Noivado acabou, devolve-se ou não a aliança?

Regina Beatriz Tavares da Silva. CRÉDITO: DIVULGAÇÃO

Noivado acabou, devolve-se ou não a aliança?
        
Regina Beatriz Tavares da Silva*
03 Outubro 2018 | 06h00

Foi noticiado o caso de um advogado americano que está processando sua ex-noiva para que ela lhe devolva o anel de noivado, que lhe custou US$ 100 mil, equivalentes hoje a R$ 392.000. O argumento do ex-noivo é que o anel de noivado se trata de um presente condicionado (conditional gift) ao casamento e, uma vez desmanchado o noivado, deve ser restituído.

Por óbvio, o resultado do julgamento nesse caso concreto dependerá do como a questão é tratada juridicamente em Washington, D.C..

No Brasil, no entanto, a lei estaria em favor do ex-noivo.

O noivado, também chamado de esponsais, é a promessa de casamento realizada reciprocamente pelo casal. Mas, uma vez que ninguém pode ser obrigado a casar, essa promessa pode ser rompida a qualquer momento pelos mais diversos motivos.

Podemos dizer, com isso, que o noivado é relação de fato, sem efeitos jurídicos imediatos, que não gera obrigação de casar. Ou, em outras palavras, não há como exigir seu cumprimento.

No entanto, o rompimento injustificado de noivado, após a realização de despesas para o futuro casamento, ou às portas da igreja ou do cartório, pode gerar consequências sancionatórias para quem realiza o rompimento, como a condenação em indenização por danos materiais e/ou morais.

Quanto aos presentes recebidos em decorrência de noivado, que é do que trata o exemplo norte-americano, esses presentes são considerados pelo direito brasileiro como doações feitas em contemplação de casamento futuro (Código Civil, art. 546). A lei brasileira contém a ideia de presente condicionado que foi utilizada pelo ex-noivo americano para fundamentar seu pedido de devolução nos EUA.

O anel ou outra joia, quando oferecido em razão do noivado, deve ser devolvido por quem o recebeu, se solicitada a devolução pelo noivo ou pela noiva que o ofereceu. Falamos em noivo ou noiva como o donatário do presente porque hoje em dia vivemos em regime de igualdade, havendo também presentes das mulheres aos homens em razão do noivado. Se o casamento não se realiza, sua entrega (doação) perde todo o efeito porque a doação foi realizada em contemplação do casamento futuro.

Caso haja a recusa do noivo ou noiva em relação à devolução do presente, é possível reivindica-la pela via judicial, onde nem mesmo será preciso verificar se houve ou não legitimidade do rompimento.

Afinal, a finalidade central da doação foi desfeita. O que era símbolo de construção de uma união vindoura, muitas vezes, transforma-se em vestígio da ruína de uma relação rompida.

Além do anel, reitere-se que cabe exigir a devolução de qualquer outro presente entregue por ocasião do noivado, seja pelo noivo, seja por seus parentes. Assim, a devolução é devida não apenas entre os ex-noivos, como também a parentes do outro noivo ou padrinhos (Código Civil, art. 546).

Há casos em que ocorre a aquisição de bens – como imóvel, mobiliário ou automóvel – com a contribuição de ambos, em nome de apenas um deles. Diante desses casos, primeiro ponto a ser lembrado é que o noivado, não se tratando de relação jurídica, é considerada como relação de fato.

Não se confunde com a união estável. Como abordo no Curso de Direito Civil – Direito de Família (43.ª ed., Editora Saraiva, p.138), não podem ser presumidos esforços comuns em um noivado, motivo pelo qual não há que falar em partilha dos bens comuns, com a divisão dos bens em metade para cada um dos noivos. Diante da aquisição de bens com contribuição de ambos, a solução após o rompimento do noivado estará em partilhar os bens na proporção da contribuição de cada um. Trata-se de uma questão de justiça, de forma a evitar, inclusive, o enriquecimento sem causa de algum dos ex-noivos em detrimento do outro (Código Civil, art. 884).

Voltando ao caso do ex-noivo americano, a recuperação do anel de noivado de US$ 100 mil ainda está pendente de julgamento em Washington, mas, se tivesse ocorrido no Brasil, certamente ele teria o direito de exigir a sua devolução.

*Regina Beatriz Tavares da Silva, presidente da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS). Doutora em Direito pela USP e advogada

Fonte: Estadão

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