuja transmissão ocorre com a morte.
(…).
Como se viu, a dispensa da colação apenas se verificaria se expressamente manifestada a intenção do doador na escritura, o que efetivamente não ocorreu. Por outro lado, insustentável questionar a esta altura a natureza do negócio jurídico, vale dizer, se houve partilha de bens e não doação, porquanto a escritura de doação foi hialina ao espelhar a vontade do doador em transmitir os bens nesta modalidade e foi formalizada com todos os requisitos da substância do ato notarial.
(…).
De fato, para efeito de cumprimento do dever de colação, é irrelevante se o herdeiro nasceu antes ou após a doação, não havendo também diferença entre os descendentes, se são eles irmãos germanos ou unilaterais ou se supervenientes à eventual separação ou divórcio do doador.
No mesmo sentido, adverte Pontes de Miranda que “não importa o tempo em que foi feita a liberalidade, se doada antes de ter nascido o filho, ou antes do casamento do de cujo com o genitor do herdeiro necessário” (Tratado de Direito Privado, Parte Especial, Direito das Sucessões: Sucessão em Geral. Sucessão legítima. 3. ed. Rio de Janeiro: Editor Borsoi, 1972. t. LV. p. 318 ).
O que deve prevalecer é a ideia de que a doação feita de ascendente para descendente, por si só, não é considerada inválida ou ineficaz pelo ordenamento jurídico, mas impõe ao donatário obrigação protraída no tempo, de à época do óbito do doador, trazer o patrimônio recebido à colação, a fim de igualar as legítimas, caso não seja aquele o único herdeiro necessário (arts. 2.002, parágrafo único, e 2.003 do CC/2002).
No presente caso, o ato do falecido de doar, juntamente com sua esposa, todos os bens aos filhos, em detrimento do filho caçula fruto de outro relacionamento, ainda que este tenha sido concebido posteriormente, torna inoficiosa a doação no tocante ao que excede a parte disponível do patrimônio mais as respectivas frações da legítima, porque caracterizado o indevido avanço da liberalidade sobre a legítima do herdeiro preterido.
A matéria já foi enfrentada neste Tribunal, que firmou entendimento assente com a conclusão do aresto recorrido, conforme se infere dos precedentes abaixo:
Recurso especial. Sucessões. Inventário. Partilha em vida. Negócio formal. Doação. Adiantamento de legítima. Dever de colação. Irrelevância da condição dos herdeiros. Dispensa. Expressa manifestação do doador.
– Todo ato de liberalidade, inclusive doação, feito a descendente e/ou herdeiro necessário nada mais é que adiantamento de legítima, impondo, portanto, o dever de trazer à colação, sendo irrelevante a condição dos demais herdeiros: se supervenientes ao ato de liberalidade, se irmãos germanos ou unilaterais. É necessária a expressa aceitação de todos os herdeiros e a consideração de quinhão de herdeira necessária, de modo que a inexistência da formalidade que o negócio jurídico exige não o caracteriza como partilha em vida.
– A dispensa do dever de colação só se opera por expressa e formal manifestação do doador, determinando que a doação ou ato de liberalidade recaia sobre a parcela disponível de seu patrimônio.
Recurso especial não conhecido. (REsp 730.483/MG, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ de 20/6/2005);
RECURSO ESPECIAL. INVENTÁRIO. DOAÇÃO. COLAÇÃO. PROVIMENTO. DEVEM OS HERDEIROS DONATÁRIOS TRAZER A COLAÇÃO OS BENS RECEBIDOS EM DOAÇÃO A FIM DE SER MANTIDA A IGUALDADE DAS LEGITIMAS. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (REsp 9.081/SP, Relator o Ministro Claudio Santos, Terceira Turma, DJ de 20/4/1992).
Importante destacar que o dever de colacionar os bens recebidos a título de liberalidade só se dispensa por expressa manifestação do doador, determinando que a doação seja extraída da parte disponível de seus bens, o que também não ocorreu na hipótese presente, conforme noticiado no aresto hostilizado. Sobre o tema: Ag n. 1.394.828/SP, Relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, DJ de10/5/2012; AgRg no Ag n. 484.969/SP, Relator o Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ/RS), Terceira Turma, DJ de 7/10/2009; Ag n. 1.085.789/GO, Relator o Ministro Sidnei Beneti, DJ de 16/3/2009.
Por fim, sustentam os donatários, ora recorrentes, que tendo o autor da herança contemplado com a doação também os seus respectivos cônjuges, a obrigação de colacionar só pode atingir a parte que individualmente receberam do pai, equivalente a 25% dos bens e não 50%, conforme decidiu o Tribunal de origem.
No ponto, assiste-lhes razão.
Da leitura da escritura pública de doação firmada pelo casal Pissinatti (e-STJ, fl. 46), infere-se que foram indicados como outorgados/donatários a Sra. Zoraide Aparecida Pissinatti da Silva e seu marido, Jaime da Silva, o Sr. Walter Pissinatti e sua esposa, Ana Maria Prezotto Pissinatti, e a Sra. Ivete Maria Pissinatti Borges e seu marido, Carlos Antonio da Silva Borges, sendo que, dentre eles, apenas o casal Ivete e Carlos são casados sob o regime da comunhão parcial de bens, os demais pelo regime da comunhão universal.
Segundo disposição do CC/1916, vigente à época da celebração da referida escritura pública, no casamento sob o regime da comunhão parcial, não se comunicavam os bens que sobreviessem na constância do matrimônio por doação (art. 269, I, tendo por dispositivo correspondente o art. 1.659, I, do CC/2002), já no regime da comunhão universal, os bens doados só não beneficiavam o cônjuge, se a doação fosse efetivada com cláusula de incomunicabilidade (art. 263, II, tendo por dispositivo correspondente o art. 1.668, I, do CC/2002).
Vê-se, assim, que nas relações matrimoniais regidas pelo regime de comunhão parcial de bens, há um claro descolamento entre a aquisição de patrimônio e uma perceptível congruência de esforços do casal, pois não se verifica a contribuição do não-donatário na incorporação do patrimônio. Nessas hipótese, portanto, o aumento patrimonial de um dos consortes prescinde da participação direta ou indireta do outro, sendo fruto da liberalidade de terceiros, razão pela qual, a doação realizada a um dos cônjuges somente será comunicável quando o doador expressamente se manifestar a respeito, e, no silêncio, presumir-se-á feitas apenas ao donatário.
Dessarte, a regra geral do Código no regime da comunhão parcial, seja no código de 1916, seja no atual, é de que a doação realizada a apenas um dos cônjuges não beneficia o outro, e, contrario sensu , haverá comunicação quanto ao bem objeto da doação toda vez que o doador expressamente se manifestar nesse sentido.
No caso em tela, há que se considerar a peculiaridade de que a doação foi realizada pelo Sr. José Pissinatti e pela Srª. Cecília Maria Polettini Pissinatti, expressamente, em favor dos filhos e de seus respectivos cônjuges, impondo-se concluir que cada filho/donatário passou a ser proprietário individualmente da cota parte correspondente a 25% dos imóveis, já que os outros 25% do total de sua parte disponível, o autor da herança doou aos cônjuges de seus filhos.
Como é cediço, por meio do contrato de doação, alguém (doador) se obriga a transferir bens ou vantagens do seu patrimônio para o de outrem (donatário), movido pelo espírito de liberalidade. E não é qualquer benefício que enseja a doação, apenas o que diminui o patrimônio de bens do benfeitor e aumenta o do beneficiário.
Conforme observa Paulo Nader, “o elemento objetivo consiste no objeto da liberalidade e sem o qual não se tem doação. A transferência entre os patrimônios opera-se com bens ou vantagens que apresentem valor econômico. Para que determinado benefício de natureza econômica configure objeto do contrato é necessário que parte do patrimônio do benfeitor se transfira para o do beneficiário. Ou seja, ocorre a diminuição no acervo de bens do doador e o consequente acréscimo no do donatário” (Curso de Direito Civil: Contratos. Forense, 2008. v. III. p. 226).
Assim, nem toda liberalidade configura ato de doação, mas apenas a que implica a diminuição no acervo patrimonial do benfeitor e o consequente acréscimo no do beneficiado.
Nessa linha de entendimento, não há dúvida de que, na hipótese, a doação pura e simples realizada por escritura pública beneficiou, individualmente, não apenas cada um dos herdeiros necessários, mas também os seus respectivos cônjuges, razão pela qual a colação deve ser admitida apenas sobre 25% dos bens, assim como sustentam os donatários, ora recorrentes, porque esse foi o percentual que coube conjuntamente aos três irmãos, já que a outra metade foi destinada aos seus esposos e esposa, que poderão, inclusive, exigir sua cota da liberalidade em caso de eventual separação.
Nem há que se cogitar, tampouco, da possível existência de fraude, uma vez que na data da celebração do contrato de doação (22/12/1987), o herdeiro preterido, ora recorrido, nem sequer havia sido concebido, o que só ocorreu em 22/11/1988.
Forte em tais fundamentos, dou parcial provimento ao recurso especial, determinando que a obrigação de colacionar recaia apenas sobre a parte que os ora recorrentes – Zoraide Aparecida Pissinatti da Silva, Walter Pissinatti e Ivete Maria Pissinatti Borges – efetivamente receberam do pai, equivalente a 25% dos bens imóveis.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2011/0291796-0 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.298.864 / SP
Números Origem: 02866323620098260000 2866323620098260000 4972005 6751324 6751324500 994092866327
PAUTA: 19/05/2015 JULGADO: 19/05/2015
Relator
Exmo. Sr. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO DE PAULA CARDOSO
Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : ZORAIDE APARECIDA PISSINATTI DA SILVA E OUTROS ADVOGADOS : LUIZ ANTÔNIO SOARES HENTZ E OUTRO(S)
ANDRÉ SOARES HENTZ E OUTRO(S) RECORRIDO : G J DE M P (MENOR)
REPR. POR : R A DE M
ADVOGADO : VIVIANE BARUSSI CANTERO E OUTRO(S) INTERES. : JOSÉ PISSINATTI – ESPÓLIO
REPR. POR : CECÍLIA MARIA POLETTINI PISSINATTI – INVENTARIANTE ASSUNTO: DIREITO CIVIL – Sucessões – Inventário e Partilha
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas
Cueva (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.
Fonte: DJE/SP
Extraído de Recivil