Divórcio pode ser decretado antes de definição de guarda e partilha, decide STJ
Divórcio pode ser decretado antes de definição de guarda e partilha, decide STJ
19/03/2025
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do Migalhas)
Atualizada em 20/03/2025
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ reconheceu que o divórcio pode ser decretado independentemente da definição da guarda dos filhos, da fixação de alimentos e da partilha de bens. Ao analisar o caso em que uma das partes solicitou a decretação separadamente das demais questões, a ministra Nancy Andrighi destacou a natureza potestativa do divórcio e reforçou que sua concessão não pode ser condicionada à resolução de outros temas.
"Eu estou dizendo que isso é possível, sim, porque o divórcio é um direito potestativo e esse também é um dos objetivos do novo Código, das modificações do novo Código, que é a antecipação parcial do mérito, daquilo que pode ser resolvido, está resolvido", afirmou a ministra.
Ainda conforme a relatora, o desmembramento da decretação do divórcio pode evitar que a parte interessada fique aguardando anos para formalizar sua nova situação conjugal. Dessa forma, ela decretou o divórcio das partes e determinou o prosseguimento da ação quanto às questões que exigem instrução probatória.
Os advogados Marília Pedroso Xavier e William Soares Pugliese, membros do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM e autores do livro “Divórcio liminar: técnica adequada para a sua decretação” (Editora Foco), avaliam que a decisão reforma posicionamento anterior da Corte e elimina “mais uma barreira conservadora no Direito das Famílias". Os dois respondem em conjunto e citam a Emenda Constitucional – EC 66/2010, concebida pelo IBDFAM.
“A decisão rompe com o último requisito formalista que permitia a recusa injustificada de um dos cônjuges em conceder o divórcio. Quem não quer ficar casado não precisa ficar casado e o direito processual não pode mais ser usado como ferramenta contra a tutela dos direitos. Essa constatação decorre da EC 66/2010, mas somente agora produziu seu máximo efeito. Na prática, portanto, o casal se divorcia já no início do divórcio litigioso e o processo segue para resolver as questões que decorrem do rompimento da relação, tais como partilha e pensão”, explicam os especialistas.
Antecipação do mérito
Ao proferir o voto, a ministra Nancy Andrighi também destacou as recentes modificações no Código de Processo Civil – CPC que permitem a antecipação parcial do mérito. Marília Xavier e William Soares comentam que a norma oferece técnicas processuais adequadas para a tutela de direitos, o que não é diferente do caso do Direito das Famílias. Para eles, os dois temas precisam ser melhor relacionados e aplicados.
“A tese sempre foi adequada ao CPC, pois se o divórcio é um direito potestativo, não há como a outra parte se insurgir contra esse pedido. Não se pode perder de vista que o divórcio é um direito humano, assim, não podemos naturalizar o fato do Estado-juiz querer impor a manutenção de um casamento quando uma das partes já não deseja permanecer junto. Trata-se de uma intromissão indevida, pois é corolário da dignidade da pessoa humana que, no campo existencial afetivo, cada pessoa possa se autodeterminar”, afirmam.
E acrescentam: “No mundo ideal, as demandas de família seriam todas resolvidas por acordo que versasse sobre a integralidade dos aspectos controvertidos. Infelizmente, em razão de todo o componente emocional envolvido, essa é uma realidade ainda bastante excepcional. Com isso, temos intensa judicialização nessa área e as Varas de Família acabam sendo morosas em razão desse estoque de processos. Nesse contexto, acaba sendo muito importante se valer de técnicas processuais que permitem o desmembramento de demandas tão complexas e a consequente resolução parcial de cada uma”.
Vínculo simbólico
Os especialistas argumentam que a principal vantagem do divórcio liminar é o rompimento do vínculo simbólico do casamento, o que, segundo eles, facilita o diálogo entre as partes sobre outros pontos a serem resolvidos judicialmente. “Nos casos em que o divórcio não é decretado, há um peso muito grande entre os envolvidos até o casamento ser desfeito, o que prejudica a produção de provas, a condução do processo e a aplicação adequada do Direito”, avaliam.
Ainda assim, eles admitem que há o risco de um dos réus ser surpreendido com a decretação do divórcio. “Há um valor inegociável em jogo que é a ética. Não é normal, muito menos razoável, uma pessoa ser simplesmente surpreendida pelo seu cônjuge por um pedido de divórcio. O divórcio liminar não pode se prestar a emanações de má-fé. Por isso, a advocacia familiarista precisa assumir um compromisso em só requerer um divórcio judicial perante o juízo depois de ter certeza que as partes já conversaram, tentaram estratégias de mediação visando a manutenção do casamento e que já estejam eventualmente separadas de fato.”
E concluem: “O julgamento antecipado parcial do mérito pode ser um grande aliado do Direito das Famílias. Para além do divórcio, há outros temas que podem ser objeto de decisões antecipadas. Ao permitir o julgamento parcial de pedidos, o CPC permite a redução da complexidade das demandas e libera o Judiciário para se concentrar nos pontos que realmente demandam atenção”.
Por Guilherme Gomes
Fonte: IBDFAM