Senadores pedem integração de esforços para combate ao 'crack'

20/01/2012 - 16h28

Senadores pedem integração de esforços para combate ao 'crack'

[Viciado em crack se abriga em frente a edifício comercial de Brasília para consumir a droga. Cracolândias já são consideradas uma epidemia nacional.]

Os senadores Wellington Dias (PT-PI) e Ana Amélia (PP-RS) veem com ressalvas a ação repressiva realizada desde o início do ano na região da cidade de São Paulo conhecida como Cracolândia. Para os parlamentares, integrantes de comissão do Senado que ao longo de 2011 analisou a questão da dependência química no país, medidas pontuais podem ser úteis, mas desde que integradas a providências voltadas ao tratamento e reinserção social dos dependentes.

Desde a primeira semana do ano, a Prefeitura de São Paulo e o governo estadual promovem uma operação na Cracolândia, com forte presença policial e marcada por confrontos, prisões e desocupação de imóveis. A operação tem recebido críticas por se concentrar na repressão ao consumo e ao tráfico do crack. As autoridades, por sua vez, alegam que oferecem infraestrutura de saúde e assistência social para prestar apoio aos viciados.

Wellington Dias afirma que não basta investir em iniciativas repressivas. Ele alerta para a necessidade de atenção especial ao tratamento e à reinserção social dos dependentes químicos.

- É preciso, de um lado, combater a produção e a venda, e, de outro, reduzir o consumo. Quando você ataca uma região da cidade, mas não resolve a raiz do problema, essas pessoas mudam de lugar, porque elas não deixam de existir. É preciso prevenir, tratar e reinserir esse dependente químico na família dele, na comunidade dele, no emprego, na escola - diz o senador, que presidiu a Subcomissão Temporária de Políticas Sociais sobre Dependentes Químicos de Álcool, Crack e Outras Drogas.

Internação compulsória

Na opinião de Ana Amélia, autora do relatório final da subcomissão, táticas isoladas como a adotada em São Paulo são necessárias, mas não resolvem de fato o problema.

- Praticamente todos os municípios convivem com essa chaga. É necessário não só o engajamento do Congresso e do governo, mas de toda a sociedade, e atitudes mais enérgicas contra o traficante - diz a parlamentar.

Ana Amélia também se diz favorável à internação involuntária e compulsória dos dependentes.

- Primeiramente, é necessário tentar convencer o dependente a se tratar. E, quando isso não for possível, fazer essa internação involuntária, porque essa pessoa dependente não está com um grau de discernimento normal - argumenta.

[Senadora Ana Amélia - Foto: Márcia Kalume / Arquivo Senado]

Segundo a senadora, pesquisa realizada pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) demonstra que os municípios sem ajuda das demais esferas de governo não têm condições de enfrentar o avanço das drogas e de oferecer serviços públicos de recuperação de dependentes que sejam condizentes com as necessidades locais. Ela também lamenta o reduzido número de unidades de serviços de saúde destinados a tratar a dependência química.

- O Brasil hoje não dispõe de instituições médicas e estrutura na área de saúde suficientes para abrigar dependentes químicos - completa.

Nesta quarta-feira (18), o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, anunciou em São Paulo que o governo federal já deu início à liberação de R$ 3,2 milhões para serem aplicados nos próximos seis meses em políticas de combate ao crack em São Paulo. Os recursos fazem parte do Plano Nacional de Enfrentamento ao Crack, que prevê investimentos de R$ 4 bilhões até 2014, dos quais R$ 500 milhões destinados ao estado de São Paulo.

Desafios para gestores

O estudo da CNM, divulgado em dezembro, aponta que 98% dos municípios do país enfrentam problemas relacionados ao tráfico e consumo de drogas ilícitas. A pesquisa, abrangendo 4.430 cidades, identificou uma série de problemas, principalmente para os gestores públicos municipais, no enfrentamento ao consumo de drogas.

Na avaliação do senador Wellington Dias, são necessárias ações integradas e articuladas entre todas as esferas de governo para enfrentar o que classifica de "epidemia de crack no país".

- Trabalhamos no Senado em parceria com a Câmara e junto com o governo federal, ouvindo os setores público e privado e os cientistas. Conhecemos a experiência de vários países do mundo e constatamos que não há outra saída. Precisamos atuar de forma integrada. O Brasil precisa trabalhar na prevenção, no tratamento e na reinserção social dos usuários de drogas - aponta.

[Senador Wellington Dias - Foto: Geraldo Magela / Agência Senado]

De acordo com Wellington Dias, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que o Brasil tenha um prejuízo anual aproximado de R$ 30 bilhões por ano no setor público devido à falta de uma política adequada de combate às drogas. O senador acredita que o prejuízo do setor privado alcance montante semelhante em razão de crimes cometidos por pessoas sob a influência de drogas.

- É o que o governo brasileiro gasta por ano com o tratamento de pessoas com doenças como HIV, hepatite e um conjunto de outras doenças características, pessoas que deixam o mercado trabalho, pessoas que são levadas à Previdência, têm morte precoce. Então é um custo muito elevado. E o custo da sociedade, da área privada é mais ou menos da mesma ordem. Se somarmos cada celular roubado, cada televisão, cada assalto a carro, cada roubo a caixas eletrônicos, cada assalto a banco, ou seja os prejuízos para o setor privado, fruto da necessidade de manter o consumo [de drogas], são muito elevados - diz.

Segundo o senador, o crack já pode ser considerado uma epidemia, em virtude de seu alto poder de propagação. Estimativas da Comissão de Segurança da Câmara dos Deputados e da Polícia Federal indicam que já existem mais de 1,2 milhão de usuários dessa droga no país. Para o senador, o cálculo é conservador e o número de dependentes já deve estar na casa dos 2 milhões.

Para o parlamentar, as políticas de combate à droga praticadas por países como Suécia, Portugal e Holanda podem servir de exemplo para o Brasil.

- A estimativa é de que precisamos de algo em torno de R$ 3,5 bilhões para desenvolver no país uma rede de enfrentamento às drogas e de tratamento dos dependentes. É possível reduzir em 30 % o número de dependentes. É algo que Portugal e Suécia já antigiram. E isso tem efeito no número de mortes no trânsito, de assaltos, e mesmo no número de pessoas em presídios e no 'custo Brasil' - argumenta.

 

Rodrigo Baptista / Agência Senado

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