Ilegalidade da cláusula de prorrogação de entrega do imóvel

Ilegalidade da cláusula de prorrogação de entrega do imóvel

Publicado por Andressa Garcia - 20 horas atrás

É comum nos contratos de promessa de compra e venda de bens imóveis em construção estarem presentes a cláusula que permite ao construtor/incorporador atrasar a entrega do imóvel em até 180 dias sem qualquer prejuízo ou ônus. Ocorre que esta cláusula é totalmente abusiva, segundo a legislação consumerista.

Primeiramente, cabe observar que a mencionada cláusula é inserida dentro de um contrato por adesão, que prever um plano de pagamento do imóvel, pelo consumidor, com datas certas e pré-determinadas, sob pena de sanções contratuais, como multa, juros e até a rescisão do contrato com perda de parte do que tenha sido pago.

Do outro lado, prevê a obrigação da incorporadora/construtora construir o imóvel e entregá-lo em prazo igualmente pré-determinado. Não obstante essa pré-determinação, porém, as construtoras colocam nos contratos as chamadas cláusulas de tolerância, que é de 180 dias.

Como observa-se, não há no contrato, com a inserção da cláusula, um equilíbrio na relação de consumo; não há a equidade, a se refletir na bilateralidade dos contratos de consumo. Ou seja, isso quer dizer que a relação de consumo tem que ser equilibrada, na sua balança de prestações e contraprestações, não podendo pender com a desigualdade de benefícios para uma das partes. Neste sentido o art. 51, IV do CDC:

Art. 51 – São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos ou serviços que:

[…]

IV – estabeleçam prestações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;

Vale também a lição de Felipe Peixoto Braga Netto:

Serão inválidas as disposições que ponham em desequilíbrio a equivalência entre as partes. Se o contrato situa o consumidor em situação inferior, com nítidas desvantagens, tal contrato poderá ter a sua validade judicialmente questionada, ou, em sendo possível, ter apenas a cláusula que fere o equilíbrio afastada. (Felipe Peixoto Braga Netto, in Manual de Direito do Consumidor, Salvador: Edições Juspodivm, 2009)

Verifica-se desta forma, que na medida em que o contrato confere à construtora o direito de atrasar o cumprimento de sua obrigação (entregar a unidade imobiliária), o mesmo direito deve ser conferido ao adquirente, de modo a ter um “prazo de carência” para o cumprimento de suas obrigações – realização dos pagamentos. Assim, se o contrato concede esse direito à construtora, e não o defere ao adquirente, pode-se concluir que houve desrespeito à exigência do CDC no que se refere ao equilíbrio contratual.

A exceção que admitiria a utilização da cláusula de tolerância, com a possibilidade de atraso na entrega da unidade imobiliária, mesmo assim em patamar mais razoável (90 dias), seria na ocorrência de um caso fortuito ou de força maior. A doutrina e a jurisprudência convergem no entendimento de que o fortuito e a força maior são apenas as situações imprevisíveis e inevitáveis. Vejamos se é possível encaixar esses conceitos nos principais argumentos das construtoras para justificar os atrasos: a) problemas com o terreno da construção, b) greve dos trabalhadores da construção civil e c) falta de materiais de construção e de mão-de-obra.

Quanto a ocorrência de problemas com as condições do solo, o terreno em declive, utilização do mesmo como lixão, greve de trabalhadores em busca de acordo salarial, ou mesmo dificuldade de contratação de mão-de-obra, é evidente que se trata de uma falha da construtora no estudo e avaliação prévia da obra pelos seus engenheiros. É um caso evidente de vício (erro, falha) na prestação do serviço. Não se pode transferir a responsabilidade por um erro seu aos consumidores que confiaram na qualidade e responsabilidade da empresa. Como já mostrado acima, o CDC possui normas que proíbem tais práticas (art. 51, I, II, e III).

Em relação a ocorrência de greves dos trabalhadores da construção civil, devido à regularidade da sua ocorrência (todo ano tem) também não se enquadraria como imprevisível. Menos ainda inevitável, já que o seu advento depende de negociações com sindicatos que podem ser antecipadas, melhor negociadas, gerenciadas, etc.

Sobre a falta de materiais de construção e de mão de obra no mercado, a alegação chega a ser desrespeitosa para com os consumidores. Ora, como se pode alegar falta de mão-de-obra e materiais de construção para concluir no prazo um empreendimento em curso, se os Acionados continuam a lançar no mercados novos e novos empreendimentos? É abusar da inteligência do consumidor, argumento pífio!

A conta é simples, se determinada obra levaria 4 anos para ser concluída com 100 trabalhadores, com 200 esse prazo cairia pela metade. É exatamente o que as construtoras não querem fazer, desembolsar para cumprir os prazos dos contratos elaborados por elas próprias, deixando ao sabor de todo tipo de transtornos e prejuízos os consumidores, diante do olhar complacente e inoperante das autoridades e legisladores do nosso país.

O que realmente está por trás dos epidêmicos atrasos nas construções particulares de todo o Brasil são o acintoso desrespeito e despreocupação das construtoras com as famílias que adquirem imóveis e se planejam em cima do cronograma contratualmente firmado para a entrega do empreendimento. É quando o sonho da casa própria vira pesadelo!

Desta forma, cabe observar que a cláusula de “carência” deve ser considerada de plano nula de pleno direito em todos os contratos de promessa de compra e venda de imóvel na planta.

Fonte: Revista Direito

Andressa Garcia
Extraído de Notícias Jurídicas

Notícias

Ligação eterna

  Sogra é parente por afinidade com vínculo permanente Por Luciana Campregher Doblas Baroni   A sogra é motivo de polêmica e piadas. Dia 28 de abril é o dia nacional que a homenageia. Esta figura emblemática da relação do casal encontra previsão no nosso ordenamento jurídico. A partir do...

Suspensas cláusulas restritivas de testamento

28/04/2011 - 11h08 DECISÃO Suspensas cláusulas restritivas de testamento em favor de mulher em dificuldades financeiras A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão que atenuou cláusulas restritivas impostas em testamento a uma mulher que passava por graves dificuldades...

R$ 100 mil de dano moral por negativa de cobertura de endoscopia digestiva

R$ 100 mil de dano moral por negativa de cobertura de endoscopia digestiva (26.04.11) A Unimed Ceará Regional de Itapagé (CE) terá que pagar uma indenização de R$ 100 mil a um consumidor que teve negada internação no Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre (RS), para tratamento de ´insuficiência...

Difamação contra menor no Orkut é crime de competência da Justiça Federal

27/04/2011 - 08h03 DECISÃO Difamação contra menor no Orkut é crime de competência da Justiça Federal O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a competência para julgamento dos crimes de difamação contra menores por meio do site de relacionamento Orkut é da Justiça Federal. Os ministros da...

Registro de patente será mais ágil a partir de maio

Extraído de Notícias Jurídicas Processo de registro de patente será mais ágil a partir de maio SÃO PAULO – O registro de patentes no Inpi (Instituto Nacional da Propriedade Intelectual) será mais ágil a partir de 3 de maio. O novo sistema possibilitará aos depositantes de patentes acompanhar, em...