Jurisprudência mineira - Casamento - Regime de separação total de bens

Jurisprudência mineira - Casamento - Regime de separação total de bens - Imóvel adquirido em condomínio voluntário - Partilha - Fruição

CASAMENTO - REGIME DE SEPARAÇÃO TOTAL DE BENS - IMÓVEL ADQUIRIDO EM CONDOMÍNIO VOLUNTÁRIO - PARTILHA - FRUIÇÃO - VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO

- Adquirido o imóvel por ambos os cônjuges, em regime de "condomínio voluntário", admite-se interpretação mais flexível do regime de bens, favorável à comunicabilidade dos aquestos, sobretudo porque adquirido pelo esforço conjunto dos consortes, sob pena de enriquecimento sem causa.

Apelação Cível nº 1.0024.11.342159-8/001 - Comarca de Belo Horizonte - Apelantes: 1º) L.E.X.; 2º) A.L.D. - Apelados: L.E.X., A.L.D. - Relatora: Des.ª Selma Marques

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, por maioria, dar parcial provimento ao primeiro recurso; rejeitar a preliminar e negar provimento ao segundo recurso.

Belo Horizonte, 17 de setembro de 2013. - Selma Marques - Relatora.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES.ª SELMA MARQUES - Trata-se de recursos de apelação interpostos contra a r. sentença de f. 86/88, proferida nos autos da ação de divórcio ajuizada por L.E.X. contra A.L.D., para julgar "procedente o pedido constante da inicial, partilhando o seguinte bem na proporção de 50% para cada uma das partes: imóvel constituído pela casa residência número..., em Contagem-MG". Em capítulo secundário da sentença, o réu foi condenado a pagar as custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 800,00 (oitocentos reais).

Opostos embargos de declaração à f. 93, rejeitados às f. 110/112.

Em suas razões (f. 113/124), a autora apelante sustenta a necessidade de que seja fixado um valor a título de fruição do imóvel pelo cônjuge varão, já que está privada de sua posse, exercida exclusivamente por ele. Postulou também pela majoração da verba honorária fixada na sentença.

Por sua vez, o réu apelou às f. 94/103, requerendo, preliminarmente, a aplicação do § 1º do art. 557 do CPC ao caso em exame, por entender que a sentença foi proferida em flagrante violação à jurisprudência dominante. Em seguida, argumenta que não é possível a partilha de imóvel, quando adotado o regime de separação total de bens, pois em total descompasso com a vontade dos cônjuges definida em pacto antenupcial. Diz também que não houve prova do esforço comum para que haja a partilha igualitária do bem; ao revés, insiste em dizer que arcou sozinho com todas as obrigações relativas ao imóvel.

Não foram oferecidas respostas aos recursos.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos, salientando que farei sua análise em conjunto, diante da similitude da matéria discutida nos autos.

De início, afasto o pedido do segundo recorrente, formulado nos moldes do disposto no § 1º do art. 557 do CPC, que, ao entendimento da parte requerida, obriga o relator a proferir decisão monocrática, dando provimento ao recurso nas hipóteses ali elencadas, isso porque, ao meu sentir, a norma, aparentemente imperativa, não o é.

Além disso, não vejo conveniência em dar provimento ao presente recurso, monocraticamente, conforme veremos a seguir, de forma que rejeito a preliminar.

Cinge-se a controvérsia ao fato de o Juízo de primeiro grau ter admitido a divisão do imóvel adquirido por ambos os cônjuges na constância do casamento, porque considerado o esforço conjunto para a aquisição do bem, ainda que o casal tenha escolhido o regime da separação absoluta quando da celebração do casamento, por meio do pacto antenupcial de f. 23.

O réu insurge-se contra o conteúdo do julgado, dizendo que a partilha do imóvel fere o pacto antenupcial, que estabelece a separação absoluta dos bens do casal.

Retira-se dos autos que houve a aquisição do imóvel por ambos os cônjuges, em regime de "condomínio voluntário", admitindo-se, portanto, interpretação mais flexível do regime de bens, favorável à comunicabilidade dos aquestos, sobretudo porque adquirido pelo esforço conjunto dos consortes, sob pena de enriquecimento sem causa.

Com efeito, apesar do empenho do réu em comprovar que assumiu exclusivamente todas as obrigações do imóvel, não é isso que evidencia o caderno probatório, sobretudo se considerada a renda de cada parte e o montante destinado à prestação do financiamento imobiliário.

Ora, ressoa dos autos a contribuição de ambos os cônjuges para as despesas do casal, na proporção de seus rendimentos.

Para corroborar essa assertiva, temos, inclusive, a prova do "empréstimo" da autora em favor do réu, de parte do valor recebido a título de FGTS, cujo pagamento foi realizado apenas parcialmente pelo réu.

O próprio réu, em sua defesa, admitiu que, "quando um necessitava de recursos, recorria ao outro".

Acredito que, em se tratando de direito de família e da complexidade que lhe é inerente, além das peculiaridades fáticas que envolvem cada caso concreto, não é possível, observada a evolução do Direito, adotar uma regra absoluta, a qual não seria apta a solucionar todos os litígios possíveis de forma satisfatória, sob pena de, muitas vezes, ter-se que endossar o enriquecimento indevido de um cônjuge em detrimento do outro que contribuiu para a constituição do patrimônio do casal.

A propósito, é defendido por Arnold Wald que, "Se determinados bens forem adquiridos em comum, entre ambos os cônjuges se constituirá um condomínio, regulado pelas disposições gerais de direito civil existentes sobre a matéria. Esse condomínio entre marido e mulher funciona como qualquer condomínio estabelecido entre estranhos" (O novo direito de família. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 169/170).

Acresce, nesse particular, a oportuna observação de Arnaldo Rizzardo:

"Comunicam-se, de acordo com uma corrente, os aquestos provenientes do esforço conjugado dos nubentes, da colaboração mútua, do trabalho harmônico, e não surgidos da atividade isolada de um deles. [...]. A exigência dos requisitos se assemelha aos estabelecidos para a união estável pura e simples, nunca se olvidando a necessidade de se verificar o esforço comum, que não se constata quando um dos cônjuges não passa de um mero convivente, ou acompanhante, em nada atuando na vida conjugal, sendo sustentado, tudo recebendo, e não aportando com nenhuma contribuição na formação do patrimônio. Isso para evitar o extremo oposto do objetivado pela criação jurisprudencial, consistente na exploração de pessoas que se aproveitam de outras emotiva e afetivamente mais frágeis e carentes" (Direito de família. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 662/663).

Vale dizer, as próprias partes, ao adquirirem o bem em condomínio, flexibilizaram as regras do regime de bens adotado, o que autoriza seja esse bem partilhado meio a meio.

Ultrapassada essa questão, estando o réu na posse do imóvel, privando a autora de seu uso, por questões óbvias, faz ela jus a uma indenização pela fruição do bem, no percentual de 0,5% do valor reajustado do contrato pelo período de utilização do imóvel, a partir de 20.02.2011, quando houve a separação de fato do casal.

Quanto aos honorários, dispõe o art. 20, § 3º, do CPC que:

"Os honorários serão fixados entre o mínimo de 10% (dez por cento) e o máximo de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, atendidos:

a) o grau de zelo do profissional;

b) o lugar da prestação do serviço;

c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço".

Por sua vez, estabelece seu § 4º:

"Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação, ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b, c do parágrafo anterior".

Na lição de Yussef Said Cahali:

"[...] o arbitramento dos honorários segundo o critério da equidade não se desvincula da consideração do grau de zelo do profissional, da natureza e importância da causa, do trabalho realizado pelo advogado e do tempo despendido na sua prestação; assim o determina o § 4º do art. 20, na expressa remissão que faz aos fatores informativos indicados no § 3º, letras a, b e c" (Honorários advocatícios, p. 495).

Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery, sobre os critérios para a fixação dos honorários, ensinam:

"São objetivos e devem ser sopesados pelo juiz na ocasião da fixação dos honorários. A dedicação do advogado, a competência com que concluiu os interesses de seu cliente, o fato de defender seu constituinte em comarca onde não resida, os níveis de honorários na comarca onde se processa a ação, a complexidade da causa, o tempo despendido pelo causídico desde o início até o término da ação são circunstâncias que devem ser levadas em consideração pelo juiz quando da fixação dos honorários de advogado" (Código de Processo Civil comentado. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 435). Na hipótese dos autos, considerados os critérios acima, a quantia de R$ 800,00 (oitocentos reais) remunera condignamente o labor do causídico da parte contrária.

Neste sentido, verbis:

"Apelação cível. Ação cautelar. Legitimidade recursal. Exibição de documentos. Pedido extrajudicial. Pretensão resistida.

Condenação da instituição financeira ao pagamento das custas e honorários. Princípio da causalidade. - Tanto a parte quanto seu advogado, em nome próprio, têm legitimidade para recorrer de decisão no tocante aos honorários advocatícios.

Precedentes do STJ. - Pelo princípio da causalidade, aquele que deu causa à propositura da demanda deve responder pelas custas e honorários daí decorrentes. - O valor dos honorários advocatícios deve remunerar condignamente o trabalho desenvolvido pelo causídico, comportando majoração quando fixado em quantia irrisória” (TJMG - AC n. 1.0707.11.028953- 5/001 - Rel. Des. Tibúrcio Marques - j. em 06.09.2012).

Pelo exposto, dou parcial provimento ao primeiro recurso para condenar o réu no pagamento de indenização à autora pela fruição da parte que lhe cabe no imóvel, no percentual de 0,5% do valor reajustado do contrato (f. 27/31), que se dará pelos índices da Corregedoria de Justiça de Minas Gerais, a partir de 20.02.2011.

Rejeito a preliminar e nego provimento ao segundo recurso.

Custas, pelo segundo apelante.

É como voto.

DES.ª SANDRA FONSECA - De acordo com a Relatora.

DES. CORRÊA JUNIOR - Apelação. Família. Divórcio. Partilha. Regime da separação de bens. Aquisição imobiliária pelos cônjuges em conjunto. Partilhamento devido. Indenização decorrente da fruição exclusiva. Possibilidade. Despesas decorrentes da aquisição. Rateio entre os coproprietários. Recurso parcialmente provido.

Adiro ao culto e ilustrado convencimento motivado externado no voto exarado pela eminente Desembargadora Relatora, por também entender como caracterizada in casu a comunicabilidade do bem imóvel objeto do litígio.

Todavia, apresento pequena divergência no que concerne às repercussões jurídicas advindas do partilhamento chancelado nesta Instância Revisora.

Com efeito, declarados a copropriedade do bem em comento e o direito à obtenção de indenização pela posse e fruição exclusivas pelo réu, tenho que também deve ser explicitamente ressaltado o dever da autora de contribuir com os dispêndios tidos com a aquisição dominial comentada.

Emerge dos documentos colacionados ao feito, às f. 23/33, que o imóvel disputado foi adquirido mediante financiamento habitacional, ainda remanescendo, em decorrência da comentada aquisição, a obrigação de adimplir as prestações mensais da avença pactuada.

Logo, ostentados pela autora os direitos à meação e à indenização pela fruição exclusiva do réu, deve também in casu ser reconhecida a obrigação da demandante de participar do custeio da aquisição imóvel, mediante o adimplemento de metade das parcelas vencidas após 20.02.2011, ocasião em que concretizada a separação de fato do casal.

Pelo exposto, assim como a eminente Desembargadora Relatora, dou parcial provimento ao recurso interposto pela autora para condenar o réu ao pagamento de indenização pela fruição exclusiva do imóvel, no percentual mensal de 0,5% (meio por cento) do valor do contrato (f. 27/31), devidamente reajustado pelos índices da tabela editada pela Corregedoria-Geral de Justiça, a partir de 20.02.2011.

Determino, todavia, que, a partir da referida data, arque a autora com o pagamento de metade do valor das prestações decorrentes da aquisição do bem partilhado.

Como corolário lógico, determino a compensação, no valor da indenização relativa à fruição exclusiva do bem, do quantum referente à metade dos valores efetivamente saldados pelo réu para o pagamento do financiamento do imóvel, a partir da data acima mencionada (20.02.2011), com atualização monetária pelos índices da tabela editada pela Corregedoria-Geral de Justiça, a partir de cada demonstrado saldar.

No mais, reafirmo a adesão aos demais termos do culto voto já proferido.

É como voto.

Súmula - DAR PARCIAL PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO; REJEITAR A PRELIMINAR E NEGAR PROVIMENTO AO SEGUNDO RECURSO.

 


Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico - MG




Publicado em 16/10/2013

Extraído de Recivil

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