Diferenças entre o Código de Processo Penal e a Lei de Tóxicos

Diferenças entre o Código de Processo Penal e a Lei de Tóxicos

Li Diane Alves Ramos da Silva, Procurador Federal  Publicado por Li Diane Alves Ramos da Silva há 12 horas

A prática penal nem sempre é tão simples como parece, sendo que uma das grandes questões está nas diferenças entre os ritos do Código de Processo Penal e da Lei de Toxico.

Previsto no Código de Processo Penal, e aquele contido na Lei n.º 11.343/06, mais conhecida como Lei de Tóxicos, pois percebo que muitos daqueles que atuam na área criminal ainda confundem os referidos ritos.

A primeira coisa a ser feita é analisar brevemente os ritos processuais, para, então, conseguir verificar as principais diferenças entre eles:

-A prisão em Flagrante

-Sob a ótica do CPP

Conforme esta estabelecido no Código de Processo Penala prisão em flagrante deverá ser comunicada: ao juiz competente; ao Ministério Público; e a algum familiar do preso ou outra pessoa indicada por ele (art. 306).

A autoridade policial deverá comunicar a prisão em flagrante ao juiz competente, em no máximo 24h (vinte e quatro horas), bem como, no caso do preso não indicar algum advogado particular, à Defensoria Pública (§ 1º, art. 306).

Já o magistrado, ao receber a comunicação da prisão, deverá decidir entre 03 (três) situações (art. 310 do CPP):

I – relaxar a prisão (caso o flagrante seja ilegal);

II – converter a prisão em flagrante em prisão preventiva (desde que presentes os requisitos do artigo 312 do CPP e as medidas cautelares diversas da prisão se revelarem inadequadas ou insuficientes); ou

III – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança (hipótese em que a prisão em flagrante é legal, mas não estão presentes os requisitos do artigo 312 do CPP).

-A prisão em Flagrante

-Sob a ótica da Lei de Tóxicos

Pela Lei 11.343/06 (Lei de Tóxicos), a Autoridade Policial deverá comunicar imediatamente a prisão em flagrante ao juiz competente, tem-se entendido que a remessa do auto de prisão em flagrante deve ser feita assim que concluída a sua lavratura, admitindo-se um lapso de até 24 (vinte e quatro) horas, contado da efetivação da prisão.

O magistrado, por sua vez, ao receber o auto de prisão em flagrante, deverá abrir vista ao Ministério Público, em até 24h, o qual deverá se manifestar e fazer o controle da legalidade do ato, podendo, então, requerer a conversão do flagrante em preventiva ou o relaxamento da prisão.

O prazo do MPE para essa manifestação também é de 24h, assim como o prazo concedido ao juiz para decidir acerca da situação do preso (ART. 50).

Observando o posicionamento de que a inobservância do prazo de 24h para abertura de vista ao Ministério Público estabelecido no art. 50 da Lei11.343/06, não implica a nulidade da prisão em flagrante:

PENAL, PROCESSO PENAL E CONSTITUCIONAL – HABEAS CORPUS – PRISÃO EM FLAGRANTE – TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE – VISTAS AO ÓRGÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM 24H – ART. 50 DA LEI 11.343/06 – NULIDADE DO FLAGRANTE – NÃO OCORRÊNCIA – HABEAS CORPUS NÃO CONCEDIDO. 1) A não observância do prazo de 24h na comunicação da prisão em flagrante ao Ministério Público, conquanto possa configurar irregularidade administrativa ou mesmo, em tese, o crime de abuso de autoridade, não pode, por si só, excluir a legalidade da prisão em flagrante, pois se trata de ato extrínseco à segregação, não caracterizando constrangimento ilegal a ser corrigido pela via do habeas corpus;

Posteriormente à manifestação do MP, o magistrado decidirá conforme estabelecido no artigo 310 do CPP.

O inquérito policial deve ser concluído no prazo de 10 dias, se o autuado estiver preso, e de 30 dias, quando estiver solto. (artigo 10)

No rito de tóxico, o inquérito policial deverá ser concluído em 30 (trinta) dias, se preso, e em 90 (noventa), se solto. (artigo 51)

Segundo o CPP, o Ministério Público tem 05 dias para oferecer denúncia quando o réu estiver preso, e 15 dias, se estiver solto (artigo 46 CPP). Oferecida a denúncia, o juiz deverá decidir pelo recebimento da peça inicial, determinando, caso a receba, a citação do acusado para oferecer resposta à acusação, por escrito, no prazo de 10 dias. (artigo 395 – hipóteses de rejeição de denúncia; artigo 396)

Com a resposta à acusação, o juiz analisará se existem hipóteses de absolvição sumária do réu (artigo 397), sendo que, caso contrário, designará a data da audiência de instrução, debates e julgamento (artigo 399).

Durante a instrução processual, primeiramente será ouvido o ofendido (vítima), as testemunhas arroladas, iniciando com as da acusação e depois as da defesa, encerrando com o interrogatório do réu. (artigo 400)

Podem ser ouvidas até 08 testemunhas de acusação e 08 de defesa. (artigo 401)

Assim, o acusado será interrogado ao final da instrução, somente após ter sido colhido o depoimento de todas as testemunhas.

Encerrada a instrução, não havendo diligências a serem cumpridas (artigo 402), a regra será a apresentação dos debates finais orais, por 20 minutos, prorrogável por mais 10 minutos, sendo proferida a sentença logo após (artigo 403).

Diante da complexidade do caso ou do número de acusados, o magistrado poderá abrir vista dos autos às partes para apresentação de alegações finais, escritas, pelo prazo de 05 dias. Neste caso, o juiz terá 10 dias para proferir a sentença. (artigo 403, § 3º).

De acordo com o rito específico, o Ministério Público tem 10 dias para oferecer a denúncia (artigo 54).

Oferecida a denúncia, no rito de tóxico, o juiz deve ordenar a notificação do acusado para que ofereça defesa prévia, em 10 dias, por escrito (artigo 55).

Importante destacar que o MPE e a Defesa podem arrolar até 05 testemunhas (artigos 54 e 55).

Somente após a notificação do réu e a apresentação da defesa prévia é que o magistrado decidirá acerca do recebimento da denúncia e, caso a receba, designará a audiência (artigo 56).

Durante a instrução processual, contrariamente ao que ocorre no rito comum, o acusado será interrogado primeiro, antes da oitiva das testemunhas arroladas pelas partes (artigo 57).

Deve ser ressaltado que muitos sustentam que essa inversão do rito, ouvindo primeiro o réu para depois ouvir as testemunhas, é inconstitucional e deve anular o ato, pois fere princípios como o da ampla defesa e do contraditório, visto que o acusado, ao ser interrogado, não sabe das provas que serão produzidas contra si durante a instrução processual, dificultando até mesmo a escolha da tese de defesa ideal.

Todavia, a maior parcela dos Tribunais tem entendido que tal modificação não pode ensejar a nulidade do ato, pois a Lei Especial (a 11.343/06) deve prevalecer sobre a Lei Geral (CPP):

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRELIMINAR DE NULIDADE. INOCORRÊNCIA. INVERSÃO NA ORDEM DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS. PREVALÊNCIA DA LEI ESPECIAL SOBRE A LEI GERAL. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. PRELIMINAR REJEITADA.. – Nos delitos previstos na Lei de Tóxicos, não acarreta nulidade processual a inversão na ordem do interrogatório do acusado, com o indeferimento de aplicação do rito previsto no art. 400 do CPP, modificado pela Lei nº 11.719/2008. A questão deve ser resolvida observando-se o conflito de normas, onde a lei especial deve prevalecer sobre a geral, de forma que, segundo as regras previstas na Lei nº 11.343/06, especial em relação ao Código de Processo Penal, o interrogatório do réu deve ocorrer antes da oitiva das testemunhas. Portanto, a modificação introduzida pela Lei 11.719/08, referente à ordem de inquirição das testemunhas e réus em audiência, em nada alterou o rito especial da Lei de Tóxicos. (TJ-MG – APR: 10024120529094001 MG, Câmaras Criminais Isoladas / 4ª CÂMARA CRIMINAL

Pontue-se que acredito que o objetivo da Lei de Tóxicos seguir o procedimento adotado à época pelo Código de Processo Penal (no qual uma das primeiras providências adotadas no processo era interrogar o réu), porém, com uma visão reformulada, mais moderna.

Ocorre que, com o advento da Lei 11.719/2008, o Código de Processo Penal passou por mudanças, surgindo, então, o rito em que o réu encerra a fase de oitivas, enquanto que a Lei de Tóxicos manteve o seu procedimento, tornado-se, dessa forma, diferente ao rito ordinário, mas que, por ser lei especial deve prevalecer sobre a geral.

A primeira diferença significativa observada é relativa ao fato de que, no rito de tóxicos, o magistrado, antes de decidir acerca da prisão em flagrante do autuado (seja para converter ou conceder liberdade), deve abrir vista ao Ministério Público, o qual deverá se manifestar quanto a prisão.

Verificam-se outras diferenças importantes, tais como:

a) O prazo para conclusão do inquérito Policial (10 ou 30 dias X 30 ou 90 dias);

b) O prazo para o MP oferecer denúncia (05 ou 15 dias X 10 dias);

c) A quantidade de testemunhas (08 X 05);

d) O momento da decisão que recebe/rejeita a denúncia (antes de determinar a citação X após a notificação e a apresentação de defesa prévia);

e) A forma como o acusado toma ciência da ação penal (citação notificação);

f) O nome da petição defensiva ( acusação X defesa prévia)

Diferenas entre do Cdigo de Processo Penal e da Lei de Txicos

G) A ordem da oitiva das testemunhas e o interrogatório (testemunhas e interrogatório X interrogatório e testemunhas).

 

Li Diane Alves Ramos da Silva
Federal Prosecutor

Origem da Imagem/Fonte: JusBrasil

 

Notícias

TRF-1 suspende leilão de imóvel por falha no procedimento de intimação

TEM QUE AVISAR TRF-1 suspende leilão de imóvel por falha no procedimento de intimação 18 de novembro de 2024, 12h31 O magistrado ainda apontou que não havia nenhum documento que demonstrasse que o credor tentou promover a intimação pessoal do recorrente por meio dos Correios, com aviso de...

Entenda PEC que quer o fim da escala de trabalho de 6x1

Trabalho Entenda PEC que quer o fim da escala de trabalho de 6x1 Texto foi proposto pela deputada Erika Hilton e depende do apoio de 171 parlamentares para ser analisada no Congresso. Da Redação segunda-feira, 11 de novembro de 2024 Atualizado às 12:07 Uma PEC - proposta de emenda à constituição...

Artigo - ITCMD e doações com elementos no exterior: tema superado?

Artigo - ITCMD e doações com elementos no exterior: tema superado? A incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) em heranças e doações que envolvam doadores e bens de propriedade de de cujus no exterior tem sido objeto de intensos debates no Brasil. Em 2021, em sede do...

Penhora de bem alienado fiduciariamente por dívidas propter rem

Penhora de bem alienado fiduciariamente por dívidas propter rem Flávia Vidigal e Priscylla Castelar de Novaes de Chiara O STJ mudou seu entendimento sobre a penhorabilidade de imóveis alienados fiduciariamente em execuções de despesas condominiais, reconhecendo a possibilidade de penhorar o bem,...

Ministro do STJ exclui área ambiental do cálculo de pequena propriedade rural

Impenhorabilidade Ministro do STJ exclui área ambiental do cálculo de pequena propriedade rural STJ decidiu que, para impenhorabilidade, apenas a área produtiva de pequenas propriedades rurais deve ser considerada, excluindo-se a área de preservação ambiental. Decisão baseou-se em assegurar que...