Imóvel pode ser penhorado sem que proprietário tenha figurado na ação de cobrança de dívida condominial

Origem da Imagem/Fonte: STJ
Segundo a ministra Nancy Andrighi, como o imóvel gerador das despesas constitui garantia do pagamento da dívida, pode-se admitir a inclusão do proprietário no cumprimento de sentença. Leia mais...

DECISÃO
07/01/2020 06:50

Imóvel pode ser penhorado sem que proprietário tenha figurado na ação de cobrança de dívida condominial

​​O proprietário do imóvel gerador de débitos condominiais pode ter o seu bem penhorado na fase de cumprimento de sentença, mesmo não tendo figurado no polo passivo da ação de cobrança. Com base nesse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que havia entendido que a medida afrontava o artigo 472 do Código de Processo Civil de 1973.

O caso analisado é resultado de embargos de terceiro opostos pela proprietária do imóvel contra o condomínio, com os quais ela buscava evitar a penhora do bem – decorrente de condenação em ação de cobrança de cotas condominiais. A proprietária argumentou que o fato de a obrigação ser propter rem não a transforma em sujeito passivo da execução, pois não participou da formação do título executivo.

Em primeiro grau, o pedido da proprietária foi rejeitado. Porém, o tribunal paulista reconheceu a impossibilidade da penhora, sob o argumento de que seria inviável redirecionar a execução a pessoa que não figurou na relação jurídica originária.

No recurso ao STJ, o condomínio sustentou que, diante da característica propter rem da obrigação condominial, cada unidade imobiliária responde pelas suas despesas, independentemente de quem as originou ou da própria vontade do proprietário.

O recorrente argumentou também que, esgotados todos os meios para recebimento dos débitos e impedida a penhora, os demais condôminos ficariam claramente prejudicados, uma vez que os encargos seriam rateados entre eles, enquanto a devedora continuaria usufruindo de todos os serviços do condomínio.

Propter ​​rem

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, explicou que a obrigação de pagamento das despesas condominiais é de natureza propter rem, ou seja, é obrigação "própria da coisa", caracterizada pela particularidade de o devedor se individualizar única e exclusivamente pela titularidade do direito real, desvinculada de qualquer manifestação de vontade.

De acordo com a relatora, essa característica também incide sobre determinada pessoa por força de determinado direito real, isto é, só existe em razão da situação jurídica do obrigado, de titular do domínio ou de detentor de determinada coisa.

Para a ministra, a obrigação propter rem é equivalente ao compromisso imposto aos proprietários e inquilinos das unidades de um prédio de não prejudicarem a segurança, o sossego e a saúde dos vizinhos.

Relação mat​​erial  

A relatora lembrou que, no julgamento do REsp 1.345.331, a Segunda Seção firmou a tese segundo a qual "o que define a responsabilidade pelo pagamento das obrigações condominiais não é o registro do compromisso de compra e venda, mas a relação jurídica material com o imóvel, representada pela imissão na posse pelo promissário comprador, dependendo das circunstâncias de cada caso concreto".

Nancy Andrighi também citou que, no REsp 1.704.498, a Terceira Turma decidiu pela possibilidade de a arrendatária do imóvel figurar no polo passivo de ação de cobrança de despesas condominiais, pois é ela quem exerce a posse direta sobre o bem e quem, em realidade, usufrui dos serviços prestados pelo condomínio.

Desse modo, a ministra apontou que "a ação de cobrança de débitos condominiais pode ser proposta em face de qualquer um daqueles que tenha uma relação jurídica vinculada ao imóvel, o que mais prontamente possa cumprir com a obrigação".

Coisa j​​ulgada

O caso analisado – observou a relatora – ocorreu na vigência do CPC/1973, cujo artigo 472 define que os efeitos da coisa julgada são restritos àqueles que participam da ação judicial, não beneficiando nem prejudicando estranhos à relação processual.

"No entanto, essa regra não é absoluta e comporta exceções. Em determinadas hipóteses, a coisa julgada pode atingir, além das partes, terceiros que não participaram de sua formação", destacou.

Segundo Nancy Andrighi, a partir da premissa de que o próprio imóvel gerador das despesas constitui garantia do pagamento da dívida, dada a natureza propter rem da obrigação, pode-se admitir a inclusão do proprietário no cumprimento de sentença em curso.

"A solução da controvérsia perpassa pelo princípio da instrumentalidade das formas, aliado ao princípio da efetividade do processo, no sentido de se utilizar a técnica processual não como um entrave, mas como um instrumento para a realização do direito material. Afinal, se o débito condominial possui caráter ambulatório, não faz sentido impedir que, no âmbito processual, o proprietário possa figurar no polo passivo do cumprimento de sentença", afirmou.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1829663

Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Notícias

Artigo - ITCMD e doações com elementos no exterior: tema superado?

Artigo - ITCMD e doações com elementos no exterior: tema superado? A incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) em heranças e doações que envolvam doadores e bens de propriedade de de cujus no exterior tem sido objeto de intensos debates no Brasil. Em 2021, em sede do...

Penhora de bem alienado fiduciariamente por dívidas propter rem

Penhora de bem alienado fiduciariamente por dívidas propter rem Flávia Vidigal e Priscylla Castelar de Novaes de Chiara O STJ mudou seu entendimento sobre a penhorabilidade de imóveis alienados fiduciariamente em execuções de despesas condominiais, reconhecendo a possibilidade de penhorar o bem,...

Ministro do STJ exclui área ambiental do cálculo de pequena propriedade rural

Impenhorabilidade Ministro do STJ exclui área ambiental do cálculo de pequena propriedade rural STJ decidiu que, para impenhorabilidade, apenas a área produtiva de pequenas propriedades rurais deve ser considerada, excluindo-se a área de preservação ambiental. Decisão baseou-se em assegurar que...

Tribunal nega registro civil tardio de casamento de bisavós

Tribunal nega registro civil tardio de casamento de bisavós 20/07/2021 Prova de existência de filhos não é suficiente. A 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão do juiz Seung Chul Kim, da 1ª Vara Cível de Cotia, que negou pedido de registro tardio de...

Inseminação caseira: Veja impacto jurídico da prática não regulada no país

Reprodução assistida Inseminação caseira: Veja impacto jurídico da prática não regulada no país Recente decisão do STJ, reconhecendo dupla maternidade em caso de inseminação caseira, denota a urgência do tema. Da Redação segunda-feira, 4 de novembro de 2024 Atualizado às 09:56 Registrar o...