Vantagens e desvantagens dos novos rumos da terceirização no Brasil
Vantagens e desvantagens dos novos rumos da terceirização no Brasil
Há tempos não presenciávamos um embate tão acalorado sobre tema de ordem legal: os novos rumos da terceirização do trabalho propostos pelo Projeto de Lei 4330, apresentado em 26 outubro de 2004 pelo Deputado Sandro Mabel (PL-GO), o qual foi aprovado sob o relatório do Deputado Arthur Oliveira Maia (PMDB-BA), em 08 de abril de 2015 em Sessão Extraordinária da Câmara dos Deputados após intensos debates, ainda pendendo a apreciação e votação de emendas.
Desde a apresentação de referido Projeto de Lei observou-se a dicotomia da sociedade brasileira; de um lado a iniciativa privada – a qual compreende que o atual ordenamento jurídico lhe é por demais contundente ao imputar obrigações de distintas ordens e que chegam até mesmo a obstacularizar o desenvolvimento de suas atividades – e de outro lado os trabalhadores, seus organismos de classe e boa parte dos juslaboralistas, cuja compreensão segue no sentido de que a terceirização, tal como aprovada, se consubstancia em verdadeiro atentado à organização do trabalho.
Para que se possa compreender a relevância do tema em tela, é importante traçar – mesmo que em breve notícia – um paralelo entre o fenômeno da terceirização antes e depois do modelo proposto.
Antes do Projeto de Lei 4330/04 inexistia regramento jurídico sobre a terceirização, cabendo à Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho estabelecer a impossibilidade de terceirização das atividades-fim (aquelas principais ou essenciais às empresas) e a permissão apenas em relação às atividades-meio (aquelas secundárias ou não essenciais às empresas).
Em suma, era permitida a a terceirização em apenas quatro hipóteses: contratação de trabalhadores por empresa de trabalho temporário, contração de serviços de vigilância, de serviços de conservação e limpeza, e de atividades-meio, desde que inexistente a subordinação direta.
O modelo aprovado é considerado por muitos – sobretudo os empresários – como o marco regulatório da terceirização no Brasil e acaba por autorizar a terceirização de atividades-fim (aquelas principais ou essenciais às empresas) ao avesso do entendimento até então prevalecente.
Além, o texto aprovado prevê outros aspectos relevantes:
i) apenas as empresas especializadas poderão prestar serviço terceirizado;
ii) familiares de empresas contratantes não poderão criar empresa para oferecer serviço terceirizado;
iii) as empresas tomadoras dos serviços deverão recolher o que for devido pela empresa terceirizada contratada em impostos e contribuições, a exemplo do PIS/Cofins, CSLL e FGTS;
iv) a responsabilidade das empresas tomadoras de serviços passa a ser subsidiária, razão pela qual os trabalhadores terceirizados somente poderão executar sentenças judiciais após esgotados os bens das empresas que terceirizam;
v) as empresas contratadas devem destinar 4% (quatro por cento) do valor do contrato para um seguro, o qual irá abastecer um fundo para pagamento de indenizações trabalhistas;
vi) a possibilidade de terceirização no serviço público;
vii) a previsão de que os empregados terceirizados sejam regidos pelas convenções ou acordos trabalhistas estabelecidos entre a contratada e o sindicato dos terceirizados sendo que as negociações da contratante com seus empregados não se aplicariam aos terceirizados.
Dentre estes aspectos, destacamos o fato de que as tomadoras de serviços somente responderão pelos créditos trabalhistas oriundos de condenações judiciais após esgotado o patrimônio da empregadora, não mais havendo a responsabilização solidária – segundo a qual inexiste preferência ou ordem.
Além, a permissão de terceirização de serviços públicos lança ao chão a proibição preconizada pela já referida Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, o que certamente impactará sobremaneira no mercado de trabalho.
Por fim, destacamos ter sido – e ainda será! – objeto de muita e acolorada discussão o fato de que os empregados terceirizados se submetam às normas coletivas dos instrumentos firmados entre a contratada e o sindicato que os representa, não se aplicando os diplomas coletivos que regem a relação entre as tomadoras de serviços e os seus empregados.
Sem embargos de compreensões contrárias, a aprovação do Projeto de Lei 4330/04 traz consigo vantagens e desvantagens, tanto sob o olhar dos empregadores como dos empregados, sendo forçoso reconhecer que aqueles de beneficiam em maior razão.
Para os empregados é vantajoso que caiba à tomadora de serviços o recolhimento de tributos e contribuições o que – ao menos em tese – lhes assegura o adimplemento de direitos; também lhes é benéfico que as empresas fornecedoras de mão de obra terceirizada tenham de destinar 4% (quatro por cento) do valor do contrato em favor de um fundo cujo fito seja o de responder pelas indenizações trabalhistas.
Para os tomadores de serviços terceirizados, há – indubitavelmente – um rol maior de vantagens. Aos empregadores é consideravelmente vantajosa a possibilidade de terceirizar todas as atividades da empresa, sejam atividades-fim ou atividades-meio; é sobremaneira favorável passe a responsabilidade ser subsidiária e não mais solidária e, enfim, acaba também por lhes beneficiar até mesmo o fato de não se aplicar aos terceirizados a Convenção ou o Acordo Coletivo diversos daqueles que tutelam os seus empregados.
Rogando vênia para fugir à isenção – e em que pese percebermos a terceirização como um fenômeno importante e do qual não podemos nos afastar e de partilharmos do entendimento de que a legislação trabalhista atual é demasiadamente onerosa aos empregadores – compreendemos com reserva a aprovação do Projeto de Lei 4330/04, pois acreditamos estarmos diante de gravíssima lesão social de direitos sociais, trabalhistas e previdenciários e já vislumbramos o rebaixamento da remuneração contratual dos trabalhadores – condição que impactará negativamente no mercado de trabalho e de consumo. Cumpre-nos, de mesmo modo, considerar o receio de que a diminuição substantiva da arrecadação tributária e previdenciária acabe por deflagrar problemas de fiscais ao Estado.
O novo regramento sobre a terceirização é vantajoso? Depende se o considerarmos sobre o prisma patronal ou sobre o prisma obreiro. A única certeza que conservamos é a de que não a curto – penso que a médio – prazo a sociedade sentirá os efeitos negativos dos novos rumos dados à terceirização em nosso país e quiçá estejamos diante do maior ato de precarização das relações trabalhistas e de um cabal atentado à organização do trabalho – espero estar equivocado!
Texto confeccioando por: Fernando Borges Vieira
Extraído de Jurisite
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Câmara vota projeto que regulamenta terceirização; entenda
Criticado por centrais sindicais, mas apoiado por grande parte do empresariado nacional, o projeto de lei que regulamenta a terceirização dos contratos de trabalho deve ser votado na tarde desta terça-feira pela Câmara dos Deputados cercado de pontos polêmicos.
O principal deles é a permissão de que empresas terceirizem não só atividades-meio (funções de apoio ao negócio central da empresa, como limpeza e vigilância), mas também as atividades-fim (por exemplo, a fabricação de carros, no caso de uma montadora).
Para os críticos, o projeto de lei é prejudicial aos trabalhadores pois coloca em risco a conquista dos direitos trabalhistas e pode levar a uma substituição em larga escala da mão de obra contratada diretamente pela terceirizada.
Já os defensores da proposta acreditam que ela acaba com a insegurança jurídica, aumenta a produtividade e gera mais empregos.
Até agora, por causa da ausência de parâmetros definidos para a terceirização, o tema vem sendo regulado pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho), por meio da chamada Súmula 331, que proíbe a contratação de trabalhadores por meio de empresas interpostas, exceto os trabalhadores temporários (como aqueles que trabalham em época de Natal e Páscoa). De acordo com o dispositivo, a terceirização somente é legal quando se refere à atividade-meio da empresa, e não à atividade-fim.
No ano passado, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu entrar na polêmica, ao declarar o tema de repercussão geral, em meio à multiplicação de ações civis públicas ajuizadas pelo MPT (Ministério Público do Trabalho) envolvendo indenizações milionárias. O julgamento não ocorreu e está previsto para acontecer em 2015.
Centrais, sindicatos e movimentos sociais prometem realizar manifestações em todo o Brasil nesta terça-feira para barrar a votação do projeto de lei. "Vamos fazer uma campanha massiva contra todos os deputados que votarem a favor dessa proposta", afirmou à BBC Brasil Graça Costa, secretária das Relações de Trabalho da CUT (Central Única dos Trabalhadores).
A BBC Brasil listou três pontos polêmicos do projeto de lei e ouviu opiniões – contra e a favor – sobre ele.
1. Terceirização de toda e qualquer atividade
A possibilidade de que as empresas passem a terceirizar não só a atividade-meio (aquelas que não são inerentes ao objetivo principal da empresa, ou seja, serviços necessários, mas não essenciais), mas também a atividade-fim (aquela que caracteriza o objetivo principal da empresa) é um dos itens mais controversos do projeto de lei que regulamenta a prestação de serviços por terceiros.
No caso de um banco, por exemplo, a mudança permitiria que bancários – de operadores de caixa a gerentes, ou seja, aqueles que desempenham atividade-fim nessas instituições - passem a ser terceirizados. Atualmente, nessas empresas, apenas trabalhadores como seguranças ou faxineiros podem ter esse tipo de contrato, pois exercem atividade-meio, já que a atividade principal de um banco não é fazer segurança tampouco faxina.
Os críticos dizem, no entanto, que a flexibilização dos contratos "precariza as relações de trabalho". Eles também argumentam que, ao serem empregados como terceirizados, os trabalhadores perdem os benefícios conquistados pela categoria, como, por exemplo, piso salarial maior, plano de saúde, vale-alimentação, participação nos lucros, entre outros.
"Esse projeto de lei precariza as condições de trabalho no país. Dizem que mais empregos serão gerados, mas com que padrão? Padrão chinês?", critica o juiz Germano Silveira, vice-presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), em referência às más condições de trabalho em fábricas na China.
"Os terceirizados ganham salários mais baixos, até metade do que ganha um contratado direto, e sofrem acidentes de trabalho com mais frequência, pois as empresas que prestam o serviço terceirizado economizam nos itens de segurança para cortar custos", acrescenta. "Os deputados (a favor do projeto de lei) querem transformar essa diferença de salário em lucro para os empresários".
Graça Costa, secretária das Relações de Trabalho da CUT (Central Única dos Trabalhadores) concorda. Segundo ela, o projeto, se aprovado, vai provocar uma substituição em massa de trabalhadores contratados por terceirizados.
"Há hoje no Brasil quase 13 milhões de trabalhadores terceirizados, contra 35 milhões de trabalhadores contratados. Essa situação vai se inverter com a aprovação desse projeto de lei. O objetivo das empresas é unicamente reduzir custos. A relação de trabalho, que hoje é bilateral, ou seja, entre trabalhador e empregador, vai deixar de sê-lo, abrindo espaço para subcontratações a torto e direito. Será quebrada a coluna vertebral do direito do trabalho no Brasil", avalia.
Segundo Costa, estimativas apontam que, além de terem salários menores, os terceirizados trabalham mais e correm mais riscos de sofrer acidentes, inclusive fatais. Ela acrescenta ainda que, dos dez maiores grupos de trabalhadores em condições análogas à escravidão resgatados entre 2010 e 2014, 90% eram de mão de obra terceirizada.
2. Responsabilidade das empresas contratantes sobre obrigações trabalhistas
Pela atual versão do PL 4.330/2004, a empresa contratante (tomadora de serviços) deve fiscalizar se a empresa terceirizadora (fornecedora de serviços) está fazendo os pagamentos trabalhistas e previdenciários e garantindo os benefícios legais, como férias remuneradas. Apenas se não comprovar ter feito a fiscalização, ela poderá ser punida no caso de haver alguma irregularidade. O projeto de lei determina que a empresa contratada comprove por meio de documentação mensal que está cumprindo com suas obrigações.
As centrais sindicais, no entanto, defendem que a responsabilidade do tomador de serviço não seja "subsidiária", mas "solidária". No linguajar jurídico, a chamada "responsabilidade subsidiária" significa que a empresa contratante (tomadora de serviços) somente pagará se o devedor principal deixar de pagar. Isso leva o trabalhador a demorar mais tempo para receber seu dinheiro, no caso de uma demissão sem justa causa, por exemplo – porque ele precisa esgotar primeiro todas as possibilidades para receber do devedor solidário, ou seja, da empresa contratada.
Como muitas vezes essas terceirizadoras têm capital social muito baixo, com poucos bens no nome da empresa ou dos sócios, o trabalhador acaba enfrentando um longo périplo na Justiça para reaver seus direitos, dizem os representantes dos sindicatos.
"Essa foi uma solução intermediária (para o impasse), mas é apenas uma fiscalização formal", critica Silveira. Para Costa, da CUT, a proposta prejudica o trabalhador porque tira do Estado o poder de fiscalização".
"Se a empresa terceirizada não cumprir com os direitos dos trabalhadores e a empresa contratante provar que se responsabilizou, o prejudicado será o trabalhador. Não faz sentido deixar na mão do empresário, que tem interesses financeiros nesse sistema, a tarefa de fiscalização, que deveria caber ao Estado", argumenta.
Costa lembra que o escândalo de desvio de verbas na Petrobras criou, recentemente, um impasse sobre obrigações trabalhistas. "Mais de 20 mil trabalhadores terceirizados foram demitidos recentemente de empresas que prestavam serviços à Petrobras e não sabem a quem recorrer".
3. Garantias dos direitos trabalhistas aos terceirizados
A garantia dos direitos trabalhistas aos terceirizados, especialmente como deve ficar a representação sindical, é outro ponto de atrito entre críticos e apoiadores do projeto de lei que regulamenta a terceirização da mão de obra.
O texto não assegura a filiação dos terceirizados no sindicato de atividade preponderante da empresa, o que, segundo as lideranças sindicais, fragiliza a organização dos trabalhadores terceirizados.
De acordo com os sindicatos, é comum que terceirizados que trabalhem em um mesmo local tenham diferentes patrões e sejam representados por setores distintos. Negociações com o patronato acabam, assim, prejudicadas, apontam.
"Flexibilizar as relações trabalhistas é um erro, sobretudo no momento de crise. Precisamos de um mercado de trabalho forte, uma massa de trabalhadores com bons salários e com boas condições para que eles possam ser consumidores. O governo vai deixar de arrecadar", conclui Costa.
Outro lado
Na visão dos que apoiam o projeto de lei, a regulamentação dos contratos de prestação de serviços de terceiros beneficia os trabalhadores.
Segundo o deputado Arthur Maia (SD-BA), autor do substitutivo da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania para o PL 4.330/04, havia uma "discriminação contra o trabalhador terceirizado".
"Não temos uma legislação que discipline a matéria. Nosso objetivo é regulamentar as relações de trabalho nesse campo criando uma série de exigências para que uma empresa possa funcionar como terceirizada. Isso beneficia o trabalhador pois lhe dá a segurança que hoje ele não tem", diz Maia.
O deputado argumenta que os sindicatos são contra a proposta por temer uma "redução da arrecadação".
"Quando acontecer a legalização, haverá um fracionamento maior da contribuição sindical entre mais sindicatos. A crítica é legítima. Temos de reconhecer, porém, que não é justo que haja um prejuízo do trabalhador face à arrecadação sindical".
Em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, Paulo Skaf, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), afirmou que "com a regulamentação do trabalho terceirizado, o Brasil irá se alinhar às mais modernas práticas trabalhistas do mundo".
"Depois de muitos anos de debate, a terceirização poderá, enfim, ser regulamentada no Brasil. Isso acabará com a insegurança jurídica, aumentará a competitividade e certamente vai gerar mais empregos".
Para a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), a regulamentação da terceirização é "condição imprescindível para que as empresas possam colocar seus produtos no mercado a preço competitivo e, com isso, ajudar o Brasil a sair desta crise inédita e de tamanho imprevisível".
*Colaborou Mariana Schreiber, da BBC Brasil em Brasília
Extraído de Jurisite