Dificuldade de locomoção nas cidades provoca isolamento dos idosos - Bloco 5

29/06/2013 00:01

Dificuldade de locomoção nas cidades provoca isolamento dos idosos - Bloco 5

A dificuldade de locomoção nas cidades brasileiras contribui para o isolamento cada vez maior dos idosos. No papel, o Brasil tem uma das mais avançadas leis de mobilidade social. Na prática, a legislação só vale para os novos projetos de urbanização. No capítulo de hoje, o último da série especial, o tema é o direito de ir e vir dos idosos.

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Constatar a dificuldade para se locomover nas cidades brasileiras nem requer muita observação. Buracos, falta de calçadas, sinalização deficiente, sistemas de transporte público nada amigáveis. Agora imagine esse cenário para quem já passou dos 60 e não tem mais tanta agilidade. O envelhecimento acelerado da população requer medidas urgentes para tornar as cidades mais transitáveis. Hoje os idosos já representam 12% da população e serão 30% em menos de 40 anos.

 

No que se refere a leis, o País é bastante avançado. No ano passado, entrou em vigor a Lei da Mobilidade Urbana, com diretrizes para o transporte em todos os municípios brasileiros. E, desde 2000, está em vigor a Lei da Acessibilidade, que traz regras para garantir a autonomia de cidadãos com mobilidade reduzida.

Como explica a diretora de Regulação e Gestão da Secretaria Nacional de Transportes e da Mobilidade Urbana, do Ministério das Cidades, Izabel Sales de Melo Lins, mobilidade envolve uma série de aspectos do planejamento das cidades.

“Mobilidade não é trânsito, não é carro, não é só ônibus nem andar a pé, é todo um conjunto de infraestruturas de serviços, de informações e de instituições que possibilitam, de forma segura e sustentável, o movimento das pessoas, a mobilidade das pessoas.”

Dentre as intervenções necessárias estão, por exemplo, barras para subir e descer escadas, calçadas largas, regulares e com piso antiderrapante e ônibus no mesmo nível da calçada. Todas essas regras são previstas em lei, inclusive para áreas já construídas.

Na prática, no entanto, quando aplicadas, acabam valendo apenas para projetos novos de urbanização. De acordo com Izabel Lins, todos os projetos financiados com recursos federais têm de obedecer às regras de mobilidade a partir de agora. Para áreas urbanas consolidadas, Izabel Lins reconhece a dificuldade para a implantação das normas.

“É claro que quando a gente fala de cidades mais antigas, já implantadas, zonas já implantadas, às vezes não é tão fácil seguir as normas. Numa cidade que tem as calçadas muito pequenas, as edificações já estão prontas, você fica, muitas vezes o gestor fica com dificuldade.”
Segundo a coordenadora do Estudo Longitudinal das Condições de Saúde e Bem-Estar da População Idosa (Elsi/Brasil), Maria Fernanda Lima, idosos reclamam da qualidade das calçadas e mesmo do tempo do semáforo. Como andam mais devagar, não conseguem atravessar a rua no tempo que dura o sinal verde para pedestres.

O geriatra e professor da Escola de Medicina da Universidade de São Paulo, Paulo Camiz, também ouve esse tipo de queixa de seus pacientes. E concorda que as cidades não estão preparadas para acolher essa parcela da população.
“Tá cheio de idoso no Brasil, mas você não vê eles andando por aí. Eles vão sair pra quê? Pegar um ônibus e, muitas vezes, se acidentar? Ou tropeçar no primeiro buraco da calçada, cair e quebrar o fêmur? Ou pra ser assaltado?”

A violência, aliás, é outro aspecto que afasta o idoso das ruas. Maria Fernanda Lima relata que, em Belo Horizonte, o problema atinge igualmente todas as classes sociais.

“A violência, ela é democrática, a queixa de violência, ou seja, o medo que o idoso tem de sair de casa, por medo de assalto, atinge 80% da população idosa igualmente em todas as regiões da cidade.”

A dificuldade para transitar tem consequências para a população idosa que vão além de limitar o direito de ir e vir. Acaba por impossibilitar esses indivíduos de interagir socialmente e contribui para o isolamento social.

Para os especialistas, essa é uma característica das mais nefastas da sociedade atual. Maria Fernanda, por exemplo, ressalta que hoje é um consenso no mundo inteiro, defendido, inclusive, pela Organização Mundial da Saúde, que o envelhecimento deve ser ativo.

O procurador do Ministério Público Federal Jefferson Aparecido Dias destaca que a interação social é importante não apenas para que o idoso desenvolva o sentimento de pertencimento, mas também para ser reconhecido e respeitado pelos mais jovens.

“Eu acho que é muito importante que o idoso desenvolva essa lógica de pertencimento, que ele se reconheça como pessoa idosa, mas acho também que é importante que os não idosos desenvolvam um sentimento de reciprocidade.”

A aposentada Oraide Capelatto, de 91 anos, é um exemplo de que é possível envelhecer e continuar ativo. Estudante de pós-graduação, após mais de 40 anos de aposentadoria, continua trabalhando todos os dias. E, com a autoridade de mestre, dá um conselho a quem já chegou à terceira idade e, certamente, tem muito a ensinar.

“Por exemplo, tem escolas, creches e a criançadinha precisando de um contador de história – não pagam, é claro, as pessoas vão lá pra ajudar –, por exemplo, não sabe contar história, mas sabe fazer um biscoitinho, sabe fazer alguma coisa gostosa pras crianças. Vai fazer visita pros idosos, vai cantar, precisamos cantar, mesmo que tenha a voz rachada, não tem problema.”

Como ocorre em praticamente todos os setores, faltam dados sobre o patamar em que se encontram as políticas de acessibilidade no Brasil. A dificuldade, nesse caso, é ainda maior porque esta é uma competência dos municípios, que deve constar no plano diretor de cada cidade.

Ao governo federal, como explica Izabel Lins, da Secretaria de Mobilidade, cabe o planejamento, a capacitação de funcionários municipais e auxílio financeiro a alguns projetos específicos. Obras do Programa de Aceleração do Crescimento, por exemplo, que recebem financiamento federal, devem seguir a Lei de Acessibilidade.

 

De Brasília, Maria Neves

Reportagem: Maria Neves
Produção: Iris Cary
Trabalhos técnicos: Ribamar Carvalho
Edição: Mauro Ceccherini

Agência Câmara Notícias

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