Ainda sem legislação específica, herança digital requer atenção

Ainda sem legislação específica, herança digital requer atenção

Com a evolução da tecnologia, especialmente no âmbito das redes sociais, novos questionamentos sobre herança digital começaram a aparecer na mídia. Você já parou para pensar no assunto?

Hoje em dia quase metade da população mundial “vive” em alguma rede social. Isso corresponde a quase 4 bilhões de usuários ativos, que têm o seu próprio patrimônio virtual, dentre eles: fotos, vídeos, áudios, games, músicas, filmes, centenas de mensagens particulares, moedas virtuais e senhas de banco.

Nesse sentido, é preciso diferenciar o patrimônio digital com valoração econômica, daquele que não o possui. Os que não possuem valor econômico servem como manutenção de relações de afeto e comunicacionais, com fim meramente informativo, já os bens digitais com valor econômico geram renda, são negócios. Temos como exemplos: músicas, textos, fotos, filmes, poemas e livros.

Nessa toada há também os conhecidos “Influenciadores Digitais” e “Youtubers” que, por meio da contabilidade de seguidores e engajamento dos seus posts, vendem a menção de um produto ou serviço nas suas redes sociais e blogs.

Inevitavelmente, no direito, vivemos, por vezes, um momento de ruptura e de mudanças. Nesse caso, o tema ainda carece de uma lei estabelecida em nosso país. Ocorre que, sem a devida previsão legal, não há respaldo para a proteção do conceito no mundo dos fatos.

O que deve ser feito, então, com todo o patrimônio digital depois que um usuário morre?

A sucessão em síntese é a transmissão da herança. Esta, por sua vez, numa classificação mais conservadora, é reconhecida como o conjunto de direitos e obrigações (patrimônio) transmitidos com a morte do indivíduo. O Código Civil de 2002, em seu artigo 1857, §2º, permite que o testamento tenha um conteúdo extrapatrimonial. Alguns doutrinadores têm recomendado aos titulares das contas eletrônicas que registrem sua manifestação de vontade ainda em vida, com um bom planejamento sucessório e o registro de um testamento.

Em 2019, dois Projetos de leis que tratavam do tema “herança digital” tramitavam no Congresso. Um deles era o PL 4.847, de 2012, que visava estabelecer normas de herança digital. O referido projeto definia que:

“A herança digital defere-se como o conteúdo intangível do falecido, tudo o que é possível guardar ou acumular em espaço virtual, nas condições seguintes: I – senhas; II – redes sociais; III – contas da Internet; IV – qualquer bem e serviço virtual e digital de titularidade do falecido”.

Não obstante, o PL 4.099, de 2012, visava garantir aos herdeiros a transmissão de todos os conteúdos de contas e arquivos digitais. Assim previa:

“Se o falecido, tendo capacidade para testar, não o tiver feito, a herança será transmitida aos herdeiros legítimos. Ainda, foi escrito que caberia ao herdeiro: I – definir o destino das contas do falecido; a) transformá-las em memorial, deixando o acesso restrito a amigos confirmados e mantendo apenas o conteúdo principal ou; b) apagar todos os dados do usuário ou; c) remover a conta do antigo usuário”.

Os dois projetos de lei foram arquivados.

Em 2017 foi proposto o PL 7.742/17, que aguarda parecer do relator na Câmara dos Deputados. O texto visa incluir um artigo 10-A no Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14), que estabelece que os provedores de aplicações de internet devam excluir as respectivas contas de usuários mortos logo após a comprovação da morte, desde que se tenha um requerimento do cônjuge, companheiro ou parente maior de idade.

Além disso determina que mesmo após a exclusão das contas, os provedores mantenham os dados e registros armazenados pelo prazo de um ano, a partir da data da morte, ressalvado requerimento cautelar de prorrogação da autoridade policial ou do MP. A Lei do Marco Civil da internet estabeleceu princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil. Ela assegura entre os direitos dos usuários da internet a:

(i) inviolabilidade da intimidade e da vida privada (Artigo 7º, I), (ii) a preservação do sigilo das comunicações privadas transmitidas ou armazenadas (Artigo 7º, II, III); (iii) a proteção contra o fornecimento de dados pessoais coletados pela internet a terceiros sem prévio consentimento do titular (Artigo 7º, VII); (iv) o direito a informações claras e completas sobre o tratamento de dados pessoais (Artigo 7º, VIII) e (v) a prerrogativa do consentimento expresso e destacado sobre o tratamento destes (Artigo 7º, XI).

Tais projetos têm como objetivo garantir ao morto sua privacidade e intimidade. E, quando a herança digital tiver valor econômico garantirá, também, que faça parte do inventário/partilha. Afinal, se há valor patrimonial, cabe sucessão.

Aos poucos, casos relacionados à herança digital vêm aparecendo diariamente para o judiciário decidir. Em decisões recentes, alguns magistrados têm entendido que tais direitos possuem natureza personalíssima. Assim, diversos pedidos têm sido sentenciados como ilegítimos, pois ferem o direito à intimidade da pessoa humana.

Diante disso, as novas formas de patrimônio e herança exigem um rápido e claro posicionamento do ordenamento jurídico brasileiro, pois, passamos a experimentar novos desafios no direito, como é o caso neste momento, do tratamento do legado profissional e o respeito à privacidade da pessoa, inclusive após a sua morte.

Eduardo Manzeppi, advogado, membro da Comissão de Direito Eletrônico da OAB-MT e da Comissão Nacional de Tecnologia Juridica do CFOAB.
Flávio Ricarte, advogado, membro da Comissão de Direito das Famílias e Sucessões da OAB-MT, membro do IBDFAM-MT (Instituto Brasileiro de Direito de Família).

Fonte: ConJur
Extraído de Jurisite

 

Notícias

Usucapião de apartamento ou casa em condomínio de luxo

Usucapião de apartamento ou casa em condomínio de luxo Você já deve ter pensado que usucapião é apenas para imóveis abandonados ou aqueles imóveis em áreas mais remotas com casas inacabadas Data: 20/05/2024 14:05 Alterado: 20/05/2024 14:05 Autor: Aleksander Szpunar Netto Fonte: Assessoria Pois bem,...

Entidades pedem ao Congresso cautela em análise do novo Código Civil

Entidades pedem ao Congresso cautela em análise do novo Código Civil A nota aponta que alterar o CC sem que as novas regras reflitam verdadeiramente as necessidades e aspirações da sociedade seria equívoco de consequências indesejáveis. Da Redação terça-feira, 21 de maio de 2024 Atualizado às...

Juiz restabelece pagamento de pensão suspenso por união estável

VERBA ALLIMENTAR Juiz restabelece pagamento de pensão suspenso por união estável 20 de maio de 2024, 20h13 “Essa decisão reforça a importância do devido processo legal e dos direitos fundamentais em procedimentos administrativos que afetam diretamente a subsistência dos cidadãos. As autoridades...

Venda de imóveis entre pais e filhos: cuidados legais e planejamento sucessório

OPINIÃO Venda de imóveis entre pais e filhos: cuidados legais e planejamento sucessório Amadeu Mendonça 18 de maio de 2024, 13h26 Assinatura de todos os filhos como testemunhas: para evitar futuras alegações de fraude ou de que a transação prejudicou a legítima dos herdeiros, é aconselhável obter a...