TRF3 reconhece legitimidade de companheiro homossexual de falecido para autorizar doação de órgãos

TRF3 reconhece legitimidade de companheiro homossexual de falecido para autorizar doação de órgãos

Publicado em: 17/11/2014

A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou, por unanimidade, decisão da 9ª Vara Federal de São Paulo que julgou procedente ação civil pública e determinou que a União, na qualidade de gestora do Sistema Nacional de Transplantes, passe a considerar o companheiro ou companheira homossexual como legitimado a autorizar a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo do companheiro falecido para transplante, desde que cumpridos os mesmos requisitos e apresentados os mesmos documentos exigidos de companheiros heterossexuais.

A União apelou da decisão de primeiro grau alegando que a união homoafetiva não é reconhecida no Brasil, condição que, por si só, impediria ao companheiro autorizar a doação de órgãos, tecidos e partes do corpo para transplantes, sendo necessária, nesses casos, a permissão das pessoas relacionadas no artigo 4º, da Lei 9.434/97 (cônjuge ou parente).

Argumentou ainda o artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição Federal, afirma que a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado e que esse dispositivo reconhece somente a relação entre o homem e a mulher como entidade familiar. Alegou também que o Poder Judiciário não pode exercer função legislativa para ampliar o alcance da Lei 9.434/97.

O Ministério Público Federal, autor da ação, também apelou ao TRF3, com o objetivo de obrigar a União a editar ato administrativo que reproduza os termos da sentença de primeiro grau.

A desembargadora federal Monica Nobre, relatora do acórdão no TRF3, afirmou que a inexistência de regra expressa que contemple o companheiro homossexual com a possibilidade de autorizar a remoção post mortem de órgãos, tecidos e partes do corpo do companheiro falecido para transplante não impede o reconhecimento do seu direito.

Declarou ainda que não há como considerar como legitimados para autorizar a doação post mortem de órgãos somente o cônjuge ou o companheiro heterossexual, pois “tal entendimento contraria princípios norteadores da Constituição, que consagram a igualdade, a dignidade da pessoa humana e a promoção do bem de todos”.

Ela ressaltou a importância de ser observado o princípio constitucional contido no artigo 3º, inciso IV, da Constituição Federal, que veda a adoção, seja pelos particulares ou pelo próprio Estado, de comportamentos, comissivos ou omissivos, que impliquem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. “Trata-se de princípio cuja aplicabilidade é plena e a qual deve ser atribuída a máxima eficácia”, destacou a desembargadora.

Além disso, destacou que a questão já se encontra pacificada no Supremo Tribunal Federal que, no dia 5 de maio de 2011, na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.227 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 132, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, declarou a aplicabilidade de regime de união estável às uniões entre pessoas do mesmo sexo.

“Com isso, a união homoafetiva deixou de ser considerada uma mera sociedade de fato e passou a ser reconhecida como uma entidade familiar. Os casais homossexuais passaram a ter os mesmos direitos dos casais heterossexuais em regime de união estável, como divisão de bens, pensão alimentícia em caso de separação, declaração em conjunto no imposto de renda, pensão e herança em caso de morte de um dos parceiros, etc.”, explicou a desembargadora.

Ela salientou, ainda, que o Conselho Nacional de Justiça aprovou, em 2013, a Resolução 175, que impede os cartórios brasileiros se recusem a converter uniões estáveis homoafetivas em casamento civil.

“Dessa forma, preenchidos os requisitos da união estável (relações homoafetivas), a União, através de todo Sistema Nacional de Transplantes, deve considerar o(a) companheiro(a) homossexual como legitimado(a) a autorizar a remoção post mortem de órgãos, tecidos e partes do corpo do(a) companheiro(a) falecido(a) para transplante”, declarou a magistrada.

Porém, sobre a apelação do Ministério Público Federal, a desembargadora afirmou que o Poder Judiciário não pode determinar a expedição de atos administrativos e que, no máximo, pode recomendar à União que edite ato administrativo reproduzindo o entendimento adotado na decisão.

Assim, a desembargadora negou provimento aos recursos e determinou que a União comunicasse ao Sistema Nacional de Transplantes (Ministério da Saúde, Secretarias de Saúde dos Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como estabelecimentos hospitalares autorizados e rede de serviços auxiliares necessários) o teor da decisão.

Apelação/reexame necessário 0900598-64.2005.4.03.6100/SP

Fonte: TRF3
Extraído de Recivil

Notícias

Juíza reconhece impenhorabilidade de imóvel de família em ação de cobrança

BEM PROTEGIDO Juíza reconhece impenhorabilidade de imóvel de família em ação de cobrança 18 de outubro de 2024, 15h54 No recurso, a embargante argumentou que o imóvel é utilizado como moradia pela sua família, o que o torna impenhorável conforme a Lei 8.009/1990, que protege este tipo de...

TJ/PR vê fraude e anula venda de imóvel durante ação de execução

Alienação TJ/PR vê fraude e anula venda de imóvel durante ação de execução Tribunal ressaltou que ausência de penhora não isenta terceiros de investigarem regularidade do imóvel. Da Redação quinta-feira, 17 de outubro de 2024 Atualizado às 14:30 A 16ª câmara Cível do TJ/PR reconheceu como fraude a...

Evolução e relevância da separação de fato no direito brasileiro

Evolução e relevância da separação de fato no direito brasileiro Vitor Frederico Kümpel e Thaíssa Hentz de Carvalho quarta-feira, 16 de outubro de 2024 Atualizado em 15 de outubro de 2024 18:03 A separação de fato, embora não dissolva formalmente o vínculo matrimonial, é uma realidade que afeta...