Votação de penas para vandalismo em manifestações é suspensa
Projeto é tentativa criminalizar manifestações, diz Lindbergh Farias
14/05/2014 - 15h03 Comissões - Constituição e Justiça - Atualizado em 14/05/2014 - 15h03
Sem acordo, CCJ suspende votação de penas para vandalismo em manifestações
Djalba Lima
Sem acordo, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) suspendeu, nesta quarta-feira (14), a votação, em decisão terminativa, do projeto que altera o Código Penal para reprimir crimes ocorridos em manifestações ou concentração de pessoas. A decisão de transferir a votação para a próxima quarta-feira (21) foi adotada pelo senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR), que estava na presidência da reunião, após sugestão do senador Humberto Costa (PT-PE).
A existência de dois votos em separado sobre a matéria já era indício da grande polêmica que acabou dominando a maior parte da reunião da CCJ. Um desses votos, assinado pelos senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Lindbergh Farias (PT-RJ), pede simplesmente a rejeição do projeto. O segundo, do senador Acir Gurgacz (PDT-RO), prevê pena de reclusão de 8 a 12 anos para quem pratique dano de incêndio em veículos, instalações, estações e terminais de passageiros do serviço de transporte público coletivo de passageiros.
Após considerar "demasiadamente amplo" o projeto original (PLS 508/2013), de autoria do senador Armando Monteiro (PTB-PE), o relator, senador Pedro Taques (PDT-MT), apresentou um substitutivo. Taques optou por aumentar as penas para crimes já tipificados, caso eles sejam cometidos no contexto de vandalismo.
A proposta de Taques considera circunstância agravante para a pena o uso de máscara, capacete ou qualquer outro utensílio ou expediente destinado a dificultar a identificação de quem comete o crime. Também define como homicídio qualificado, com reclusão de 12 a 30 anos, o crime em manifestações e concentração de pessoas. A pena para lesão corporal poderá ter um acréscimo de 50%, se cometida nas mesmas circunstâncias.
Por fim, o substitutivo tipifica o dano ao patrimônio público ou privado praticado durante manifestações públicas. A pena é de reclusão de 2 a 5 anos, além de multa.
Criminalização
Lindbergh considerou a proposta uma tentativa de criminalizar os movimentos sociais e as manifestações. Na opinião do senador, nunca foi tão difícil a um jovem de 18 anos protestar como nos dias de hoje – no Rio de Janeiro, 300 foram presos de uma vez, em manifestação. Lindbergh lembrou que, com 18 anos de idade, como integrantes da União Nacional dos Estudantes (UNE), ele e Randolfe invadiram a Bolsa de Valores na véspera da privatização da Vale do Rio Doce.
– Quebramos as portas e invadimos. Com 18 anos, eu acreditava, naquele momento, que nós estávamos num grande projeto de defesa do Estado – afirmou, defendendo a oferta de diálogo aos jovens, e não endurecimento.
Randolfe disse que a proposta pretende emprestar a uma condição desejada pela democracia – a ocorrência de manifestações populares – o papel de qualificadoras de crimes, aumentando sensivelmente as penas previstas no Código Penal.
Também contrário ao projeto, o senador Humberto Costa questionou o que considerou subjetivismo e imprecisão de alguns pontos do substitutivo. O parlamentar citou, por exemplo, a utilização de máscara ou outro utensílio que dificulte a identificação.
Segundo ele, os cara-pintadas usavam tinta no rosto não com o objetivo de dificultar a identificação, mas para expressar seu protesto. A utilização de lenços com vinagre, nos protestos na época da ditadura, conforme o senador, tinha o objetivo de neutralizar os efeitos do gás lacrimogêneo.
– O objetivo não era fazer qualquer delito; era de expressar um posicionamento, uma postura, um emblema, um símbolo. Como é que nós vamos, agora, dar maior gravidade a um crime pelo fato de ele ser realizado com máscara, dentro de uma mobilização?
A senadora Ana Rita (PT-ES) observou que o Brasil já tem leis suficientes para punir eventuais excessos e anunciou voto contrário ao projeto.
Defesa
Autor do projeto, o senador Armando Monteiro disse que a sociedade brasileira "está indignada diante da escalada das manifestações que resvalaram para um quadro de violência exacerbada". Segundo ele, o legislador tem que responder a determinadas circunstâncias da dinâmica da vida social.
O substitutivo de Pedro Taques, acrescentou, é uma evolução. Armando observou que, em países com regimes democráticos, "há legislações muito mais coercitivas no trato dessas questões". Citou o caso da Espanha, que instituiu um tipo penal específico para desordem com depredação de patrimônio.
Também favorável ao projeto, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) pediu ao relator a inclusão, na proposta, de um artigo que reprima a violência policial nas manifestações. Pedro Taques concordou com a sugestão, mas considerou mais apropriado fazer a mudança na Lei de Abuso de Autoridade (4.898/1965).
O senador Romero Jucá (PMDB-RR) argumentou que o substitutivo de Taques não limita a participação popular, mas protege a sociedade da depredação, das agressões e das mortes praticadas por criminosos.
Após lembrar que 268 ônibus foram queimados em manifestações no país, somente neste ano, Jucá anunciou apoio ao voto em separado de Acir Gurgacz, que prevê pena de reclusão de 8 a 12 anos para quem pratique dano de incêndio em veículos, instalações, estações e terminais de passageiros do serviço de transporte público coletivo de passageiros.
Depredações
Também favorável ao projeto, o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) afirmou que as manifestações de junho e julho do ano passado "refluíram exatamente no momento em que os chamados Black Blocs e congêneres passaram a se servir daquele ambiente para depredar".
Segundo o parlamentar paulista, ao propor "uma resposta eficaz a esse tipo de comportamento", o Senado consolida o ambiente para propiciar manifestações pacíficas.
Ao comentar as diversas manifestações, Pedro Taques apontou um entendimento equivocado sobre o substitutivo, que, segundo ele, "não regra manifestações, mas apenas estabelece a punição para os que cometem crimes".
Os que acusam a proposta de autoritária, na avaliação de Taques, manifestam desconhecimento sobre legislação semelhante em vários países democráticos. Para o relator, o Estado tem o dever fundamental de proteger os cidadãos daqueles que cometam crimes.
Agência Senado