ONU aponta a falta de defensores públicos entre as causas da superpopulação carcerária no Brasil

Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ
 

ONU aponta a falta de defensores públicos entre as causas da superpopulação carcerária no Brasil

20/01/2014 - 08h45

A escassez de defensores públicos no país prejudica o acompanhamento dos processos dos detentos e é uma das principais causas da superlotação das prisões brasileiras, atesta relatório preliminar do Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária das Nações Unidas (GTDA/ONU), que realizou visita oficial ao país em março de 2013. A ampliação do número de defensores públicos está entre as mais frequentes recomendações feitas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) durante os mutirões carcerários.

A convite do governo brasileiro, integrantes do GTDA estiveram no País no período de 18 a 28 de março, ocasião em que entrevistaram detentos de unidades prisionais de Brasília, Campo Grande (MS), Fortaleza (CE), Rio de Janeiro e São Paulo. Eles também tiveram audiências com diversas autoridades estaduais e federais, incluindo representantes do CNJ.

Segundo o relatório, defensores públicos que oferecem assistência legal gratuita podem ter de lidar com até 800 casos de uma só vez. “Isso impacta negativamente no direito do detento à equidade e julgamento justo. Mesmo nos estados da Federação onde há um sistema de defensoria pública, comumente as áreas rurais não possuem defensores públicos para defender os detentos”, informa o documento.

Os inspetores da ONU apontam, no documento, que o deficiente acesso dos detentos à Justiça leva muitos deles, sobretudo os que não podem pagar por um advogado, a permanecer presos por tempo superior ao necessário. Foram verificados casos de detenções provisórias que duravam meses, até anos. “Durante este período, o detento não sabia o que estava acontecendo com o seu caso”, critica o documento.

Sem isonomia - Segundo o GTDA, a deficiência na assistência jurídica gratuita é uma das razões para o Brasil registrar alto índice de presos provisórios (ainda não julgados), da ordem de 40% da população carcerária. Além disso, a escassez de defensores impede que haja isonomia no tratamento aos presos.

“A maioria daqueles que estão nas prisões é de jovens homens negros, que são de famílias de baixa renda e não podem pagar por advogados particulares. O grupo de trabalho observou que, em geral, a maioria dos desfavorecidos no sistema de justiça criminal, incluindo adolescentes e mulheres, é de pobres e não pode pagar pela defesa legal”, aponta o relatório.

O GTDA conclui também que os mutirões carcerários do CNJ são importantes para diagnosticar as deficiências no sistema de Justiça brasileiro. “O atraso na obtenção de uma ordem judicial para iniciar o processo foi um tema frequente levantado ao longo da visita. O grupo de trabalho notou que a libertação em massa de prisioneiros por meio do Conselho Nacional de Justiça nos últimos dois anos é uma evidência de que o sistema de justiça criminal é severamente deficiente ao prover assistência legal efetiva e adequada, que poderia ajudar a dar seguimento aos casos dos detentos”, diz o relatório.

Desprivilegiados - O GTDA informa ter identificado muitos casos de detentos que, embora com direito a benefícios como progressão de regime de cumprimento de pena, não podiam desfrutá-los devido à falta de assistência legal adequada. “A natureza arbitrária desses casos é posteriormente exemplificada pelo fato de que aqueles qualificados, para serem libertados ou receberem benefícios, são os economicamente desprivilegiados, que não conseguem pagar pela assistência legal para ajudar em seus casos”, observa o documento.

O Grupo de Trabalho da ONU, ao citar as causas da superpopulação carcerária no Brasil, aponta também o excessivo uso da prisão, a lentidão na tramitação dos processos judiciais e a baixa aplicação, pelo Poder Judiciário, de medidas cautelares substitutivas à prisão e de penas alternativas.

O Conselho Nacional de Justiça tem feito reiteradas recomendações às autoridades estaduais com vistas à solução dos mesmos problemas apontados pelo GTDA. No mutirão carcerário aberto no Amazonas em 17 de setembro de 2013, o  CNJ conseguiu que o governo local anunciasse a nomeação de 60 novos defensores públicos para atuar no interior amazonense, que não contava com esse tipo de serviço.

 

Jorge Vasconcellos
Agência CNJ de Notícias

Notícias

Contrato e pacto antenupcial pela perspectiva de gênero

Contrato e pacto antenupcial pela perspectiva de gênero Autor: Rodrigo da Cunha Pereira | Data de publicação: 16/12/2025 O Direito das Famílias e Sucessões está cada vez mais contratualizado. Isto é resultado da evolução e valorização da autonomia privada, que por sua vez, vem em consequência do...

Autocuratela o novo instrumento que redefine autonomia no futuro

Autocuratela o novo instrumento que redefine autonomia no futuro Marcia Pons e Luiz Gustavo Tosta Autocuratela, agora regulamentada pelo CNJ, permite que qualquer pessoa escolha seu curador antecipadamente, reforçando autonomia e prevenindo conflitos familiares. terça-feira, 9 de dezembro de...

Valor Investe: Seu imóvel vai ganhar um 'CPF': veja o que muda a partir de 2026

Valor Investe: Seu imóvel vai ganhar um 'CPF': veja o que muda a partir de 2026 Por Yasmim Tavares, Valor Investe — Rio 02/12/2025 06h30  Atualizado há 4 dias A implementação do CIB acontecerá de forma escalonada: capitais e grandes municípios terão até agosto de 2026 para atualizar seus...