Registro de Imóveis - Jurisprudência - TJMG - Transmissão de imóvel inferior a 125 m2 - Possibilidade

Registro de Imóveis - Jurisprudência - TJMG - Transmissão de imóvel inferior a 125 m2 - Possibilidade

PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA - ALVARÁ JUDICIAL - APELAÇÃO CÍVEL - TRANSFERÊNCIA DE IMÓVEL - ÁREA INFERIOR A 125M2 - IMÓVEL COM MATRÍCULA - AUSÊNCIA DE OBJEÇÃO DO PODER PÚBLICO - CONSOLIDAÇÃO DA SITUAÇÃO PELO DECURSO DO TEMPO - EXERCÍCIO PLENO DO DIREITO DE PROPRIEDADE

- O art. 4º, inciso II, da Lei nº 6.766/79 encontra-se inserido no capítulo reservado aos requisitos urbanísticos para loteamento, os quais devem ser observados por ocasião da solicitação de loteamento urbano perante o Poder Público.

- Se o imóvel com menos de 125m2 possui matrícula no Cartório de Registro de Imóveis, em que foram registradas transações de compra e venda do imóvel, sem qualquer objeção do Poder Público por cerca de 6 anos, resta consolidada a situação pelo decurso do tempo, sendo descabido exigir o cumprimento de requisito urbanístico como condição à transmissão da propriedade a terceiros.

- Deve-se possibilitar o exercício pleno da propriedade, inclusive a faculdade de dela dispor (art. 1.228, CC/2002).

Apelação Cível nº 1.0016.14.014355-9/001 - Comarca de Alfenas - Apelante: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Apelado: Omero Ferreira - Interessado: Cartório de Registro de Imóveis de Alfenas - Oficial Emílio S. Santos - Relatora: Des.ª Ana Paula Caixeta

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em negar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 7 de abril de 2016. - Ana Paula Caixeta - Relatora.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES.ª ANA PAULA CAIXETA - Cuida-se de apelação cível interposta em face da sentença de f. 45/47, prolatada pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Alfenas, Dr. Nelson Marques da Silva, que, nos autos do alvará judicial requerido por Omero Ferreira, julgou procedente o pedido inicial, autorizando o registro da escritura pública de compra e venda do imóvel matriculado sob o nº 46.522 na Serventia daquela comarca, mediante a satisfação das condições impostas administrativa e legalmente para o referido ato.

Inconformado, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, em suas razões recursais de f. 49/54, afirmou que o Município não poderia legislar sobre direito urbanístico; poderia, ``quando muito, suplementar a legislação federal e estadual para viabilizar sua aplicabilidade local, mas nunca, sob nenhuma hipótese, suprimir ou ignorar condições ou exigências previstas em tal legislação. Aduziu que o Município poderia estabelecer metragem mínima dos lotes, atendendo à real necessidade de organização dos centros urbanos, à luz de sua densidade demográfica e ao princípio da função social da propriedade, desde que respeitadas as previsões mínimas estabelecidas na Lei nº 6.766/79, de caráter geral e de observância obrigatória.

Regularmente intimado, o apelado apresentou contrarrazões recursais às f. 56/60, arguindo preliminar de não conhecimento do recurso.

Intervindo no feito, o culto Procurador de Justiça, Dr. Darcy Souza Filho, ofertou parecer às f. 65/67.

Preliminarmente, arguiu o apelado que o recurso interposto pelo apelante feriria o princípio da dialeticidade, porquanto não teria atacado e rebatido os fundamentos da decisão proferida.

Segundo os ensinamentos de Nelson Nery Júnior,

``A doutrina costuma mencionar a existência de um princípio da dialeticidade dos recursos. De acordo com este princípio, exige-se que todo recurso seja formulado por meio de petição pela qual a parte não apenas manifeste sua inconformidade com o ato judicial impugnado, mas também e necessariamente indique os motivos de fato e de direito pelos quais requer o novo julgamento da questão nele cogitada. Rigorosamente, não é um princípio: trata-se de exigência que decorre do princípio do contraditório, pois a exposição das razões de recorrer é indispensável para que a parte recorrida possa defender-se (Teoria geral dos recursos, 6. ed., p. 176).

Contudo, a peça recursal, ao contrário do alegado pelo apelado, atacou o principal fundamento da decisão guerreada, qual seja a possibilidade de o Município editar normas a respeito de direito urbanístico. Tem-se que, caso acolhido o referido argumento, a improcedência do pleito inaugural se imporia.

Rejeita-se, pois, a preliminar arguida e, por via de consequência, conheço do recurso, porquanto presentes seus pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

Na origem, cuida-se de pedido de expedição de alvará judicial para que seja autorizada, perante o Cartório de Imóveis do Município de Alfenas/MG, a transferência de imóvel com área inferior ao limite mínimo exigido pelo art. 4º, inciso II, da Lei nº 6.766/79, que dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano e dá outras Providências. Veja-se:

``Art. 4º Os loteamentos deverão atender, pelo menos, aos seguintes requisitos:

[...]

II - os lotes terão área mínima de 125m² (cento e vinte e cinco metros quadrados) e frente mínima de 5m (cinco metros), salvo quando o loteamento se destinar à urbanização específica ou edificação de conjuntos habitacionais de interesse social, previamente aprovados pelos órgãos públicos competentes; [...].

O dispositivo acima se encontra inserido no capítulo II da lei, reservado aos requisitos urbanísticos para loteamento, os quais devem ser observados por ocasião da solicitação de loteamento urbano perante o Poder Público.

Ocorre que, no caso dos autos, a Matrícula de nº 46.522 data de 26 de maio de 2009, tendo sido indicada expressamente a área de 72,32m2, sem que fosse apresentada qualquer objeção do Poder Público, embora já estivesse vigente a Lei nº 6.766/79 (vide certidão de f. 08).

Vê-se que, após a inscrição da matrícula, foram registradas duas transações de compra e venda do imóvel, ambas ocorridas no ano de 2010, sendo a última delas relativa ao aqui apelado.

Logo, estando a situação consolidada pelo decurso do tempo, tenho por descabido exigir, somente agora, transcorridos cerca de seis anos, o cumprimento de requisito urbanístico - que deveria ter sido observado à época da abertura da matrícula -, como condição à transmissão da propriedade a terceiros. Ora, naquele momento, já estava configurada a ausência do requisito da área mínima indicada na Lei nº 6.766/79, e não foi apresentada objeção pelo Poder Público.

A se pensar de modo diverso, estar-se-ia impedindo o exercício pleno da propriedade. É que o decurso do tempo e a inexistência de óbice por parte do Poder Público geraram legítima expectativa no titular do domínio de que o imóvel se encontrava regular, ferindo a boa-fé e a razoabilidade, impedindo o exercício da faculdade de dispor da propriedade (art. 1.228 do CC/2002).

Esse o entendimento manifestado pela douta Desembargadora Heloísa Combat, na relatoria da Apelação Cível nº 1.0016.13.008427-6/001, em que atuei na qualidade de Revisora. Confira-se:

``Direito urbanístico. Apelação cível. Alvará judicial para lavratura de escritura pública de doação com reserva de usufruto no Cartório de Registro de Imóveis. Óbice previsto no art. 4º, II, da Lei n. 6.766/79. Terreno com área inferior a 125m2. Relativização da exigência legal. Imóvel registrado desde 1980, sem oposição do Poder Público. Boa-fé. Legítima expectativa. Exercício pleno do direito de propriedade. Recurso provido. - A previsão contida no art. 4º, inciso II, da Lei 6.766/79, que estabelece que os lotes não poderão ter área inferior a 125m2, não impede o registro no Cartório de Registro de Imóveis de lotes com área inferior àquela, com situação consolidada há mais de trinta anos, mas apenas veda a aprovação pela Prefeitura Municipal de um projeto de parcelamento do solo, em que os lotes sejam inferiores àquela metragem. - Ademais, `A exigência prevista no art. 4º, II, da Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei n. 6.766/79), de que os loteamentos urbanos tenham lotes com área mínima de 125m2, não pode servir de óbice ao registro translativo da propriedade, que, a despeito de possuir área inferior à exigida pela norma, já se encontra matriculada, nessa condição, há mais de catorze anos, sem que, desde então, tenha havido qualquer objeção do Poder Público, sob pena de se quebrar a legítima expectativa de regularidade gerada nos donos e se frustrar o pleno exercício do direito de propriedade" (Apelação Cível 1.0016.12.001126-3/001, Relator: Des. Eduardo Andrade, 1ª Câmara Cível, j. em 21.08.2012, publicação da súmula em 30.08.2012). - Recurso provido (Apelação Cível 1.0016.13.008427-6/001 - Relatora: Des.ª Heloísa Combat - 4ª Câmara Cível - j. em 21.11.2013 - p. em 27.11.2013).

Além do mais, os dispositivos legais não podem ser entendidos de forma absoluta, principalmente quando em conflito com direitos considerados fundamentais, como o direito à moradia e a dignidade da pessoa humana.

Embora menor do que o mínimo legalmente previsto, o fato é que o lote está devidamente registrado, devendo ser concedido o alvará judicial para que o autor possa registrar a escritura pública de compra e venda do imóvel matriculado sob o nº 46.522 na Serventia de Imóveis, sob pena de restar esvaziado o seu direito de propriedade.

Tem-se, ainda, que, como bem registrado pela douta sentença, o art. 2º, caput e seu § 4º, inserido pela Lei nº 9.785/99, privilegiaram a competência municipal para dispor sobre o parcelamento do solo a partir dos parâmetros e da realidade local.

Com essas considerações, nego provimento ao recurso, mantendo incólume a sentença proferida.

Custas recursais, ex lege.

Votaram de acordo com a Relatora os Desembargadores Renato Dresch e Moreira Diniz.

Súmula - NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO
.

Data: 31/05/2016 - 11:22:55   Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico
Extraído de Sinoreg/MG

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